O gerente da Unidade de Agronegócios do Sebrae Nacional, Paulo Cesar Rezende Carvalho Alvim, fala sobre os desafios que os pequenos produtores rurais têm a enfrentar para viabilizar sua produção. Capacitação e acesso à informação técnica, visando alcançar mercados, aumentar a produtividade, melhorar a qualidade e gerar ganhos com a produção em pequena escala são alguns deles. Mobilizadores COEP – Como podemos estimular os pequenos produtores rurais a produzirem com mais qualidade?R.: Para estimular os pequenos produtores, é importante incorporar boas práticas ao seu processo produtivo. Para que isso aconteça, é necessário toda uma cadeia de estímulo voltada para os produtores que começa com assistência técnica adequada, visitas a unidades de capacitação, dias de campo, ou seja, replicar o conhecimento e o acesso à informação técnica. O primeiro passo deve ser a melhoria na produtividade e, em um segundo momento, a melhoria na qualidade do produto, incorporando tecnologia ao processo produtivo, investindo no negócio, estreitando a relação com o mercado e buscando atender às suas necessidades.Dar conhecimento ao pequeno produtor destas regras básicas e levar informação para que ele tenha condições de atender estas exigências é uma forma de apoiar a competitividade e sustentabilidade deste produtor.Mobilizadores COEP – Como o pequeno produtor pode viabilizar sua produção? Quais os principais financiamentos para a agricultura familiar? Como obtê-los?R.: Acredito que o associativismo seja o melhor caminho para viabilizar a produção em pequena escala. Sozinho, as dificuldades podem ser muito maiores. Hoje temos um portfólio significativo de oferta de recursos públicos que apóiam o pequeno produtor. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf)*1 é um exemplo concreto. Porém, o mais importante é levar a informação ao produtor e viabilizar o acesso ao crédito. Apoiá-lo para que ele acesse este instrumento de fortalecimento à sua produção torna-se básico.Mobilizadores COEP – Em geral, quais sãos as maiores deficiências dos produtores rurais? O que é possível fazer para superá-las?R.: Podemos listar muitas coisas, mas é importante destacar que apesar de termos avançado em vários pontos ainda persiste a questão de desinformação do produtor, a dificuldade de acesso à tecnologia e ao credito, a questão do olhar de mercado, ou seja, o que os consumidores buscam, a baixa capacidade de planejamento do que fazer e por fim, grandes dificuldades de gestão do seu negócio e do seu empreendimento. A Emater (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural)*2 é um órgão que sempre procurou fazer esta ponte entre o produtor rural e o acesso à informação técnica adequada, mas que ficou esquecido pelo governo durante muitos anos. Atualmente, existe um processo de retomada deste órgão, que vem sendo estimulado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário. Mas, ainda assim, existe uma deficiência muito grande de profissionais de extensão rural, tanto em número quanto em capacitação técnica para apoiar, por exemplo, a cadeia da agroecologia. É necessário que se construa uma rede que possa levar assistência técnica de qualidade e de forma continuada aos produtores.Mobilizadores COEP – O que quer dizer ?boas práticas agrícolas?? O que envolve?R.: Significa aplicar as melhores técnicas e procedimentos no processo de produção, coleta, beneficiamento, armazenamento e transporte de produtos agrícolas, que atendam às questões de legislação ambiental, sanitária e de manejo de alimentos, e que garantam cada vez mais uma oferta de alimentos saudáveis e seguros.As boas práticas agrícolas envolvem apoio técnico ao produtor, por procedimentos de capacitação e assistência técnica, e a utilização deste conjunto de procedimentos nas propriedades. Hoje em dia não existe mais espaço para produzir com as mesmas técnicas utilizadas há anos atrás, pelo seu pai ou seu avô. É necessário capacitação técnica para buscar os melhores resultados e ganhos em produtividade e qualidade.Mobilizadores COEP – E como chegar aos mercados? Existem regras que devem ser seguidas?R.: Acompanhar as exigências do mercado pode ser um bom caminho para atingir este objetivo. Atualmente, o consumidor procura produtos com menor custo, mas que seja saudável e tenha qualidade. Não adianta oferecer um tomate a um preço baixo, se ele foi produzido com agrotóxicos. É preciso incorporar valor à linha de produtos: ganhos com produtividade, qualidade e a chamada responsabilidade social ? como é a minha produção, se o respeito ao meio ambiente está presente, se não utilizo mão-de-obra escrava, se não exploro uma comunidade. Todos estes pontos são importantes e podem ser diferenciais de produção que agregam valor ao produto e atingem mercados diferenciados.As regras são impostas pela definição do mercado-alvo: o que produzir e para quem produzir, podendo atingir o local, regional, estadual, nacional e internacional, que vão exigir estratégias próprias para cada tipologia.Mobilizadores COEP – É intensa a produção familiar no Brasil. Como esses produtores podem ter acesso facilitado ao mercado? As associações e cooperativas de comercialização são boas alternativas? Por quê? R.: A produção da agricultura e pecuária de base familiar já responde por cerca de 70% dos alimentos consumidos no mercado interno. Alimentos que têm base de produção local e que ampliam a oferta de alimentos saudáveis. Estratégias de ampliação de mercado têm sido cada vez mais difundidas para este conjunto de produtores, em especial organizados de forma coletiva, onde as associações e cooperativas são estratégicas para garantir volume e diversidade de produtos. Os esforços têm se focado em especial nos mercados locais (apoio a mecanismos de comercialização local ? feiras locais, pontos de venda cooperativos, entre outros); e de venda institucional, com o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)*3 e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)*4. Exemplos de associações que estão atuando de forma exemplar podem ser dados em todo o território nacional, e uma boa mostra foram os quase 700 empreendimentos que estiveramna Feira Nacional da Agricultura Familiar – Brasil Rural Contemporâneo -, que aconteceu em junho, em Brasília. Mobilizadores COEP – Que critérios os pequenos produtores devem seguir para definir os preços de seus produtos? Que fatores devem ser levados em consideração? Onde obter mais informações?R.: O preço pode ser definido pelo mercado, pela produtividade, ou ainda pelo valor agregado ao produto [produzir de forma orgânica, oferecer produtos selecionados numa embalagem bem feita são exemplos de como agregar valor]. É necessário ter rentabilidade, independente da produtividade e preço escolhido. Por exemplo, uma produção em larga escala consegue baixar o preço ao consumidor final e o ganho real vem da quantidade vendida. Quando se trata de uma produção pequena, os custos de produção podem ser maiores, mas o ganho pode vir da qualidade diferenciada e de um preço um pouco mais elevado. É preciso ter estratégias bem claras de custos, saber o custo da produção e como reduzi-los, pois a partir daí temos como tomar a decisão da venda. A estratégia é agregar valor à produção, pois aí colocamos o produto no mercado com outros patamares de preço.Mobilizadores COEP – Quais os mais importantes certificados e selos existentes para a produção agropecuária? O que é necessário para obtê-los e quais os principais benefícios podem trazer para o produtor?R.: Certificação é uma forma de comunicação com o mercado consumidor que informa sobre o atendimento de determinadas características sobre o produto ou produtor. Hoje, para este conjunto de produtores, os mais relevantes são as certificações de produto orgânico*5, produção agroecológica e de comércio justo. Outro esforço interessante para este conjunto de produtores são as indicações de origem, que visam atribuir identidade cultural aos produtos de procedência de comunidades étnicas, a partir do resgate histórico dos modos de produção. Os benefícios vão desde uma cadeia produtiva mais consciente e ambientalmente responsável até o preço final do produto, que gera mais valor agregado.Mobilizadores COEP – Quais os principais mercados para o pequeno produtor rural? Como ele pode ampliar esses mercados?R.: Primeiro o mercado local, próximo aonde se produz, o que reduz custos de logística, onde a grande inserção se pode fazer pelas compras institucionais, como a merenda escolar, por exemplo. A partir daí temos os mercados diferenciados, como o de orgânicos e de comércio justo*6. Também é interessante estabelecer um canal de venda direto, ou seja, ser responsável não só pela produção, mas pela logística daquilo que se produz.Mobilizadores COEP – Como o Sebrae articula o relacionamento de pequenos produtores e seus potenciais canais de comercialização? São oferecidas capacitações nessa área de potenciais mercados? R.: O Sistema Sebrae junto com um conjunto de entidades parceiras, públicas e privadas, tem desenvolvido esforços para identificar oportunidades de negócios, preparar produtores para ofertar produtos e serviços adequados e capacitar os produtores para terem o olhar de mercado.————–*1 ? Pronaf: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar que tem por finalidade o financiamento de projetos individuais ou coletivos de agricultores familiares e assentados da reforma agrária. Mais informações sobre o Pronaf e sobre como obter crédito podem ser obtidas na página do Ministério do Desenvolvimento Agrário, ou através do e-mail: pronaf@mda.gov.br.*2 ? Emater: Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural que atua em todo o território nacional e tem como missão promover ações de assistência técnica e social, de extensão rural, classificação e certificação, cooperando no desenvolvimento rural sustentável. Em cada estado, na maior parte das cidades brasileiras existe um pólo da Emater que pode apoiar e dar capacitação técnica para o desenvolvimento da agricultura local. Mais informações podem ser obtidas nos sites estaduais da Emater na internet – Minas Gerais: www.emater.mg.gov.br; Rio de Janeiro: www.emater.rj.gov.br; Rio Grande do Sul: www.emater.tche.gov.br; Piauí: www.emater.pi.gov.br).*3 ? PAA: Programa de Aquisição de Alimentos cujo objetivo é garantir o acesso a alimentos em quantidade e regularidade necessárias às populações em situação de insegurança alimentar e nutricional. Visa também contribuir para formação de estoques estratégicos e permitir aos agricultores familiares que armazenem seus produtos para que sejam comercializados a preços mais justos. Mais informações na página do Ministério do Desenvolvimento Agrário, ou através o e-mail: paa@mda.gov.br.*4 ? PNAE: Programa Nacional de Alimentação Escolar é um programa do governo federal que determina a utilização de, no mínimo, 30% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento para a Educação (FNDE) para alimentação escolar, na compra de produtos da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações. A aquisição de gêneros alimentícios será realizada, sempre que possível, no mesmo município das escolas. Quando o fornecimento não puder ser feito localmente, as escolas poderão complementar a demanda entre agricultores da região, território rural, estado e país, nesta ordem de prioridade. Mais informações na página do Ministério do Desenvolvimento Agrário.*5 ? Selos de certificação orgânica: Desde 29 de dezembro de 2007, a agricultura orgânica no Brasil passou a ter critérios para o funcionamento de todo o seu sistema de produção, desde a propriedade rural até o ponto de venda. Atualmente, existem mais de 30 certificadorasorgânicas no país, tais como Ecocert Brasil, Instituto Biodinâmico (IBD), Associação de Agricultores Biológicos (Abio).*6 ? Comércio Justo (Fair Trade, em inglês): Trata-se de um movimento social e uma modalidade de comércio internacional que busca o estabelecimento de preços justos, bem como de padrões sociais e ambientais equilibrados, nas cadeias produtivas.Entrevista para o Grupo Geração de Trabalho e RendaConcedida à: Flávia MachadoEditada por: Eliane Araújo