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Com mais de 100 mil seguidores, Brasil Feminista dá visibilidade às lutas das mulheres

30 de março de 2017

Lançada em abril de 2016, a fanpage Brasil Feminista tem como proposta ser o ponto de encontro de coletivos feministas de todo o país e contribuir para dar maior visibilidade às demandas dos diferentes feminismos. Hoje, o projeto conta com mais de 100 mil seguidores e se prepara para lançar um site e várias outras iniciativas para fortalecer as lutas das mulheres.

Nesta entrevista à Rede Mobilizadores, a administradora da página e analista de mídias sociais, Ana Lucia Oliveira, fala sobre o projeto e revela que muitas mulheres vítimas de violência e assédio procuram a fanpage em busca de apoio e orientação.

Ela analisa também a importância da internet para o fortalecimento da luta feminista; fala sobre a crescente dissolução da fronteira entre o “real” e o “virtual”; aponta algumas das principais ameaças aos direitos das mulheres; comenta a respeito das convergências e divergências entre as lutas feministas e os movimentos transfeministas e, também, sobre  o crescimento do feminismo interseccional, onde as  mulheres negras se destacam. A seu ver é a corrente feminista mais plural, uma vez que envolve numa mesma luta demandas relacionadas ao machismo, racismo e exclusão social.

 

Rede Mobilizadores – Como surgiu a ideia do Brasil Feminista e a que ele se propõe?

R.: O Brasil Feminista surgiu de um grupo de trabalho criado em 2013. Na época, o objetivo era criar um site sobre mulheres empoderadas. Esse projeto inicial não foi adiante, por falta de recursos, e foi retomado em 2015, agora com uma perspectiva assumidamente feminista, inspirado no crescimento do movimento Mulheres Contra Cunha e na Primavera Feminista.

Desde então, temos trabalhado em um projeto capaz de conectar todos os coletivos feministas do país. Por questões operacionais, achamos que a melhor forma de tocar o projeto era através do Facebook, pela facilidade que esta rede oferece para linkar e marcar coletivos feministas do Brasil inteiro.

É isso que fazemos o tempo inteiro na página, difundindo e compartilhando informação que vem dos coletivos feministas espalhados pelo país.

Paralelamente, também procuramos trazer para a página variados conteúdos feministas produzidos mundo afora. Também recebemos muitas denúncias de “manas” que sofrem violência e assédio. Muitas delas, no momento do sufoco, não tem a quem recorrer e procuram a gente, via inbox.

Brasil Feminista

 Rede Mobilizadores – Na avaliação de vocês, qual a importância da internet para o fortalecimento da luta feminista e como lidar com o fato de que grande quantidade de mulheres ainda não têm acesso às tecnologias digitais?

R.: A internet é fundamental para a explosão da chamada “quarta onda” do feminismo. Ajudou a criar as bases do feminismo de rede, seguindo trajetória que se viu em outros movimentos sociais de alcance global, como a Primavera Árabe, o movimento Podemos, na Espanha, e o Ocupa Wall Street, em Nova York – todos com ampla mobilização pelas redes sociais.

a concentração do uso de Internet é brutal, e isso, no caso das mulheres, representa uma exclusão de 300 milhões de mulheres.

Em relação à grande quantidade de mulheres que ainda não tem acesso à Internet, este é, de fato, um problema gigantesco que precisa ser enfrentado. Há uma estatística nesse sentido que é assustadora: você imagina que os usuários do Netflix gastam num único dia a mesma quantidade de dados que a África usa numa semana? Ou seja, a concentração do uso de Internet é brutal, e isso, no caso das mulheres, representa uma exclusão de 300 milhões de mulheres.

Há muita gente pensando em como enfrentar este problemaço. A ONU [Organização das Nações Unidas], por exemplo. Grandes empresas (Facebook, Google) também estão investindo, cada uma do seu jeito, para tentar reduzir esse gap.

No caso específico do trabalho que fazemos no Brasil Feminista, tivemos recentemente o exemplo dado por uma “mana” do coletivo “Juntas” de Santarém. Ela nos contou que mantém contato direto com mulheres de tribos indígenas da região Amazônica, que inclusive produzem textos que servem de base para o ativismo do coletivo “Juntas”. Isso nos pareceu uma forma bacana de superar a exclusão digital.

 

Rede Mobilizadores – A escritora Gloria Steinem, uma das principais referências da chamada segunda onda de feminismo, reconhece a importância de campanhas feministas online, mas chama a atenção para a necessidade do contato físico. O que pensam a esse respeito? Há uma preocupação do Brasil Feminista em estabelecer encontros presenciais?

R.: A afirmação de Gloria ainda está baseada em uma fronteira muito nítida entre o “virtual” e o “real”. Ocorre que essa fronteira está se dissolvendo. Se você está num ato na principal avenida da cidade e uma amiga sua, a 50 km dali, avisa pelo WhatsApp que a PM está chegando na avenida para reprimir o movimento, muito provavelmente este aviso vai influenciar a dinâmica do movimento. Com isso, a fronteira entre “virtual” e o “real” vai pro espaço.

O pulo do gato, então, é estabelecer este link, para que o “virtual” e o “real” estejam interligados na luta política. É maravilhoso quando esse link se dá via encontros presenciais – e nesse ponto nada como uma boa manifestação, colorida, repleta de mulheres diferentes -, mas se o link vier através de duas amigas se comunicando via WhatsApp, maravilha também. A gente pretende trabalhar estes dois links.

 

Rede Mobilizadores – Com base no trabalho que vêm realizando, o que consideram que seja hoje as principais ameaças aos direitos das mulheres? Em que pontos a luta feminista avançou e quais os principais desafios a curto e médio prazos?

R.: A gente precisaria conversar uma semana inteira para descrever as ameaças aos direitos das mulheres. O governo Temer e o Congresso vêm se esforçando para detonar os direitos das mulheres através de ataques diversos, como a reforma da Previdência, a terceirização (que penaliza ainda mais as mulheres), criminalização maior das mulheres que fazem aborto, proibição da discussão de gênero e sexualidade nas escolas, instituição do estatuto da família somente de base heterossexual, para citar alguns itens da agenda conservadora.

A própria baixa representatividade feminina no Congresso ainda é um retrocesso que atrapalha o avanço de pautas que protejam nossos direitos ou impeçam que nos retirem o que já foi conquistado.

Não nos esquecemos também da PEC [Proposta de Emenda Constitucional] do Teto de Gastos, que terá nas mulheres as principais prejudicadas porque  vai aprofundar a desigualdade de gênero ao reduzir sensivelmente as políticas públicas.

A própria baixa representatividade feminina no Congresso ainda é um retrocesso que atrapalha o avanço de pautas que protejam nossos direitos ou impeçam que nos retirem o que já foi conquistado.

 

Rede Mobilizadores – Há um diálogo entre o feminismo e o transfeminismo? Como essas lutas se encontram e o que as distancia?

R.:  Esta pergunta ficaria mais precisa se você usasse o substantivo “feminismos”, assim mesmo, no plural. Porque existem visões distintas sobre o assunto. Alguns grupos feministas entendem que a luta contra o patriarcado é uma luta que envolve exclusivamente as mulheres cis* porque só a mulher biológica vive e viveu na pele todos os dramas e conflitos gerados por uma sociedade machista.

Outros grupos têm uma visão distinta, partindo do seguinte princípio: se uma pessoa foi designada homem ao nascer, não se sente homem, mas é cobrada socialmente para agir como um homem, essa pessoa também sofre a violência do machismo. O transfeminismo, então, amplia o discurso feminista para incorporar estas mulheres, as mulheres trans.

 

Rede Mobilizadores – Temos percebido uma grande mobilização das mulheres negras. Quais as principais demandas desse segmento. Como ele dialoga com os demais?

R.: Nos últimos tempos essa mobilização ganhou força com a ascensão do feminismo interseccional, que se debruça sobre a intersecção de padrões culturais de opressão. Uma mulher negra e pobre, por exemplo, é discriminada por conta do gênero, da cor da pele e da classe social. Nesse caso, suas demandas incluem a superação do machismo, do racismo e da exclusão social, tudo interligado!

A cada dia que passa, essa visão poderosa do feminismo ganha mais espaço, alcançando mais mulheres. Talvez seja a corrente feminista mais plural, porque entende a opressão das mulheres em toda as suas manifestações.

Uma mulher negra e pobre, por exemplo, é discriminada por conta do gênero, da cor da pele e da classe social. Nesse caso, suas demandas incluem a superação do machismo, do racismo e da exclusão social, tudo interligado!

 

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* Cis – Abreviatura de cissexual. São pessoas que foram designadas com um gênero ao nascer e se identificam com ele. Sinônimo de cisgênero.

 

Entrevista e edição: Eliane Araujo
Revisão: Sílvia Sousa

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