O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) publicou no Diário Oficial da União do dia 4 de abril, a Resolução 163, que considera abusiva a prática do direcionamento de publicidade e comunicação mercadológica à criança com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço.
Para o Conanda, comerciais nas mídias impressa, televisiva, radiofônica e eletrônica, além de embalagens, promoções, ações de merchandising em shows e apresentações, entre outras ações direcionadas para o público infantil, são atividades que ferem a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código de Defesa do Consumidor.
Os dados são alarmantes: pesquisa do TNS/ Intersciente (2003) aponta que 80% da influência de compra dentro de uma casa vêm das crianças. “A publicidade direcionada à criança é aquela que usa elementos do universo infantil com o intuito de persuadi-la para a compra de um produto ou serviço”, é o que explica o advogado do Instituto Alana e conselheiro do Conanda, Pedro Hartung, em entrevista à Rede Mobilizadores. Confira.
Rede Mobilizadores – Qual o papel do Conanda?
R.: O Conanda é o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, órgão colegiado de caráter normativo e deliberativo, vinculado à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. Seu papel é atuar como instância máxima de formulação, deliberação e controle das políticas públicas para a infância e a adolescência na esfera federal, fiscalizando o cumprimento e a aplicação eficaz das normas do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Criado pela Lei n. 8.242 de 12 de outubro de 1991, possui, especificamente, a competência de “elaborar as normas gerais da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente, fiscalizando as ações de execução”, ressaltando, assim, sua função de controle de todo o Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente no Brasil, do qual fazem parte toda a sociedade e todas as instituições do Estado.
Composto de forma paritária por representantes da sociedade civil organizada ligados à promoção e proteção dos direitos da criança e representantes dos ministérios do governo federal, o Conanda possui o dever e a competência constitucionalmente prevista de zelar pela devida e eficiente aplicação das normas de proteção às crianças e adolescentes no Brasil. Para exercer tal dever, pode editar Resoluções, as quais são atos normativos previstos no Art. 59 da Constituição Federal.
Rede Mobilizadores – Quando falamos em proteção integral da criança, o que a aprovação da Resolução 163 representa?
R.: A Resolução 163 do Conanda representa um novo paradigma para proteção integral da criança no Brasil frente à abusividade da publicidade e da comunicação mercadológica dirigida a ela, uma vez que tais práticas se aproveitam da vulnerabilidade da criança e da sua condição de pessoa em desenvolvimento. Até então, não havia uma norma específica e detalhada sobre o tema que pudesse coibir os abusos e violações de direitos gerados por essa atividade comercial.
Rede Mobilizadores – Na prática, como as pessoas podem identificar propagandas abusivas voltadas às crianças?
R.: A publicidade direcionada à criança é aquela que usa elementos do universo infantil com o intuito de persuadi-la para a compra de um produto ou serviço. Para tal, podem utilizar diversos artifícios que cativam de forma direta esse público. O Conanda, no artigo 2º da Resolução n. 163, considera os seguintes aspectos: linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores; trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança; representação de criança; pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil; personagens ou apresentadores infantis; desenho animado ou de animação; bonecos ou similares; promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; e promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil.
Rede Mobilizadores – Percebido o abuso, quais atitudes essas pessoas devem tomar e a quem recorrer?
R.: Além de demonstrar sua indignação diretamente nos perfis das empresas em redes sociais, as publicidades infantis devem ser denunciadas aos órgãos competentes do Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente e do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, como o Ministério da Justiça, os Procons, o Ministério Público e a Defensoria Pública.
Ainda, uma reclamação formal pode ser feita diretamente às empresas anunciantes por meio dos canais de comunicação com o consumidor que elas obrigatoriamente devem disponibilizar.
Para facilitar, modelos e petições para realizar as denúncias podem ser encontradas na página do Projeto Prioridade Absoluta, no seguinte link: http://www.prioridadeabsoluta.org.br/como-fazer-para-proteger-as-criancas-da-publicidade-infantil
Rede Mobilizadores – Representantes do mercado publicitário, editorial e radiofusor já se manifestaram contrários à Resolução 163. Isto pode trazer retrocessos?
R.: Os que querem a manutenção da prática da comunicação mercadológica infantil enxergam na Resolução uma ameaça aos seus interesses e, por isso, tentam deslegitimar sua força e abrangência, alegando que a Resolução não teria poder vinculante.
A manifestação contrária à Resolução pode refletir uma falta de conhecimento do Sistema de Garantias dos Direitos da Criança e do Adolescente, bem como do ordenamento jurídico brasileiro de proteção aos direitos da criança, do adolescente e do consumidor ou, ainda, o descompromisso social dos signatários no âmbito do art. 227 da Constituição Federal, que determina a responsabilidade conjunta de todos os agentes sociais na proteção e promoção dos direitos da criança e do adolescente no Brasil.
Entrevista do Eixo de Participação, Direitos e Cidadania
Concedida à: Sílvia Sousa
Editada por: Eliane Araujo