Nessa entrevista, Maria da Glória Almeida, chefe de gabinete do Instituto Benjamin Constant, fala a respeito da inclusão sociocultural de pessoas com deficiência, em especial deficiência visual, no país. De acordo com ela, os principais obstáculos para que esta inclusão aconteça são a falta de vontade política e de recursos financeiros. Mas ela aponta alguns avanços na área.
Mobilizadores COEP – Quais as principais dificuldades que as pessoas com deficiência enfrentam para terem acesso à cultura no Brasil? Qual o impacto disso para o desenvolvimento dessas pessoas, especialmente das crianças?
R.: Algumas dificuldades que podemos apontar é a falta de espaços culturais adaptados. Em geral, exposições de arte, museus, etc vedam o toque. Assim, torna-se mais difícil o acesso de pessoas com deficiência visual a esses produtos culturais. É bem verdade que já caminhamos um pouco nesta área, no entanto, a sociedade precisa abrir-se mais e entender que uma pessoa cega ou de baixa visão tem os mesmos direitos de quaisquer outros indivíduos. O avanço tecnológico tem aberto um canal de conhecimento extraordinário para todos, inclusive, para aqueles que têm deficiência visual. Os programas desenvolvidos na área da informática vêm ampliando as possibilidades de conhecimento desta fatia da população. Softwares com leitores de tela (programas com áudio) e com recursos de ampliação das letras e uso de contrastes na tela, atendendo às pessoas com baixa visão, colocam o deficiente visual frente à modernidade e lhe possibilita o acesso à internet e à comunicação em salas de bate-papo, correio eletrônico e outras ferramentas tecnológicas. Quando não existem oportunidades de aprendizagem, o homem tem graves prejuízos no seu desenvolvimento global. Dessa forma, quando a cultura é proibida a qualquer pessoa, o impacto causado é danoso e, muitas vezes, irrecuperável.
Mobilizadores COEP – A inclusão social é um direito das pessoas com deficiência. Nesse sentido, não é obrigatório que todas as casas de espetáculo, cinemas, teatros, museus etc sejam adaptados para que essas pessoas possam freqüentá-los? Por que isso não é feito? A quem cabe esta responsabilidade? Quais as principais dificuldades para tornar os espaços de cultura inclusivos?
R.: A inclusão é um direito, não apenas para o deficiente, mas sim para todos. Os espaços culturais muitas vezes não têm acessibilidade arquitetônica, bem como na estrutura da comunicação da natureza do espaço em questão. Faltam rampas de acesso para cadeirantes, falta material em Braille elucidativo para os cegos, falta pessoal treinado para esclarecer o trabalho a pessoas superdotadas, faltam intérpretes de Libras (Língua Brasileira de Sinais) favorecendo a inclusão dos surdos, etc. Hoje existe o Decreto Federal nº 5.296, de 02 de dezembro de 2004, que estabelece as regras gerais de acessibilidade. Como vimos, existe um decreto, bem como leis municipais para normatizar o assunto. Podemos dizer que, mesmo timidamente, os primeiros passos já vêm sendo dados. Temos de admitir que isto é um processo de construção de novas práticas sociais, portanto, tornam-se lentos diante das necessidades e ansiedades das pessoas com deficiência. As maiores dificuldades residem na falta vontade política e nos recursos a serem aplicados.
Mobilizadores COEP – A preocupação em oferecer espaços de cultura inclusivos é freqüente em outros países? Quais? Das iniciativas que conhece, quais destacaria?
R.: Sabemos que países europeus, assim como os Estados Unidos, têm a preocupação de oferecer espaços culturais não apenas às pessoas com deficiência, mas também aos idosos. Com referência aos deficientes visuais, podemos citar a Espanha como exemplo de espírito inclusivista. A Organização Nacional dos Cegos de Espanha (ONCE) se encarrega de promover e criar plenas condições de oferecimento de lazer e cultura para os deficientes visuais. Inclusive, esta organização disponibiliza recursos para países da América Latina e outros continentes, que lutam com dificuldades de ordem financeira.
Mobilizadores COEP – O Instituto Benjamin Constant tem algum trabalho institucional para que os espaços públicos contemplem os direitos das pessoas com deficiência? De que tipo?
R.: O Instituto Benjamin Constant, sempre que contactado, dá sugestões e até visita locais. Entretanto é um trabalho esporádico, cuja responsabilidade de execução e implementação não lhe cabe. Este Instituto não tem qualquer ingerência sobre este assunto, o que fazemos, é orientar e sugerir quando somos consultados.
Mobilizadores COEP – Pela sua experiência, tem havido mudanças positivas no Brasil em relação à acessibilidade sociocultural e econômica das pessoas com deficiência?
R.: De certa maneira, alguns passos já foram dados quanto ao acesso sociocultural. Quanto à questão econômica, nosso país está longe de ter resolvido questões dessa natureza. O que acontece é que cobramos uma educação de qualidade, uma educação que viabilize o crescimento da pessoa com deficiência visual. O sistema de cotas ou reserva de vagas em concursos públicos trouxe uma abertura de mercado de trabalho. Verificamos que as universidades e até alguns cursos técnicos, ainda que de maneira inicial, já recebem alunos com deficiência visual, fato que aumenta suas possibilidades de inserção social e profissional.
Mobilizadores COEP – O Instituto Benjamin Constant será sede do primeiro museu latino-americano adaptado a pessoas com deficiência visual. Como surgiu o projeto do Museu Tiflológico e qual sua proposta?
R.: Este projeto nasceu do desejo de oferecermos às pessoas com deficiência visual as mesmas oportunidades de usufruir dos bens culturais como quaisquer outros indivíduos. O museu dará condições de a pessoa com deficiência visual ter acesso às peças que compõem o acervo histórico do cego no Brasil, bem como à documentação pertinente. Será um espaço informatizado onde haverá maquetes, materiais especializados, exposições de arte, permanentes e móveis. Este museu estará aberto ao ?toque?, já que na maioria dos museus tradicionais isto nos é vedado.
Mobilizadores COEP – Que tipo de adaptações serão feitas no museu para que as obras adquiram significado para os deficientes visuais? Há intenção de adaptar o museu para pessoas com outros tipos de deficiência?
R.: O Museu do Instituto Benjamin Constant será adaptado tanto para cegos como para pessoas de baixa visão. O sistema Braille estará presente maciçamente e também teremos o auxílio da informática que atenderá aos dois grupos: programas com leitores de tela e programas adaptados com aumento das letras e uso de contrastes para os visitantes de baixa visão. Este espaço estará pronto para acolher o maior número de pessoas possível, privilegiando suas diferenças. Pretendemos ser um museu inclusivo, onde a exclusão não terá lugar. As pessoas com baixa visão também serão privilegiadas com espaço absolutamente adaptado para elas, com pintura nas paredes adequada, piso sinalizado, etc. Pretendemos ainda criar um acervo da memória oral do Instituto Benjamin Constant. Depoimentos dados a respeito da instituição por pessoas e profissionais que conviveram com sua história e contribuíram para sua importância.
Mobilizadores COEP – O projeto do museu já foi aprovado pelo Ministério da Cultura e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Qual o montante do investimento necessário para sua implementação? O IBC já conseguiu o financiamento? Quando o projeto deverá estar pronto?
R.: O Ministério da Cultura acolheu este projeto, e estamos amparados pela Lei Rouanet. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional acompanhou a feitura do projeto para que este não incorresse em qualquer tipo de erro diante de uma instituição cuja história remonta ao longínquo ano de 1854. O projeto está orçado em R$ 3,150 milhões. Estamos em fase de captação de recursos e ainda não temos uma previsão do início do funcionamento do museu.
Entrevista concedida à: Renata Olivieri
Edição: Eliane Araujo
Parabéns por esta iniciativa, ja estamos passando da hora destas adaptações e inclusão dos portadores de necessidades especiais.
Referindo-se ao assunto de deficiência, existe uma carência muito grande de oportunidade de trabalho para os adultos quando deixam a APAE, me doi muito vê-los a procura destas poucas oportunidade existentes nas cidades.
Parabéns ao Instituto Benjamin Constant pelas ações desenvolvidas. Acho que o caminho é esse. Que bom que existem pessoas não apenas preocupadas consigo mesma, mas sim, com o próximo. Acho q a sociedade não está totalmente preparada, AINDA, para conviver com as diferenças, seja ela física, social, cultural e até mesmo religiosa. Mas como a Sra. Maria da Gloria ressaltou na entrevista, o progresso no processo de inclusão existe. Precisamos, agora, nos empenhar cada vez mais para que o avanço continue acontecendo.
Primeiramente gostaria de saldar a Sra Maria da Gloria pela entrevista concedida à Renata Oliveira sobre o processo de inclusão sociocultural das pessoas com deficiência. Os trabalhos desenvolvidos pelo Instituto Benjamim Constant tem se tornado uma iniciativa de grande importância para a inclusão sociocultural da comunidade cega e com baixa visão de todo o nosso país.
Realmente, a senhora Maria da Gloria tem razão quando diz que a falta de vontade política e de recursos financeiros são os principais obstáculos para a conquista da inclusão da pessoas com deficência.
Um outro fator, muito relevante é que a sociedade brasileira não foi preparada para conviver com as diferenças. Nós todos é que temos agora que correr contra o prejuizo, mostrando aos demais que este processo de mudança de atitude, transformando o processo social comum numa sociedade mais justa e inclusíva é a única alternativa viável.
Não é possível se falar em inclusão social, em direitos humanos das pessoas com deficiência sem a garantia da acessibilidade.
Um país sem acessibilidade não inclui ninguem
Queria parabelizar em primeiro lugar a Sr Maria da Gloria pela entrevista maravilhosa que relata o processo de inclusão sociocultural que as pessoas com deficiência sofrem até os dias de hoje quando tentam se integrar na sociedade.Pois vivemos em um País que infelizmente a discriminação ainda é constante nesses casos.
Muito interessante a entrevista para tornar conhecido para o público quais as ações desenvolvidas pelo Instituto Benjamin Constant.
valeu!…
Gostaria de saber se essa entrevista será repassada as demais entidades que atendem e atuam com deficientes visuais no país e transmitidas aos seus usuários, com caráter de relevância para o Instituto de Cegos do Ceará.