Nascido num contexto de intensa mobilização social e política, o COEP completa, em 2013, 20 anos. Repensar a estrutura política e social do país e abraçar campanhas que busquem o fortalecimento da sociedade são iniciativas que sempre estiveram presentes em sua trajetória, desde sua criação, no contexto da campanha de combate à fome que mobilizou o Brasil em 1993, sob a liderança do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.
Hoje, as articulações continuam, as parcerias se renovaram, a mobilização e a capacitação continuam sendo uma importante ferramenta para a disseminação da informação e do conhecimento, buscando o fortalecimento das comunidades e a construção de uma sociedade mais participativa e mais cidadã. Mais recentemente, o enfrentamento aos desastres climáticos tornou-se ainda mais forte na pauta da mobilização da Rede COEP. Na visão de André Spitz, presidente do COEP, os desafios para construção de um Brasil mais justo e menos desigual continuam imensos, apesar do muito que já foi realizado até agora.
De acordo com ele, o combate à miséria ainda é um desafio no Brasil atual, “mas hoje temos perspectivas melhores. Avançamos na questão da redução das desigualdades e na gestão de políticas públicas”, explica. Confira a entrevista.
Rede Mobilizadores – Em que conjuntura social e política o COEP foi fundado? Qual sua proposta inicial?
R.: O COEP nasceu, em 1993, num contexto de intensas manifestações sociais e políticas no país. O presidente Fernando Collor de Melo havia sofrido um impeachment e começava a tomar corpo o movimento intitulado Ética na Política, com ampla representação nacional. Toda essa mobilização da sociedade convergiu, logo depois, para a campanha “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e a pela Vida”, um movimento capitaneado por Betinho que estimulou a participação da sociedade brasileira em ações emergenciais e na luta estrutural contra a fome e a miséria. Já não dava para falar de ética sem combater a fome no país. Na ocasião, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) havia divulgado o Mapa da Fome, o que deu visibilidade às condições de vida da população mais pobre e revelou um país com 32 milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza.
Assim, o COEP nasceu de uma mobilização para promover o combate à fome a partir da união de esforços das estatais brasileiras, que formaram uma rede de entidades. Era uma nova configuração que se apresentava: as estatais somando forças para desempenhar seu papel social.
Rede Mobilizadores – Qual foi o papel do Betinho na campanha da Ação da Cidadania e na criação do COEP?
R.: Betinho foi uma grande liderança e ele tinha uma capacidade sem tamanho de articular e agregar as pessoas em torno de um mesmo objetivo, de uma mesma ideia. Ele conhecia muita gente, tinha amigos no governo, na mídia, e essa rede formada por ele foi determinante na construção da campanha. Era muito criativo também e, desde que lançou a Ação da Cidadania, pensava em criar um comitê de entidades que pudesse reunir os esforços das estatais para o combate à fome. Betinho foi nosso maior incentivador e moldou uma cultura que nos orienta ainda hoje, que é a ideia de articulação em redes, sejam elas de entidades ou de pessoas para promoção da cidadania.
Rede Mobilizadores – Nestes 20 anos, o cenário brasileiro sofreu várias alterações. No entanto, é possível pontuar questões sociais que continuam prementes de serem resolvidas no país? Quais?
R.: O combate à fome, à pobreza e as políticas de inclusão social ainda são desafios na atualidade. É certo que avançamos muito nessas questões, mas os desafios continuam enormes. O Governo Federal avançou na gestão das políticas públicas e está mais organizado com relação a isso. Mas temos ainda muito o que enfrentar, como melhorar a articulação das três esferas de poder com relação à implementação dessas políticas e construir um país mais descentralizado. O combate à corrupção é fundamental também, e superar as desigualdades sociais é um grande desafio histórico.
Rede Mobilizadores – Tendo isso em vista, quais as principais linhas de atuação do COEP hoje?
R.: O COEP hoje se articula em três grandes eixos que são o da Erradicação da Miséria; o da Participação, Direitos e Cidadania; e o de Meio Ambiente, Clima e Vulnerabilidades. E entende que esses eixos são complementares na medida em que fortalecem a capacidade da sociedade de se articular e de lutar por seus direitos. O COEP entende que a sociedade é a mola propulsora de toda e qualquer transformação social, e dar meios para as comunidades se fortalecerem – tanto no âmbito social como no ambiental, com relação às mudanças climáticas e seu enfrentamento -, é uma constante preocupação.
Rede Mobilizadores – De que forma as iniciativas do Comitê podem estimular a formulação de políticas públicas?
R.: O COEP tem uma forma de trabalhar que prioriza as articulações e a construção de parcerias. Estamos sempre buscando articulações e soluções inovadores em diversas áreas. Dessa forma, a gente entende que o diálogo com o poder público por vezes resulte na implementação de políticas públicas.
Rede Mobilizadores – Hoje, quais as principais ferramentas de articulação, mobilização e capacitação do COEP?
R.: A internet hoje é uma ferramenta que nos possibilita articular, mobilizar e capacitar, sem que isso demande uma constante presença física nos territórios e comunidades em que o COEP atua. Através dessa imensa rede de pessoas conectadas é possível atuar nos mais diversos campos do conhecimento e geração de informação. E essa possibilidade de mobilização e capacitação através das redes é realmente fantástica. O trabalho em rede sempre foi uma marca do COEP, desde a rede de entidades, passando pela rede de pessoas e pela rede de comunidades no semiárido nordestino, todas interligadas pela possibilidade que a internet trouxe de aproximar essas pessoas.
Rede Mobilizadores – Poderia destacar algumas iniciativas que marcaram a trajetória do Comitê ao longo destes 20 anos?
R.: Ao longo desses 20 anos, temos muitas iniciativas que marcaram a trajetória do COEP. Para comemorar a data, estamos lançando o Portal 20 anos COEP, onde é possível conhecer nossa trajetória, e o Programa Comunidades Semiárido, um projeto que desenvolvemos no semiárido nordestino, focado na mobilização e organização comunitária, que tem trabalhado com reaplicação de tecnologias sociais e lideranças jovens. É importante ressaltar que todas as ações que promovemos foram importantes diante do contexto em que estavam inseridas numa determinada época. Acho que o que muda é a visibilidade ou o tamanho que cada iniciativa toma, dependendo de mais ou menos recursos aplicados, mais ou menos pessoas sendo mobilizadas, porém, o importante é a articulação trazida pelas iniciativas que sempre gera um resultado positivo, alguma nova solução ou mudança na sociedade. Estamos sempre buscando pensar à frente do nosso tempo. Agora mesmo, o que nos move é a possibilidade de articular uma rede social com conteúdo, voltada para discussões no campo social, e que as pessoas estejam conectadas por esse motivo.
Rede Mobilizadores – Que ações serão realizadas em comemoração aos 20 anos do Comitê?
R.: Estamos nos fortalecendo, mantendo viva a nossa memória, apesar de estarmos distantes fisicamente. O Portal 20 anos COEP fortalece esse sentido de preservar a memória para construirmos o futuro, o daqui para frente. Desenvolvemos a nossa estratégia de mobilização e o que nos orienta atualmente são as iniciativas com os catadores de materiais recicláveis e o enfrentamento aos desastres climáticos. Mas acredito que o mais importante seja o fato de estarmos continuamente repensando nossa estratégia, fortalecendo as parcerias, mantendo sempre vivo, obviamente, os princípios fundamentais que sempre nos nortearam.
Entrevista para o Eixo de Participação, Direitos e Cidadania
Concedida à: Flávia Machado
Editada por: Eliane Araujo
A maior injustiça contra pobreza é o Salário Mínimo Ilegal.
CArt. 7.º (*) São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender às suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.
omCr$ 678,00 mensais é possível atendera “