Pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), em maio de 2012, revela que, em 9 anos, o acesso à internet subiu de 8% para 33%, colocando o Brasil na média mundial. No entanto, as diferenças entre as cidades são enormes. O maior índice de acesso é em São Caetano (SP), com 74%, e o menor é em Aroeiras (PI), com acesso nulo.
Uma das maneiras de promover a inclusão digital em comunidades que ainda não têm acesso à rede é a instalação de telecentros. Exemplos bem sucedidos estão por todo o país, como é o caso da comunidade Cacimba Cercada, em Mata Grande (AL), que inaugurou seu telecentro, em 2007, por meio de uma parceria com o COEP Nacional.
Nesta entrevista, Oclácio Silva, morador de Cacimba Cercada e um dos fundadores do telecentro, fala da sua experiência como monitor e das mudanças ocorridas e na comunidade depois da construção do espaço.
Mobilizadores COEP: Qual foi a participação da comunidade Cacimba Cercada (Matagrande-AL) na criação do telecentro? E qual era a expectativa?
R.: Em alguns dias de trabalho coletivo de diversos membros da comunidade, a sede da associação comunitária, que era em uma garagem, foi adaptada às necessidades do telecentro.
Quanto à expectativa, houve alvoroço por parte da comunidade. A chegada do telecentro era/é vista como sinônimo de um grande progresso que seria desencadeado ao longo do tempo. O telecentro já era tido como um meio de os moradores conseguirem qualificação, uma especialização, um lugar no mercado de trabalho, a partir dos cursos oferecidos.
Mobilizadores COEP: Os moradores já tinham contato com a internet? Em que local? E você?
R.: O acesso à Internet era raríssimo. Somente pessoas que já haviam feito cursos de informática de fato a conheciam. Essas pessoas eram pouquíssimas por que os cursos, na época, eram muito caros, além de serem em cidades muito distantes da comunidade.
Meu primeiro contato com a internet foi por volta de 2006, no telecentro da comunidade Quixabeira (BA), mas foi no telecentro da comunidade Cacimba Cercada que aperfeiçoei meu conhecimento. O telecentro da comunidade foi o local onde realmente todos os moradores de Cacimba Cercada, que conheciam a internet, aprenderam a manusear um computador e navegar na rede. Antes de o telecentro chegar, só conhecia a internet quem tivesse no mínimo um cursinho básico.
Mobilizadores COEP: Qual é o seu trabalho no telecentro?
R.: Atualmente, é de monitoração dos usuários. Fico no telecentro quarta-feira pela manhã e sábado à tarde. Quando estou lá, auxilio, na medida do possível, as pessoas em pesquisas para escola ou autodidata e em qualquer tipo de busca no mundo virtual. Faço tudo que esteja ao meu alcance e que seja do meu conhecimento.
Mobilizadores COEP: Atualmente, em média, quantas pessoas frequentam o telecentro por semana? E qual é o perfil desses usuários? Mudou desde que foi inaugurado?
R.: Hoje, o telecentro tem em média 35 usuários ativos, sendo: 50% crianças, que buscam diversão, como jogos online; 20% pré-adolescentes, que estão mais voltados para as pesquisas escolares e as redes sociais; 20% adolescentes, que, como o grupo anterior, estão interessados em pesquisas escolares e nas redes sociais, além de gostarem de fazer downloads de músicas e aplicativos; 10% adultos, que utilizam a rede para leitura e comunicação com parentes distantes, além de buscarem temas de seu interesse como, por exemplo, uma receita de bolo, resumo das novelas, etc.
Mobilizadores COEP: Você acha que o telecentro tem contribuído para o desenvolvimento de sua comunidade? De que forma? Dê exemplos.
R.: Com certeza. Logo que o telecentro chegou houve uma entrada de sócios na associação de moradores, possibilitando assim uma melhor organização comunitária na busca de objetivos comuns.
O fato de termos esse espaço tem sido encorajador para lutarmos pelo crescimento, por melhorias em nossa comunidade. Enfim, o telecentro é hoje nossa referência quando estamos na luta por algo. Exemplo disso é a água encanada que não temos ainda. Utilizamos o processo de instalação do telecentro como exemplo e os computadores meio de obtermos este serviço. A gente não tem água encanada, mas pode ter e o telecentro é nosso maior incentivador.
Mobilizadores COEP: Com o telecentro, a comunidade tem mais acesso à informação, isso já esta mudando a expectativa de trabalho e renda entre os mais jovens?
R.: Sim. O telecentro é visto como uma fonte de conhecimento e através dele há expectativa de trabalho. As pessoas se sentem no dever de saber mais sobre o mundo virtual para que algum dia possam utilizar esse conhecimento em beneficio próprio, seja em sua profissão ou mesmo em seu negócio.
Mobilizadores COEP: A comunidade participa da manutenção do telecentro? De que forma? Dê exemplos.
R.: Algumas pessoas que participaram dos cursos e que são monitores ajudam no reparo e manutenção do telecentro. A comunidade, de modo geral, participa das arrecadações de fundos, que são feitas através de sorteios com prêmios doados pelos comunitários ligados à associação. No dia das assembléias ordinárias, acontece o sorteio e a entrega dos prêmios doados. Todo o valor arrecadado vai para manutenção do telecentro.
Mobilizadores COEP: Quais as principais dificuldades para a manutenção do telecentro?
R.: Há uma precariedade em manutenção técnica especializada na comunidade. Os cursos que recebemos foram bons, adquirimos conhecimentos e conseguimos manter nossas máquinas em bom estado, mas em sua maioria foram muito rápidos. Há essa necessidade de cursos mais avançados porque, em alguns casos, ainda dependemos de mão de obra de fora da comunidade, o que gera gastos altíssimos.
Outro fator que dificulta é justamente o dinheiro necessário para manutenção e reparo do telecentro, pois as contas são maiores do que o valor total das contribuições dos usuários.
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Entrevista para o Eixo Erradicação da Miséria
Concedida à: Adriana Porto
Editada por: Eliane Araujo.