Grupo de artesãs da Colônia de Pescadores São Pedro ? Z-3, banhada pela Laguna dos Patos, a 45 minutos do centro de Pelotas (RS), transforma material descartado pelos pescadores, como escamas e peles, em arte.
O Pescando Arthe conta com o apoio do projeto Artesanato do Mar de Dentro, do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) Nacional, desde outubro de 2008, e já lançou a sua primeira coleção, com biojóias, bolsas e outros produtos criados de forma sustentável. Confira entrevista com Karine Portela Soares, representante do grupo.
Mobilizadores COEP ? Qual a principal atividade geradora de renda na comunidade?
R.: Aqui, na colônia, vivem cerca de 5 mil pessoas e, sem sombra de dúvida, a pesca é a principal atividade geradora de renda. Sendo que enfrentamos alguns problemas com ela. De junho a setembro, é o período de defeso*, quando acontece a reprodução dos peixes, então é proibido pescar. De 2009 para 2010, para complicar, tivemos muitas chuvas, o que elevou muito o nível de água da lagoa, não permitindo a entrada de água salgada do mar na laguna, comprometendo a pesca, e, consequentemente, o sustento das famílias.
Mobilizadores COEP ? O que é pescado pela comunidade?
R.: Tainha, em janeiro e fevereiro, a corvina, de outubro a dezembro, e o camarão, em fevereiro.
Mobilizadores COEP ? Como surgiu o grupo Pescando Arthe?
R.: A sementinha foi lançada em 2004, quando eu e mais três integrantes do atual grupo participamos de uma oficina promovida pela prefeitura. Depois, a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Rio Grande do Sul (Emater-RS) realizou várias oficinas voltadas às mulheres, como a de produção de flores e bijuterias a partir de escamas de peixe. Começamos, então, a trabalhar com o artesanato, mas de maneira bem acanhada. O apoio do Sebrae, a partir de 2008, foi decisivo para aprendermos a lidar com o artesanato como um negócio mesmo, capaz de nos gerar renda. Aprendemos, por exemplo, a calcular o preço das peças (levando em conta gastos, tempo e mão de obra), o que antes era feito de maneira aleatória.
Mobilizadores COEP ? O que os homens da comunidade acharam da ideia?
R.: Todas as mulheres da Pescando Arthe tem algum laço com a pesca: ou são mulheres de pescadores, ou filhas, parentes; então eles ajudam a gente. Afinal, estamos contribuindo para as despesas da casa.
Mobilizadores COEP ? Quais as matérias primas usadas no artesanato?
R.: Usamos escamas, pele de peixes e redes de camarão. Com as escamas, misturadas com prata, produzimos biojóias, como brincos, pulseiras e colares. Com a pele curtida dos peixes, fazemos chaveiros, carteiras e bolsas. Com as redes, fazemos bolsas, nécessaires e chapéus, que são feitos no crochê ou tecidos num tear rústico.
Para confeccionarmos os produtos, lavamos bem as escamas com alvejante. Já as redes, lavamos só com detergente, pois se usarmos cloro, as cortamos. As peles dos peixes ainda são curtidas no curtume. Tentamos fazer o processo de forma caseira, em baldes, mas não ficou bom.
Mobilizadores COEP ? Quanto custam, em média, os produtos?
R.: O preço varia. Uma pulseira feita de escamas e prata, por exemplo, custa R$ 15,00. Temos colares de R$ 97,00, mas o nosso produto mais caro são as bolsas, que vão de R$ 110, 00 a R$ 230,00.
Mobilizadores COEP ? Como é a produção e comercialização dos produtos?
R.: Por enquanto, produzimos individualmente, em casa. Ainda não temos sede, nem podemos formar uma cooperativa, pois somos menos de 20 pessoas. Nós nos reunimos de acordo com a necessidade. O grupo conta com uma caixinha para comprarmos linha, tintas, forro e outros materiais e também para mandarmos curtir a pele dos peixes no curtume etc., mas quando vendemos os produtos, cada uma ganha pelo que produziu. Por exemplo, se criei as biojóias vendidas, uma parte vai para o caixinha (para repor o que foi gasto em matéria prima), e o restante do dinheiro vai para mim.
Mobilizadores COEP ? Como está sendo com a primeira coleção de vocês, a Coleção Redeiras?
R.: Começamos a trabalhar na coleção em agosto de 2009, com o respaldo do Sebrae-RS, que realizou o planejamento de cada etapa do projeto, desde a criação das peças até o gerenciamento da coleção. Lançamos a coleção na feira Paralela Gift, em São Paulo (SP), em fevereiro de 2010, também com apoio do Sebrae-RS. Foi um bom começo. Na feira, vendemos o que tínhamos para pronta-entrega e tivemos várias encomendas. Agora estamos fazendo as entregas aos lojistas e preparando nosso estoque, pois vamos ter um estande na Feira Nacional do Doce de Pelotas – Fenadoce, ainda em maio.
Mobilizadores COEP ? Quais as perspectivas para o futuro?
R.: Queremos fortalecer o nosso grupo, o nosso trabalho, para depois agregarmos mais mulheres e quem sabe formarmos uma cooperativa.
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*Defeso é a ação de proteção às espécies, que consiste em fiscalizar a pesca no período em que a piracema acontece. O principal objetivo é coibir a pesca predatória.
Piracema é o período entre outubro e março, quando os peixes sobem até as cabeceiras dos rios, nadando contra a correnteza para realizar a desova e a reprodução. Este fenômeno é considerado essencial para a preservação da piscosidade das águas dos rios e lagoas.Entrevista do Grupo Gênero, Combate à Discriminação e Grupos PopulacionaisConcedida à: Renata OlivieriEditada por: Eliane Araujo