A coordenadora do ?Programa Rio: Trabalho e Empreendedorismo da Mulher?, Angela Fontes, apresenta a metodologia e as perspectivas do programa que visa ampliar o acesso das mulheres ao mercado de trabalho. Voltado para mulheres com capacidade empreendedora e em situação de risco social, o programa desenvolve capacitação das participantes, oferta ferramentas para instalação de negócios e promove reflexão sobre o ?ser mulher?. Segundo a coordenadora, o apoio ao empreendedorismo das mulheres deve levar em conta suas necessidades específicas e a forma com que cada uma delas pode romper a desigualdade de gênero. Outro componente do programa é a capacitação de gestores públicos estaduais e municipais que apóiam a execução das ações.Mobilizadores COEP – Segundo dados do IBGE, referentes a 2000, do total de pessoas economicamente ativas no estado do Rio de Janeiro, 56% são homens e 44% são mulheres. Sabe-se que, com relação às mulheres, cerca de 6% recebem até meio salário mínimo. O que caracteriza a situação de pobreza e extrema pobreza entre as mulheres?R. Somos, nós mulheres, tradicionalmente responsáveis pelas ações de reprodução da vida no espaço doméstico ? lavar, passar, cozinhar, costurar, fazer o dever de casa com as crianças, dar os remédios nas horas certas nos momentos das doenças, cuidar dos idosos, chorar junto, refazer as energias para acreditar num novo tempo, compartilhar os momentos de felicidade ? e, a partir da última metade do século passado, estamos cada vez mais inseridas diretamente na produção, vale dizer, no mundo do trabalho. Entretanto, como a sociedade não assumiu o compartilhamento das tarefas domésticas entre homens e mulheres, quando saímos para o mercado de trabalho, formal ou informal, temos que ter uma outra mulher nos substituindo para a realização das tarefas domésticas, o que significa que ocorre uma transferência em cadeia do que é considerado o ?papel da mulher?. Quando consideramos esta realidade e o contexto de deficiência na prestação de serviços públicos é possível compreender porque as mulheres são as mais pobres entre os pobres, embora apresentem uma taxa de escolaridade superior à masculina. Vale dizer, há uma expectativa de que o cumprimento do papel tradicional trará deficiências no dia-a-dia do mundo do trabalho, fazendo com que as mulheres tenham menos oportunidades de acesso aos melhores postos de trabalho e, conseqüentemente, a melhores salários. Nós, mulheres, recebemos em todas as faixas salariais menor remuneração que os homens para os mesmos trabalhos e são razões extra-econômicas que não asseguram às mulheres renda igual a dos homens com igual escolaridade. No conjunto das mulheres ocupadas, temos 21% como empregadas domésticas. É neste quadro que temos o aumento do número de mulheres como chefes de família, ou seja, aquela pessoa responsável pelo sustento dos demais, e na maioria das vezes, são famílias que contam apenas com as mulheres e possuem um maior número de crianças e idosos.Mobilizadores COEP – O que é ?Programa Rio: Trabalho e Empreendedorismo da Mulher?? Quais suas estratégias e ações? Quantas instituições participam da iniciativa?R. O programa visa ao cumprimento de uma das ações do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), definido em 2004 e revisto na II Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (II CNPM), realizada em 2007, em Brasília, pela Secretaria Especial de Política para as Mulheres da Presidência da República (SPM) e pelo Conselho Nacional de Direitos da Mulher (CNDM). O objetivo é ampliar o acesso das mulheres ao mercado de trabalho e promover sua autonomia econômica e financeira por meio do apoio ao empreendedorismo, associativismo, cooperativismo, crédito, microcrédito e à comercialização.O programa teve início em 2007, no estado do Rio de Janeiro. Vale ressaltar que a definição pelo Rio de Janeiro se deu em função dos investimentos previstos para os próximos anos no estado, o que oferece uma janela de oportunidades no sentido de propiciar a formulação de políticas ? públicas e privadas ? que melhorem a qualidade de vida da população em geral e das mulheres em especial, considerando novos postos de trabalho formal, de geração de renda e de novos empreendimentos. Pretende ser um programa demonstração para os demais estados brasileiros, sendo prevista sua implementação, ainda em 2008, em Santa Catarina, Paraíba e Distrito Federal. Sua execução se dá através das seguintes instituições: Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam), responsável pela coordenação geral do programa; Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado do Rio de Janeiro (Sebrae/RJ); Associação de Mulheres de Negócios e Profissionais do Rio de Janeiro (BPW RJ) e a Associação para o Desenvolvimento da Mulher do Rio de Janeiro (BM Rio). Tem o patrocínio da SPM, parceria com a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro (SEASDH) e conta com o apoio de instituições da iniciativa privada e governos locais.Mobilizadores COEP – Qual o perfil sócio-econômico das participantes do programa? De que modo elas são selecionadas?R. O público prioritário é formado por dois grupos: i) mulheres fluminenses com capacidade empreendedora que possam tanto criar novos negócios, como desenvolver os existentes; e ii) mulheres pobres, vulneráveis e em situação de risco social, participantes ou não dos programas de inclusão social e sua rede familiar. Em paralelo, tem-se também como público prioritário os gestores públicos estaduais e municipais e das redes locais de apoio a sua execução, que receberão atendimento próprio caracterizado por um processo de capacitação.As mulheres são convidadas a participar do programa a partir de uma primeira ação desenvolvida: reuniões de sensibilização com instituições que atuam diretamente na ponta em trabalhos com esse segmento. Nesses encontros, elas são convidadas para os seminários onde é apresentado o conjunto de ações do programa, como cursos e oficinas de trabalho. Os seminários ?deslancham? um processo de capacitação em separado para cada grupo de mulheres. Até agora, o programa já realizou seminários em Campo Grande, na Zona Oeste do município do Rio de Janeiro, e nos municípios de Barra Mansa, Itaguaí, Itaperuna e São Gonçalo. A participação média foi de 150 mulheres. Os próximos seminários ocorrerão nas cidades de Nova Friburgo, Campos dos Goytacazes, Três Rios, Nova Iguaçu e Angra dos Reis.Com relação aos gestores públicos estaduais, foram realizadas as atividades relacionadas ao fórum e às oficinas de trabalho. Está prevista, também, a realização de oficinas descentralizadas com os gestores estaduais e municipais e com conselheiros e conselheiras municipais das áreas de assistência social, direitos humanos, direitos da mulher, promoção da igualdade racial e trabalho e renda.Mobilizadores COEP – O empreendedorismo é incentivado? De que forma? São oferecidas às participantes cursos de capacitação, oficinas de trabalho para criarem e gerirem seus próprios negócios?R. A proposta é que as mulheres (re)pensem suas vidas e seus propósitos de sobrevivência sob uma perspectiva de gênero como relação social, que compreendam nossas conquistas no decorrer das décadas, assim como os problemas e dificuldades que persistem. Os cursos oferecidos pelo Sebrae, considerando essa nova perspectiva, visam ofertar ferramentas para a instalação de negócios que apresentem possibilidades de sobrevivência em meio ao mundo das micro e pequenas empresas. Neste sentido, entre as mulheres que participaram dos seminários, 289 foram capacitadas pelo Sebrae/RJ em quatro cursos diferentes. Os cursos da BM Rio, direcionados às mulheres em situação de risco social, visam: i) propiciar instâncias de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal; ii) analisar as situações vivenciadas pelas mulheres no contexto das relações de gênero; iii) introduzir noções básicas sobre cidadania, direitos e violência contra a mulher; iv) sensibilizar em relação à cultura empreendedora e sua importância para o desenvolvimento pessoal. Há, portanto, um incentivo concreto às ações de empreendedorismo.Mobilizadores COEP – Já é possível identificar quais são os principais empreendimentos desenvolvidos pelas mulheres fluminenses? De que modo o programa pretende apoiar esses empreendimentos para um crescimento em bases sólidas?R. Com relação às atividades das participantes dos seminários, o ramo da alimentação se destacou com 27%, seguido de comércio com 11,7%, serviços com 10,9%, vestuários com 8% e demais atividades em menor número. Para as participantes dos cursos, ao final, são oferecidas oficinas de direcionamento estratégico com o objetivo de apoiar e fortalecer não apenas aquele grupo de mulheres, como as mulheres individualmente em suas escolhas de negócios. Esse apoio consiste em orientação para o mercado, em trabalhar oportunidades e nichos de mercado. No aspecto das políticas públicas fica a proposta de que os governos municipais também visualizem – por meio de seus núcleos de inclusão produtiva, relacionados às secretarias de assistência social, trabalho ou desenvolvimento econômico, conforme a realidade local – as possibilidades de seu próprio desenvolvimento em suas dimensões humana, ambiental, econômica e social.Mobilizadores COEP ? Como o microcrédito será oferecido às participantes? Quais serão os valores oferecidos e quais as condições para concessão do crédito?R. Com relação ao crédito e microcrédito, a proposta é fortalecer e ampliar a oferta e expandir as instituições operadoras de microcrédito que trabalham no Rio, considerando o papel das agências de fomento existentes no estado, como o Investe Rio, ligado à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços do Rio de Janeiro, assim como o programa de microcrédito da Secretaria de Estado de Trabalho e Renda do Rio de Janeiro – ambos em processo de recomposição. Há, também, os mecanismos de crédito do governo federal, como, por exemplo, as ações do PAIF [Programa de Atenção Integral à Família], via Caixa.A formulação de uma ação afirmativa a ser desenvolvida em prol das mulheres visando ao empreendedorismo deverá considerar as razões culturais da construção do ser mulher e o como cada uma de nós rompe as barreiras da discriminação e da desigualdade de gênero e, se for o caso, abre ou não um empreendimento. Ou seja, temos ações anteriores ao crédito e ao microcrédito. O método de trabalho está relacionado com a perspectiva de auto-estima, de organização individual e de ferramentas técnicas, como a elaboração de um plano de negócio, que vai permitir avaliar se precisa ou não de crédito e, em caso afirmativo, de quanto, com que prazo de pagamento, com qual a taxa de juros, entre outros dados inerentes ao crescimento e à manutenção do negócio. O processo ocorre, então, com dois eixos encadeados: capacitação específica quanto ao ser mulher e ser uma mulher empreendedora e oferta de crédito ou microcrédito.Outra questão a ser debatida diz respeito ao próprio processo de concessão do microcrédito. Como contraponto vale lembrar que para o crédito convencional foram disseminadas diferentes formas de levar para o sistema financeiro grande parcela da população brasileira ? mulheres e homens ? por meio da bancarização dos procedimentos da área previdenciária e facilidade de abertura de contas correntes, ou seja, houve a definição de uma política pública programada e executada para tal fim.Mobilizadores COEP – Quais as principais dificuldades enfrentadas no desenvolvimento do programa? Como elas foram superadas? Quais as metas para o período 2008-2009?R. Nossos desafios estão relacionados com o ser mulher, com o conseguir deixar as tarefas domésticas, a trabalheira de todo dia para freqüentar uma sala de aula, um processo de capacitação, participar da discussão sobre o que vem a ser a relação de poder entre homens e mulheres na sociedade e como ela se impõe na nossa vida, no nosso cotidiano.Alguns pontos merecem destaques: i) é possível afirmar que a mobilização das instituições locais para a reunião de sensibilização é a pedra de toque, dá a medida das possibilidades de sucesso ou não em cada localidade; ii) necessidade de promover uma maior articulação com os atores que podem contribuir para ações de desenvolvimento local em suas dimensões humana, ambiental, econômica e social.As metas do próximo ano estão relacionadas com a realização dos cinco seminários nos municípios acordados, com seus respectivos cursos e oficinas. Por outro lado, temos o monitoramento das ações ocorridas em 2007, pelos gestores públicos e pela rede de desenvolvimento local – formada pelos atores locais capazes de impactarem a economia local e, conseqüentemente, o mundo do trabalho, formal e informal -, visando dar suporte e continuidade às possibilidades de trabalho, em especial para as mulheres.Mobilizadores COEP – Como é possível obter mais informações sobre o programa?R. Podem ser obtidas pelos telefones (21) 2536-9767 e (21) 2536-9757, assim como pelo e-mail programario@ibam.org.brEntrevista concedida a: Herculis TolêdoEdição: Danielle Bittencourt e Eliane AraújoEsperamos que tenham gostado da entrevista. Lembramos que o espaço abaixo é destinado a comentários. O entrevistado não se compromete a responder as perguntas aqui postadas.