Primeiro integrante do Projeto Comunidades Semiárido do COEP, o Assentamento Margarida Maria Alves, localizado no município de Juarez Távora (PB), tem feito várias conquistas a partir da organização comunitária. Após quase uma década os resultados demonstram a conscientização dos produtores e beneficiam os moradores. Entre estas conquistas, destacam-se o campo coletivo de produção agroecológica e a miniusina de beneficiamento de algodão. Ambos agregaram valor à produção e fortaleceram a vida do agricultor, conforme afirma nesta entrevista a presidente da Associação dos Agricultores, Margarida da Silva Alves, ou simplesmente Dona Preta, como gosta de ser identificada. ?Temos muito orgulho de termos sido a primeira comunidade integrante do COEP. Sentimos uma imensa satisfação, pois através do que foi implantado aqui em nossa comunidade passamos a ser reconhecidos nacionalmente e internacionalmente?, afirma. Mobilizadores – O assentamento Margarida Maria Alves foi a primeira comunidade integrante do Programa Comunidades COEP. De que forma tudo começou?R.: Começou com a Embrapa Algodão de Campina Grande (PB), que é parceira do COEP. Através do senhor José Mendes, agrônomo da Embrapa, que visitou nossa comunidade juntamente com outros companheiros de trabalho, em 1999, nos foi levada a proposta do COEP para fazermos parte da iniciativa, com o principal objetivo de resgatar a cultura do algodão. E foi assim que tudo começou.Mobilizadores – Como se deu o processo de mobilização? O que foi necessário para dar início à organização da comunidade?R.: O processo de mobilização no começo foi um pouco difícil. Foram necessárias muitas reuniões informativas sobre de que maneira poderíamos mudar a vida do povo da comunidade. Aos poucos, eles foram entendendo que tudo aquilo poderia trazer benefícios. A organização foi acontecendo de uma forma lenta. Hoje, o pessoal não quer de maneira alguma ficar sem o COEP.Mobilizadores – Qual era a realidade do assentamento antes da chegada do COEP?R.: Na época, tínhamos conquistado apenas a terra, mas não tínhamos a repartição de lotes. A criação acontecia no espaço comum. Já existia a Associação, mas as pessoas cadastradas tinham muita dificuldade de entender o que seria associativismo.Mobilizadores – E o que mudou após a implantação do projeto do COEP?R.: A situação mudou em vários aspectos. Por exemplo, quanto à conscientização da comunidade. Todos passaram a trabalhar coletivamente em prol da associação. Antes, na produção do algodão na comunidade, era usado agrotóxico. Hoje, passou essa produção passou a ser totalmente agroecológica. Também através do COEP chegou a energia elétrica com sistema trifásico. Em seguida, fomos beneficiados com uma miniusina de beneficiamento de algodão, a qual veio agregar valor ao nosso produto e assim fortalecer a vida do agricultor. Depois veio um orelhão [telefone público] e um telecentro para facilitar os trabalhos dos estudantes e a comunicação da própria comunidade. Foi implantada na comunidade a criação de ovinos. Começou com quatorze famílias beneficiadas e, hoje, já são mais de trinta. Contamos também com a vinda de duas barragens subterrâneas, onde dois agricultores foram beneficiados e estão satisfeito com os resultados. Após, veio uma biblioteca rural (Arca das Letras) para facilitar ainda mais o incentivo à leitura, tanto para os estudantes quanto para os agricultores.O COEP não nos trouxe dinheiro, nem emprego, mas nos trouxe a base de todo o conhecimento e informações que transformaram a vida do povo deste assentamento. Ainda temos nossas necessidades, mas aprendemos a buscar e lutar pelos nossos objetivos. Melhor ainda, através do nosso trabalho e organização, passamos a ser admirados por outras associações e até mesmo por pessoas de outros países que já vieram nos visitar para conhecer nossos cartões postais, que são a miniusina e o campo coletivo de algodão agroecológico.Temos muito orgulho de termos sido a primeira comunidade integrante do COEP. Sentimos uma imensa satisfação, pois através do que foi implantado aqui em nossa comunidade passamos a ser reconhecidos nacionalmente e internacionalmente. Mobilizadores – A valorização da associação foi importante para os resultados obtidos pelo assentamento? R.: Sim, quando as pessoas da comunidade começaram a entender que a associação seria a base de tudo, começaram valorizar tudo que ouviam e outras pessoas começaram a nos admirar pela organização. Por exemplo, antes era produzido feijão, milho, fava e algodão. Plantavam de qualquer jeito sem pensar na preservação do solo. E agora produzimos os mesmos alimentos, no entanto, de uma forma mais consciente, cuidando bem do solo. Usamos curvas de nível e não utilizamos agrotóxicos. Mobilizadores – Como se deu a sua participação neste processo de mobilização comunitária? O que a motivou?R.: No ano de 2003, a tesoureira na época abandonou o cargo. Então, o povo da comunidade me convidou a ocupá-lo. Eu nem era associada, entretanto, mesmo assim aceitei assumir a Tesouraria. O que me motivou foi que já havia uma organização, só faltava mesmo era um pouco mais de perseverança para alcançar nossos objetivos. Desta forma, comecei incentivando a busca de recursos próprios para Associação, valorizando cada centavo adquirido pelos associados. E assim, com o nosso trabalho, já conseguimos vários bens.Mobilizadores – Quais os principais obstáculos enfrentados em todo esse período? E quais os resultados obtidos?R.: Os principais obstáculos foram a falta de compreensão e a falta de participação por parte de alguns associados. Temos superado isso através do diálogo, respeitando sempre a posição de cada um. Quanto aos resultados, já obtivemos uma miniusina que nos beneficia com a produção de algodão com valor agregado. Além disso, temos um trator com todos os equipamentos para beneficiar o agricultor na hora que precisar; e um telecentro de grande utilidade na comunidade, permitindo que o filho do agricultor fique conectado através da internet.Mobilizadores – De que forma a senhora mobiliza recursos para a comunidade? R.: Através de empresas, Organizações Não Governamentais (ONGs), sindicatos e da Prefeitura. Incentivo muito o trabalho coletivo na comunidade, que acontece toda segunda-feira. Todos os associados trabalham em uma área comunitária com plantio de algodão agroecológico. Toda renda obtida é usada em prol da associação. Desejamos muito que aconteça alguma coisa que gere renda para os jovens e mulheres da comunidade na área do artesanato. Ainda somos carentes de água e estamos lutando para conseguirmos.Mobilizadores – Como é a participação dos moradores em sua comunidade? O que tem feito para atrair mais gente?R.: A participação é boa, não posso dizer que é 100% porque há algumas falhas. Tenho sempre mostrado à comunidade que a Associação é muito importante para todos e que através dela conseguimos recursos que podem mudar nossas vidas. Tenho certeza que o meu trabalho na comunidade mudou alguma coisa. No ano de 2003, tínhamos apenas os homens associados. Hoje, temos 80 associados, incluindo homens, mulheres e jovens. Todos de alguma forma participam da associação.Mobilizadores – Qual a importância do Comitê Mobilizador? De que maneira ele tem ajudado a solucionar os principais problemas da comunidade?R.: O Comitê é muito importante em várias atividades na comunidade. Tem ajudado na mobilização de pessoas para as reuniões, no monitoramento do telecentro, e representando a comunidade em encontros. Enfim, é uma ferramenta fundamental na Associação.Mobilizadores – O nome do assentamento foi dado em homenagem a Margarida Maria Alves, que foi presidente do sindicato dos trabalhadores rurais de Alagoa Grande e a primeira mulher a lutar pelos direitos trabalhistas no estado da Paraíba durante a ditadura militar. Como a história desta líder a inspira no dia a dia?R.: Inspira-me porque sempre admirei a coragem que ela tinha de enfrentar os obstáculos, principalmente por parte dos “poderosos” da região. Com isso, aprendi a enfrentar os problemas de frente, com cabeça erguida, seja como esposa, mãe ou como membro da comunidade.Mobilizadores – Qual deve ser papel das mulheres na solução dos problemas comunitários?R.: O papel das mulheres é o de participar cada vez mais nas reivindicações para busca de seus objetivos, e assim, conseguir uma fonte de renda dentro da própria comunidade. E acreditar que ela pode, e que somos capazes de fazer a diferença. ____________________Entrevista para o Grupo Fortalecimento ComunitárioConcedida à: Marcelo CoppeliEditada por: Eliane Araujo.