Olívia Bandeira de Melo, coordenadora do projeto Olho Vivo daONG Bem TV ? Educação e Comunicação, fala sobre a metodologia do projeto ? que reúne atividades de produção de mídia, discussões sobre protagonismo juvenil e levantamento da memória e da situação de vida local ? e sua contribuição para o envolvimento dos adolescentes e jovens com os problemas das comunidades e para o aumento da capacidade de expressão oral e escrita dos participantes. O projeto Olho Vivo, um dos vencedores do Prêmio Itaú Unicef em 2007, atualmente é desenvolvido em cinco comunidades de Niterói (RJ) ? Preventório, Jurujuba, Grota, Morro do Estado e Caixa D?água – e atende a cerca de 110 jovens.Mobilizadores COEP – O que é o projeto Olho Vivo?R. Em 1998, a Bem TV ? Educação e Comunicação foi convidada pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Niterói [RJ] a integrar o grupo gestor da Agenda 21 Local do Morro do Preventório. O processo evidenciou uma forte demanda na comunidade por ações de atendimento à população jovem. Coube à Bem TV elaborar uma resposta a essa demanda, tendo em vista a experiência acumulada pela instituição no atendimento a esse público, alvo de suas ações desde 1992, quando foi fundada. Em 1999 e 2001 (fiquei na dúvida se não seria de 99 a 2001) a Bem TV realizou no Preventório as primeiras oficinas (de produção audiovisual), dando origem ao grupo ?Nós na Fita?, até hoje atuante na comunidade, agora dentro do projeto Olho Vivo.No início de 2002, o grupo gestor da Agenda 21 Local do Preventório se dispersou. Para dar continuidade às ações que vinha desenvolvendo na região, a Bem TV iniciou em 2003 o projeto Olho Vivo, com apoio do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e do Instituto C&A, com o objetivo de utilizar a fotografia na formação de jovens comprometidos com o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida de sua comunidade.Um ano depois, por demanda dos jovens do projeto, abrimos uma oficina de mídia impressa. No final de 2004, já havia na comunidade um jornal impresso gerenciado por jovens (o Palavra do Morro), um cineclube e um grupo de produção fotográfica. Foi implantado um ?Conselho de Comunicação Comunitária? (mais tarde absorvido pelo Comitê Local de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes) criando espaço para discussão coletiva de temas locais. Esses resultados motivaram a expansão do projeto, em 2005, e com o patrocínio da Petrobras, para as comunidades vizinhas: Grota do Surucucu e Colônia de Pesca de Jurujuba. Nessa época, começamos também a trabalhar com oficina de internet (webdeveloper).Hoje, o projeto Olho Vivo está em cinco comunidades ? Preventório, Jurujuba, Grota, Morro do Estado e Caixa D?água, atendendo a cerca de 110 jovens. Já passaram pelo projeto, ao longo desses anos, cerca de 380 adolescentes e jovens. Além das oficinas, assessoramos os grupos de jovens comunicadores que desenvolvem produtos em suas comunidades: o grupo de produção audiovisual Nós na Fita, o grupo de fotografia Olho Vivo e o grupo de webdeveloper Virtuação.Para desenvolver as atividades em 2008, contamos com patrocínio da Petrobras, parceria do Sesc Niterói e recursos do Prêmio Itaú Unicef, que o projeto ganhou em novembro de 2007.Mobilizadores COEP – Como os jovens são selecionados para participar do projeto?R. Para se inscrever nas oficinas de mídia, os jovens precisam ter entre 14 e 18 anos, ter domínio básico da leitura e escrita e residirem nas comunidades-alvo do projeto. A seleção inclui redação de 10 linhas sobre os motivos que o levam a buscar participação na oficina, preenchimento de cadastro sócio-econômico e entrevista pessoal com dois membros da equipe do projeto. São critérios a disponibilidade de tempo, o interesse demonstrado pelas atividades propostas e o fato de estudarem nas escolas da comunidade.Ser egresso das oficinas de mídia é uma condição desejável, mas não obrigatória para quem quer participar dos grupos de jovens comunicadores, cujo acesso é mediado pelos próprios jovens que integram cada um dos grupos. Cada grupo tem procedimentos próprios para a seleção de novos integrantes. Enquanto o grupo Nós na Fita realiza entrevista coletiva (todos os membros participam) com o ?candidato?, o grupo editor do jornal Olho Vivo franqueia a participação a qualquer interessado. A Bem TV municia esses processos viabilizando oportunidades de discussão sobre ética e inclusão, mas não interfere na decisão dos grupos.Mobilizadores COEP – Qual o perfil dos adolescentes envolvidos no projeto?R. Os jovens envolvidos no projeto têm entre 14 e 22 anos, são moradores das comunidades do Preventório, Jurujuba, Grota (Zona Sul de Niterói), Morro do Estado (Centro) e Caixa D?água (Zona Norte). Sessenta e três por cento dos jovens participantes do projeto são mulheres, situação semelhante à observada nas escolas de 6º ao 9º ano e de ensino médio. Aliás, pertence a essas faixas de escolaridade a maior parte dos participantes do projeto: 59% estão no ensino fundamental, 39% estão no ensino médio e 2% fazem curso superior. A renda familiar média dos integrantes da oficina é de dois salários mínimos.Mobilizadores COEP – Como acontece a formação dos jovens? Quais são as principais atividades promovidas pelo projeto? Poderia contar um pouco sobre as principais produções realizadas pelos jovens no projeto? Que temas são trabalhados?R. As oficinas básicas do projeto Olho Vivo (fotografia, internet, vídeo e mídia digital) duram cinco meses, com aulas três vezes na semana. A metodologia envolve um módulo básico (discussões gerais sobre protagonismo juvenil e movimento social, formação de grupo, técnicas básicas de comunicação), um segundo módulo de levantamento da memória local e um terceiro módulo de diagnóstico da situação de vida das comunidades. Cada oficina tem dois professores e todas as aulas misturam as técnicas de cada meio de comunicação com o debate de temas de interesse da juventude e das comunidades de baixa renda.Depois da formação básica, os jovens que quiserem podem continuar no projeto, integrando os grupos de jovens comunicadores, que desenvolvem atividades diversas com assessoria da Bem Tv. Hoje, há três grupos no projeto: Nós na Fita, Olho Vivo e Virtuação. O grupo Nós na Fita produz vídeos e tem um cineclube mensal itinerante. A produção envolve tanto vídeos para serem exibidos nas comunidades (com temas diversos como Lixo, Gravidez na Adolescência, Memória, Papel da Escola Pública, etc.) como vídeos para serem exibidos em canais de televisão (eles estão, no momento, produzindo um vídeo sobre grupos de jovens artistas de Niterói para o Canal Futura).O grupo Virtuação mantém o sítio eletrônico Niterói Comunidades (www.niteroicomunidades.org.br), com matérias relacionadas ao cotidiano das comunidades onde moram, e oferecem monitoria para crianças de escolas públicas e alunos de outros projetos. O grupo Olho Vivo produz ensaios e exposições fotográficas e faz o jornal bimestral que tem o mesmo nome do grupo. O Olho Vivo já fez duas exposições fotográficas que circularam em espaços culturais de Niterói, do Rio de Janeiro e da França: uma sobre o dia-a-dia de suas comunidades e outra sobre educação pública. Em 2008, eles planejam uma exposição sobre trabalhadores de Niterói. O jornal Olho Vivo fala de temas de interesse dos jovens e das comunidades onde moram: já saíram matérias sobre Hip Hop, poluição da baía de Guanabara, capoeira, e entrevistas com artistas como Nega Gizza e Gabriel O Pensador.Além do aprendizado na prática, os jovens comunicadores também participam de oficinas de aperfeiçoamento. Em 2008, por exemplo, o grupo Nós na Fita terá uma oficina avançada de câmera e iluminação, o grupo de fotografia participará de oficinas de Photoshop e elaboração de projetos, e o grupo Virtuação fará capacitação avançada de Internet.Mobilizadores COEP – Como o projeto estimula o senso crítico e a participação dos adolescentes nas comunidades onde vivem?R. A metodologia do projeto ? baseada na produção de mídia pelos adolescentes ? enfatiza o desenvolvimento da capacidade de expressão oral e escrita e a competência para analisar criticamente diferentes discursos (visual, verbal, iconográfico) e a realidade brasileira. O levantamento da memória das comunidades, feito pelos jovens nas oficinas, os faz entender os diversos fatores que geraram a situação presente e ajuda esses jovens a desenvolver laços com a região onde moram. Os alunos também fazem um diagnóstico da situação de vida da região e são estimulados a pensar em estratégias para solucionar ou minimizar os problemas que eles encontram a partir do diagnóstico.A participação dos jovens na gestão dos projetos e sua integração com diversas instituições locais ? associação de moradores, associação de mulheres, postos de saúde, escolas, comércios, projetos esportivos e culturais – também contribuem para ampliar seu senso crítico e sua capacidade de solucionar problemas.Mobilizadores COEP – Em relação à vida pessoal dos adolescentes e à mobilização comunitária, que resultados do projeto destacaria? A participação no projeto contribui para melhorar o desempenho dos adolescentes na escola?R. Depois de passar pelo projeto, os jovens ficam mais comunicativos, com maior capacidade de crítica e reflexão, com maior capacidade de argumentação e de leitura e escrita. Os textos publicados nos jornais e nos sites, a qualidade dos vídeos realizados e os temas escolhidos para as produções são exemplos desses resultados. Outro resultado é o envolvimento desses jovens com os temas e as lutas de interesse de suas comunidades. Mesmo os que saem do projeto continuam se envolvendo com a mobilização comunitária. Como exemplo, posso citar Eliana Terra, do Preventório, que não está mais no projeto, mas faz parte do comitê que discute a implementação do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) do Governo Federal em sua comunidade. E, é claro, os jovens adquirem competências técnicas que podem ajudá-los a conseguir um emprego, além de ficarem estimulados a cursar uma faculdade. Temos atualmente, no projeto, quatro alunos cursando universidade.Hoje mais da metade (53%) dos participantes do projeto observa melhoria no seu desempenho escolar. Mas, o que consideramos mais importante na relação dos jovens com as escolas da região é o envolvimento deles com trabalhos que visam à melhoria da qualidade de ensino. Os jovens já fizeram vídeos, exposições fotográficas e uma publicação que discute a situação do ensino no Brasil e desenvolvem uma série de atividades em escolas, como oficinas sobre sexualidade, monitoria de informática e auxílio a professores que queiram trabalhar com comunicação na sala de aula.
Caixa D´ÁguaPreventórioMorro do EstadoGrota do Surucucu Isabella XimenesDyego RodriguesDavid Monteiro AlvesSabrina da Silva PachecoEntrevista concedida à: Danielle BittencourtEdição: Danielle Bittencourt e Eliane Araújo
Esperamos que tenham gostado da entrevista. Lembramos que o espaço abaixo é destinado a comentários. O entrevistado não se compromete a responder as perguntas aqui postadas.
Ótimo trabalho realizado pela Bem TV! Gostaria de saber se existe uma sistematização das experiências e a possibilidade de replicação dos projetos em outros lugares.