Cleomar Manhas, do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), fala sobre os projetos de protagonismo juvenil realizados pela entidade e comenta a importância de estimular a participação desde cedo, nas escolas. ?Se olharmos uma sala de aula do século XIX, veremos que pouco mudou com relação à forma e com relação à disciplina?, aponta. ?Quando propomos novas práticas, estamos contribuindo com novos ventos, com novas inspirações e conspirações salutares?, completa.
Mobilizadores COEP – De maneira geral, adolescentes se interessam por acompanhar e influenciar políticas públicas?
R. Quando estimulados, meninos e meninas participam e percebem o papel de cada um no controle social de políticas voltadas para esse público. Aqui no Inesc trabalhamos o orçamento público com escolas públicas, para alunos de segundo grau, e é visível a diferença após a formação, pois começam a perceber que as opções orçamentárias têm a ver com as opções políticas. Percebem a importância em discutirem educação de qualidade, prevenção da exploração sexual, a prevenção do trabalho infantil etc.
Mobilizadores COEP – Muitas das questões discutidas em Câmaras de Vereadores e no Congresso Nacional influenciam a vida dos jovens, mesmo que eles não saibam. Como fazer para despertar essa percepção?
R. A educação e a sensibilização são formas de despertar pessoas, sejam adolescentes ou adultos, para a importância da participação e do controle democrático das políticas públicas, desde a sua formulação até a sua execução. A nossa experiência é o trabalho desenvolvido nas escolas públicas, que tem rendido bons frutos. Os adolescentes envolvidos no projeto já participam de audiências públicas e de seminários para discussão de políticas voltadas para a infância e juventude, além de serem protagonistas em vários espaços de participação.
Mobilizadores COEP – Quais os assuntos mais interessam aos jovens, depois que eles começam a entender e participar da discussão de políticas públicas?
R. Essa é uma pergunta difícil de responder, visto que as pessoas, sejam jovens ou não, são diferentes e com interesses diversos. No entanto, como trabalhamos com escolas e comunidade escolar, o foco principal acaba sendo a própria escola e o que se entende por educação de qualidade. Outra questão bastante ressaltada é o despertar para os seus direitos. A compreensão do que são direitos e a mobilização para conquistá-los.
Mobilizadores COEP – O Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) foi criado em 2005, para formular políticas públicas para a juventude, entre outras atribuições. A participação de organizações da sociedade civil é satisfatória no Conselho? Mais que isso, a participação e o espaço dados aos próprios jovens no conselho é satisfatória?
R. Acompanho pouco o Conjuve, visto que o foco das políticas que monitoro estão mais voltadas para a atuação do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), com foco na defesa e aperfeiçoamento do Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, o Conjuve é o conselho com maior participação da sociedade civil e com boa representação de estudantes. Essa participação tem rendido muita mobilização em torno das políticas para a juventude.
Mobilizadores COEP – A Câmara realiza anualmente o Câmara Mirim, sendo que a edição de 2009 foi realizada em 22 de outubro. Qual a importância de participar de atividades como essa e o que ela ensina? Estados e municípios têm iniciativas semelhantes?
R. Não tenho conhecimento de estados e municípios que realizem atividades dessa natureza, no entanto, deveria ser uma ação difundida nas Câmaras e Assembleias, pois é um momento de participação cidadã importante e mobilizador. As crianças se organizam em suas cidades e estados, elegem seus representantes e elaboram seus projetos, que depois podem vir a tramitar realmente e se transformarem em lei. Acredito ser esta uma forma de educação cidadã de forma lúdica e que desperta de fato o interesse das crianças.
Mobilizadores COEP – O que são e quais os objetivos dos programas ?Protagonismo Juvenil? e ?Criança e Adolescente: Prioridade no Parlamento?, promovidos pelo Inesc? Como eles são realizados?
R. Apesar de haver dois projetos, tentamos sempre trabalhar de forma articulada, unindo esforços e provocando os adolescentes a realizarem, eles mesmos, o controle democrático das políticas voltadas para a infância e juventude. O projeto Protagonismo Juvenil, voltado para escolas públicas do Distrito Federal, que acontece em parceria com a KNH [A Kindernothilfe ? KNH – é uma agência de desenvolvimento, fundada em 1959 na Alemanha, com enfoque na criança e no adolescente], recentemente foi batizado pelos próprios meninos e meninas como projeto ?Onda?. Este batismo ocorreu durante a oficina sobre atuação no Parlamento, realizada como intersecção entre as duas iniciativas. O projeto ?Criança e Adolescente: Prioridade no Parlamento? é fruto de uma parceria entre Conanda, Unicef [Fundo das Nações Unidas para a Infância], Frente Parlamentar da Criança e do Adolescente, Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Andi [Agência de Notícias dos Direitos da Infância]. O principal objetivo da iniciativa é realizar o controle democrático do parlamento, mobilizando por melhores políticas promotoras de direitos e tentando evitar retrocessos nesses direitos. Ao unir os dois projetos, estamos levando para esta esfera pública os principais atores, os protagonistas, que são os meninos e meninas.
Mobilizadores COEP – Qual a importância de envolver as escolas em iniciativas como essas? Na mesma linha, qual o papel da escola na formação de cidadãos participativos?
R. Penso que o principal objetivo de envolver escolas em iniciativas dessa natureza é contribuir para a ressignificação dessa instituição. Visto que, nos últimos séculos, essa foi a instituição que menos se permitiu mudar. Se olharmos uma sala de aula do século XIX, veremos que pouco mudou com relação à forma e com relação à disciplina. No entanto, percebe-se que a dificuldade em mudar ? devido, dentre outros fatores, à falta de priorização da educação pelos governos – gerou uma insatisfação geral, fazendo com que a infância e a juventude perdessem muito o interesse pela escola. Então, quando propomos novas práticas, estamos contribuindo com novos ventos, com novas inspirações e conspirações salutares.
Mobilizadores COEP – Como o COEP, uma rede nacional de mobilização social, pode contribuir para aumentar a participação cidadã dos jovens?
R. O COEP já realiza mobilização social há algum tempo, portanto, tem grande experiência e certamente conseguirá transportá-la para um público mais jovem. Essa iniciativa da Jornada pela Cidadania – Escola em Ação é muito peculiar e interessante.
Mobilizadores COEP ? A Jornada pela Cidadania ? Escola em Ação, que você comenta, vai ser lançada em breve. Trata-se de uma iniciativa de mobilização social que pretende estimular alunos de escolas a se envolverem em ações sociais que visem à defesa dos direitos básicos para todos e a melhoria do bem-estar coletivo. Que tipo de ações poderiam ser desenvolvidas durante a Jornada para estimular a participação dos jovens na definição de políticas públicas?
R. Não precisamos de ações mirabolantes para mobilizarmos as pessoas. Precisamos de ações simples que tenham a ver com as diferentes realidades das diferentes comunidades. Um bom princípio é decidir as ações de forma participativa. Por exemplo, convidar os jovens de cada escola a opinarem sobre ações protagonistas em seus locais, que resultem em melhoria da qualidade vida coletiva.
Entrevista concedida a: Maria Eduarda
Edição: Eliane Araujo
Realmente, para que os jovens se envolvam mais nos assuntos importantes da sociedade é preciso apenas a iniciativa de inclusão e participação. Ou seja, precisamos ir em busca de alternativas e não ficar esperando fórmulas mágicas, que não existe.
Realmente, para que os jovens se envolvam mais nos assuntos importantes da sociedade é preciso apenas a iniciativa de inclusão e participação. Ou seja, precisamos ir em busca de alternativas e não ficar esperando fórmulas mágicas, que não existe.