Lisangela da Costa Reis integra a Coordenação de Responsabilidade Social de Furnas. Ela representou a empresa na conferência Rethinking Development ? Local Pathways to Global Wellbeing, realizada de 20 a 24 de junho desse ano, na St. Francis Xavier University, em Antigonish, Nova Scotia, no Canadá. Nessa entrevista ao Mobilizadores COEP ela nos conta os principais temas discutidos durante o evento efala sobre o Butão, um pais emblemático nas discussões sobre a sustentabilidade. Mobilizadores COEP ? Nos conte um pouco como foi a conferência Rethinking Development. Que tipo de público esteve presente?
R. O objetivo principal da conferência, como o próprio nome sugere, foi estimular seus participantes a repensarem o modelo de desenvolvimento dominante, adotado pela maioria das economias do mundo, tanto as de países desenvolvidos quanto as dos países em desenvolvimento. A idéia central da conferência foi reunir representantes de diversos países para discutir propostas alternativas que busquem o desenvolvimento econômico, mas que considerem a necessidade de conservação do meio ambiente e a promoção social e cultural. O público, bastante diversificado, foi composto por representantes da indústria, da academia, do governo, consultores, várias ONGs, com diferentes focos de ação como: direitos humanos, direitos das crianças, promoção das mulheres, saúde, agricultura sustentável, desenvolvimento comunitário, formas alternativas de energia, meio ambiente, jornalistas e cineastas, enfim profissionais e estudantes que de alguma foram trabalham nos temas relacionados à sustentabilidade e ao desenvolvimento humano.
Mobilizadores COEP ? Quais as principais conclusões ou os pontos que achou mais relevantes?
R. A organização do evento estimulou também a participação de grupos de jovens de comunidades da Nova Scotia o que trouxe um certo ?frescor? à atmosfera da conferência. Esta atmosfera foi um dos aspectos positivos da conferência. Além das sessões plenárias, foram organizados ?workshops? sobre temas como: Globalização e Bem Estar, Desenvolvimento Rural Sustentável, Equilíbrio entre Trabalho e Vida, Desenvolvimento Econômico e Boa Governança ? do qual participamos apresentando as sinergias da parceria entre Furnas e COEP, Questões da Governança em Regiões com Desvantagens Econômicas, etc. O problema era decidir a que ?workshop? assistir. A todo o momento os conferencistas eram estimulados a participar também de atividades em grupos menores, nos quais podiam ser trocadas experiências e discutidos em maior detalhe aspectos apresentados nas plenárias. A presença do Butão merece registro especial, pois é um pais emblemático nas discussões sobre a sustentabilidade.
Mobilizadores COEP ? Que pontos você destacaria em relação ao tema governança que está sendo tão discutido hoje? O que tem sido fundamental, nesse sentido, na parceria entre Furnas e o COEP?
R. As organizações que têm os três pilares da sustentabilidade (econômico, ambiental e social) na estrutura da sua governança corporativa adotam práticas que resultem em bom desempenho nessas três dimensões e que garantam transparência e relacionamento ético e responsável com todos os seus ?stakeholders? (partes interessadas ou públicos de interesse). Em relação à parceria entre Furnas e COEP, o fato da nossa Política de Cidadania Empresarial e de Responsabilidade Social expressar formalmente o compromisso da Empresa não só em participar dessa rede de mobilização social, mas também de fortalecê-la é um elemento positivo de governança corporativa. Além disso, o fato da Secretaria Executiva do COEP ser ocupada pela Superintendente de Responsabilidade Social de Furnas traz benefícios à Empresa por ampliar a rede de colaboração com outros associados nos três níveis em que o COEP opera: estratégico, institucional e comunitário.
Mobilizadores COEP ? E com relação ao Butão, o que há de especial nesse país?
R. Os observadores internacionais têm estado atentos ao que vem ocorrendo neste pequeno país, localizado entre a Índia e a China, nas montanhas do Himalaia. Desde o início do século XX é governado por um regime monárquico e, a partir de 1952, os sucessivos reis iniciaram um processo de abertura gradual ao resto do mundo. Há 30 anos, o rei do Butão, à época, declarou que os índices de qualidade de vida usados universalmente não expressavam o valor mais importante para os seus súditos: a felicidade. Dessa forma, ao invés do GNP (Gross National Product) o que precisava ser avaliado é o GNH (Gross National Happiness). O país entrou na ONU em 1971 e se abriu ao turismo em 1974. A primeira conferência sobre o tema ?Repensando o Desenvolvimento? ocorreu no Butão em 2003. Na conferência em Antigonish a delegação do Butão, bem numerosa, com mais de 30 participantes, organizou um seminário específico sobre o seu país. Neste seminário foi evidenciada a postura de alguns dos representantes do Governo em ouvir críticas, sugestões e preocupações dos participantes sobre a definição de novas políticas de desenvolvimento para o país que começa a se abrir mais para o ocidente. A televisão só recentemente chegou ao Butão e o fato tem sido objeto de calorosos debates: de um lado os que defendem que o país não seja contaminado pelo ?lixo? da comunicação ocidental, que consiga preservar valores culturais e religiosos, do outro os que acreditam que não se pode negar a ninguém o direito à informação, a novas tecnologias aos avanços do mundo moderno, etc.. É interessante perceber que os butaneses têm plena consciência sobre a idealização daqueles que entram em primeiro contato com o país, uma espécie de Shangrilá, para usar suas próprias palavras, mas ao mesmo tempo percebem a necessidade de refletir a todo o momento sobre as implicações em desenvolver o país, o modelo a ser adotado, etc.
Mobilizadores COEP ? De tudo o que foi abordado, o que você acha que pode ser replicado diretamente em projetos de Furnas e de outras empresas no Brasil? Que experiências compartilhadas durante o evento foram mais significativas para essa replicação?
R. O mais inspirador para mim foi a abordagem de desenvolvimento comunitário discutida na conferência. É unanimidade entre os que têm experiência prática no tema, sejam eles consultores, representantes de ONGs, representantes da academia ou membros de órgãos públicos, que cada vez mais é preciso fazer com que as comunidades se tornem responsáveis pelo seu desenvolvimento. Nesse sentido, no desenho de qualquer iniciativa que objetive o desenvolvimento comunitário deve-se priorizar abordagens e metodologias que busquem não só o envolvimento e engajamento, mas o empoderamento das comunidades. O papel de qualquer entidade que queira verdadeiramente contribuir para projetos de desenvolvimento comunitário é ajudar na identificação dos recursos a serem mobilizados, fazer com que as comunidades identifiquem recursos próprios que possam ser transformados em oportunidades de desenvolvimento, os obstáculos, se há meios de superá-los. Outra questão importante em relação ao desenvolvimento comunitário é o tempo que o processo costuma demandar: para amadurecimento, mobilização, etc. Neste caso é preciso que qualquer instituição/entidade com interesse em trabalhar com projetos de desenvolvimento comunitário, planeje a médio e longo prazos mecanismos eficientes de financiamento e monitoramento e avaliação dos projetos.
Para que as comunidades cheguem ao nível ideal de responsabilidade para com o seu
desenvolvimento, é preciso enfrentar um duro caminho, uma jornada que perpassa pela discussão sobre políticas de educação, democracia e liberdade. Na prática os obstáculos parecem ser intrasponíveis, principalmente em cidades pequenas dominadas por feudos políticos, que mantêm a população local sob forte controle. O aparato de poder e dominação desses grupos vai além das teorias. As entidades que trabalham em cidades que apresentam essas características (e, são muitas por esse Brasil) precisam estar fortalecidas por uma rede de parceiros. Quanto ao Butão, acho que eles estão certíssimos, afinal de contas, não tem melhor indicador do que a FELICIDADE para medir a qualidade de vida dos habitantes de um país.