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Entrevistas

Meio Ambiente, Clima e Vulnerabilidade

Sociedade civil obteve conquistas no plano de adaptação às mudanças climáticas

3 de novembro de 2015

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) colocou em consulta pública a minuta do Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA), visando incentivar a participação da sociedade civil na aprovação do texto final do documento.

Gleyse Peiter, coordenadora do Grupo de Trabalho Mudança Climática, Pobreza e Desigualdade – criado em 2009 no âmbito do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), sob a coordenação do COEP -, relata as principais conquistas das instituições que integram o GT Mudança Climática, Pobreza e Desigualdade nas discussões e definição dos termos do PNA.

Ela afirma que as conquistas obtidas foram muito importantes e que agora é preciso trabalhar para que populações vulneráveis e povos de comunidades tradicionais possam acessar o site da consulta pública e fazer outras sugestões que garantam a eles maior proteção num cenário de mudanças no clima.

 

Rede Mobilizadores – O MMA colocou em consulta pública a minuta do Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima. Mas, o Grupo de Trabalho coordenado pelo COEP no Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC) vem debatendo esse tema desde 2009 e ofereceu subsídios ao governo. Como foi esse processo? 

R.: O GT Mudança Climática, Pobreza e Desigualdade, criado em 2009 no âmbito do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC) e coordenado pelo COEP, tinha como objetivo inicial trazer para o debate a questão da vulnerabilidade social, ou seja, o impacto das mudanças climáticas nas populações, principalmente as mais pobres.

Tivemos incidência na COP (a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas) de Copenhagen, em 2009, quando o governo brasileiro levou esse tema a debate com base num documento que produzimos e entregamos ao presidente Lula. Na COP de 2010, em Cancún, também levamos uma proposta para discussão sobre mudança climática e pobreza, e, a partir daí, essa questão vem ganhando relevância.

O COEP, como coordenador do GT, começou a se tornar o interlocutor para esse tema. Um dos resultados disso foi a criação do documento “Subsídios para a Elaboração do Plano Nacional de Adaptação aos Impactos Humanos das Mudanças Climáticas”, entregue à presidenta Dilma e à ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, em 2011.

 

Rede Mobilizadores – Qual era a expectativa dos integrantes do GT em relação ao documento “Subsídios para a Elaboração do Plano Nacional de Adaptação aos Impactos Humanos das Mudanças Climáticas”?

R.: É claro que a gente esperava que o documento tivesse uma repercussão, e ficamos muito felizes quando soubemos, em 2013, que o governo estava discutindo um Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA). Nós então incidimos para participar da construção desse plano representando o FBMC e, principalmente, o GT Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdade. Como resultado dessa mobilização, no final de 2013, começamos a participar das reuniões. Em todo o processo, lutamos bastante para viabilizar essa participação da sociedade civil nas discussões.

 

Rede Mobilizadores – Qual a sua avaliação sobre o processo de construção do PNA? 

R.: O PNA é dividido em 11 temas (agricultura; biodiversidade e ecossistemas; cidades; desastres naturais; indústria e mineração; infraestrutura; povos e comunidades vulneráveis; recursos hídricos; saúde; segurança alimentar e nutricional; zonas costeiras), e nós conseguimos que para cada um deles houvesse uma pessoa da sociedade civil indicada para participar dos debates. Essa participação foi formalizada numa carta do FBMC enviada ao governo.

Porém, como cada um dos temas era coordenado por um ministério diferente, não houve um consenso entre esses ministérios a respeito de convidar as pessoas indicadas. A função do MMA era de articular o trabalho de todos os ministérios envolvidos no processo de construção do PNA, mas ele não tinha o poder de obrigá-los a convidar as pessoas indicadas pelo FBMC.

 

Rede Mobilizadores – De que forma o GT conseguiu participar do processo de construção do PNA? 

R.: O processo de participação social não seu do jeito que a gente gostaria, mas, de qualquer forma, obtivemos algumas conquistas importantes. Para participar, nós conseguimos alguns apoios, principalmente da Oxfam, que financiou nossas idas a algumas reuniões e também a realização de um grande seminário que promovemos sobre o PNA, com participação dos movimentos sociais e de organizações integrantes do GT.

O processo de participação social não seu do jeito que a gente gostaria, mas, de qualquer forma, obtivemos algumas conquistas importantes 

 

Rede Mobilizadores – Quais foram suas principais reivindicações e os obstáculos que enfrentaram?

R.: Nossa primeira reivindicação foi de que a base do trabalho do governo fosse o documento “Subsídios para a Elaboração do Plano Nacional de Adaptação aos Impactos Humanos das Mudanças Climáticas”, que nós havíamos feito e entregue em 2011, uma vez que era um documento consolidado com o envolvimento de muitos movimentos e organizações, e fruto de muitas discussões e grupos de trabalho. Depois, a gente listou o que achávamos que deveria constar no plano e de que forma deveria se dar a participação da sociedade civil.

Nós começamos a introduzir no debate, com apoio do Consea, a questão da segurança alimentar, do direito humano à alimentação 

No início, não havia um grupo que falasse sobre segurança alimentar, tema que era contemplado dentro do grupo de agropecuária. A discussão que se tinha até então relacionava mudanças climáticas e agricultura. Nós começamos a introduzir no debate, com apoio do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional), a questão da segurança alimentar, do direito humano à alimentação e explicávamos como os impactos das mudanças climáticas poderiam afetar a garantia desse direito. Tampouco existia um grupo dedicado a povos e comunidades vulneráveis.

Nós conseguimos fazer com que o governo entendesse a importância da segurança alimentar e também que não era possível um plano de adaptação sem um capítulo que falasse sobre as populações vulneráveis brasileiras, que são as que vão mais sofrer.

Diz-se que esse é o único plano de um país a falar sobre populações vulneráveis e segurança alimentar e nutricional em separado. Mas isso foi uma conquista nossa.

Pensava-se adaptação em termos de produção, infraestrutura, e não se considerava as pessoas que já são impactadas e que tendem a ter sua situação agravada. Esse processo acabou se tornando um grande ganho, até para o governo. Diz-se que esse é o único plano de um país a falar sobre populações vulneráveis e segurança alimentar e nutricional em separado. Mas isso foi uma conquista nossa, do GT do FBMC.

 

Rede Mobilizadores – Qual sua avaliação sobre as conquistas obtidas pelo GT?

R.: O que conquistamos foi resultado de muita luta. Acho que conseguimos algumas coisas importantes, caras aos integrantes do GT. Embora a gente não tenha conseguido tudo que gostaríamos e o processo não tenha sido como desejávamos, percebemos que há muitas referências no PNA ao nosso documento, na introdução e em várias outras partes.

Hoje, podemos dizer que o PNA conta com alguma participação da sociedade civil, porque o FBMC é um espaço de encontro entre governo e sociedade. Mas quem estava como ponto focal do FBMC era eu, uma vez que o COEP coordena o GT, só que não sou representante de toda a sociedade civil.

Uma outra coisa que aconteceu foi um seminário organizado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), o qual resultou num documento onde eles apontam os impactos das mudanças climáticas em suas vidas. Uma das coisas que alegam é que, ao fazer um plano de adaptação, é preciso pensar no modelo de desenvolvimento. Mantido o atual modelo, num cenário de mudanças climáticas, são essas populações mais vulneráveis as que serão mais impactadas.

 

Rede Mobilizadores – Por que é importante falar em adaptação às mudanças climáticas, principalmente das populações vulneráveis? 

R.: Embora as mudanças climáticas tenham um componente técnico muito importante, a partir da COP de Cancún, o debate sobre impactos humanos e adaptação passou a ganhar força, principalmente nos países em desenvolvimento, dando um contorno social ao debate sobre mudanças climáticas.

no fundo, esse debate sobre adaptação é uma discussão sobre o modelo de desenvolvimento, porque o impacto é sempre sobre os mais pobres

Como dissemos antes, no fundo, esse debate sobre adaptação é uma discussão sobre o modelo de desenvolvimento, porque o impacto é sempre sobre os mais pobres. Tendo em vista que teremos mais pobres e mais gente atingida pelas mudanças climáticas, esses impactos vão ser maiores.

Embora mitigação e adaptação estejam juntas no debate, as discussões sobre mitigação são muito mais técnicas, ao passo que as discussões sobre adaptação são mais políticas e devem envolver a participação de todos os segmentos sociais, especialmente os que serão mais afetados.

 

Rede Mobilizadores – Qual sua avaliação sobre o processo de consulta pública? 

R.: O fato de existir uma consulta pública é um avanço. Mas, o ideal seria que tivesse havido uma discussão mais política do plano. A consulta pública é mais uma consulta de texto.

Agora, nós vamos nos articular para que populações vulneráveis, povos de comunidades tradicionais, povos indígenas acessem o site da consulta pública e façam sugestões. Mas há de se convir que as populações mais ameaçadas não têm acesso à internet, nem formação e informação suficientes para participar de uma consulta pública, que é um processo complexo. A consulta pública é basicamente algo para técnicos.

 

Rede Mobilizadores – Há temas importantes que não foram contemplados no PNA?

R.: O PNA não aborda, por exemplo, a questão do trabalho. As mudanças climáticas podem afetar o regime de trabalho das pessoas mais vulneráveis, e algumas delas podem perder suas fontes de sustento. Também não se fala nada de educação ambiental.

 

Entrevista concedida a: Eliane Araujo 

Editada por: Sílvia Sousa

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