O movimento Todos Pela Educação surgiu de uma inquietação de um grupo de pessoas das mais diferentes áreas e conta com a participação de integrantes da sociedade civil, de gestores públicos de educação, da iniciativa privada e de especialistas. Seu principal objetivo é ajudar na garantia do direito de todas as crianças e jovens a uma educação de qualidade.Baseado não só na mobilização da sociedade para ampliar a discussão sobre uma educação pública de qualidade, o movimento articula projetos que gerem resultados mais concretos, cobrando uma melhor gestão educacional do poder público e articulando parcerias que fortaleçam o cumprimento das leis educacionais.Nesta entrevista, Priscila Cruz, diretora executiva do Todos pela Educação fala sobre projetos, mobilização, conquistas do movimento desde sua criação e o papel de cada um para o fortalecimento da educação pública no país.
Mobilizadores Coep – O que é o Movimento Todos pela Educação? Qual seu objetivo?R.: O Movimento surgiu de uma inquietação de um grupo de pessoas das mais diferentes áreas ? empresários, gestores públicos, educadores, jornalistas – que viu que a educação no país havia avançado bastante no sentido de oferecer acesso das crianças à escola, mas que falhava na qualidade. O objetivo principal do Movimento é elevar a qualidade da educação pública brasileira fazendo também com que haja menos desigualdade entre o ensino oferecido nas diferentes regiões do país.Mobilizadores Coep – Que resultados o Movimento obteve desde sua criação?R.: O Todos pela Educação foi criado em 2005 e lançado em 2006. Nestes cinco anos de atuação tivemos muitas conquistas, sempre incentivando a mobilização em prol da educação de uma forma mais atuante. Desde que começamos, realizamos, em parceria com o Ibope, pesquisas de avaliação. Os resultados revelam que, em 2006, a educação pública de qualidade era somente a 7ª prioridade dos brasileiros. Hoje, esta prioridade está em segundo lugar. Acredito que a mobilização através de campanhas de massa e a atuação em cerca de 3.500 rádios em todo o país tenha gerado esta expectativa.Mas a gente também cobra resultados do poder público e atua em projetos que gerem resultados mais concretos, como na aprovação da Emenda Constitucional 59/2009, que prevê a obrigatoriedade do ensino de quatro a 17 anos. Um projeto muito interessante em que estamos trabalhando agora é a Lei de Responsabilidade Educacional*1, que garante a correta aplicação dos recursos públicos para a educação e responsabiliza gestores em caso de ineficiência ou má aplicação de verbas específicas. Atualmente, quem paga a conta desta ineficiência são os alunos, os mais penalizados.O site Para melhorar o aprendizadotraz uma reunião de estudos e pesquisas sobre práticas e políticas educacionais no qual o movimento propõe diretrizes para a melhora da qualidade da educação. A ampliação da jornada escolar, proposta recentemente pelo Ministro da Educação, Fernando Haddad, é fruto de um estudo encomendado pelo Movimento.
Mobilizadores Coep – O que motiva as empresas privadas a investir num movimento em prol da educação? Você acredita que o investimento privado pode ser ampliado? De que forma?R.: Acredito no investimento social privado, mas acho que ele não pode suprir o que é dever do poder público. Educação de qualidade é um dever prioritário do Estado e devemos cobrar isto. A iniciativa privada pode e deve contribuir muito, investindo no financiamento de pesquisas e na produção de conhecimento.
Mobilizadores Coep – O que acredita que deve ser feito para valorizar e melhorar a capacitação dos professores? O Movimento contempla ações voltadas para os docentes?R.: Além das cinco Metas que nós temos – toda criança e jovem de 4 a 17 anos na escola; toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos; todo aluno com aprendizado adequado à sua série; todo jovem com o Ensino Médio concluído até os 19 anos; e investimento em educação ampliado e bem gerido – lançamos recentemente as cinco Bandeiras norteadoras da atuação para os próximos anos. Elas tratam de assuntos fundamentais para que o Brasil consiga cumprir as Metas, de acesso à escola, alfabetização, aprendizagem, conclusão do ensino e financiamento. Dentre as principais bandeiras do Movimento está a valorização do professor, pois um sistema educacional só é bom quando a soma dos seus professores é enriquecedora. Propomos a valorização através de uma carreira mais atraente, com salários mais dignos, que atraia os melhores alunos do ensino médio; e uma formação inicial mais adequada.Mobilizadores Coep – O Movimento defende que o envolvimento da sociedade é condição fundamental para promover o salto de qualidade que a Educação Básica brasileira necessita. Como seria a participação ideal da sociedade? O que tem sido feito para melhorar essa participação?R.: A participação da sociedade para a melhora dos índices educacionais é fundamental, no entanto, a sociedade muitas vezes se mobiliza, mas não sabe cobrar efetivamente resultados. Neste sentido, existe um projeto do Movimento, de médio prazo, que pretende impulsionar os resultados e que envolve uma maior participação de promotores e defensores públicos, cobrando dos gestores a correta aplicação dos recursos e também o cumprimento das leis educacionais. O projeto é uma parceria com o Ministério da Justiça, Ministério da Educação, Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude (ABMP).Atualmente, existem 19 estados em greve no país, cobrando o pagamento do salário base nacional mínimo e o Supremo Tribunal Federal julgou como procedente e constitucional estas greves, dando aparato judicial a uma luta da sociedade.
Mobilizadores Coep – O que você considera o principal problema da educação básica atualmente? E, a seu ver, qual o investimento mais urgente para melhorá-la?R.: Não considero apenas um problema e sim diversas medidas que devem ser implantadas para a melhoria dos índices educacionais e a primeira delas é a valorização do professor, com carreira e salários mais atraentes. Em segundo lugar, a governança da educação deve melhorar, pois deve haver um Plano Nacional de Educação que contemple as necessidades do país, que tenha um objetivo claro, seja possível, responsável e ambicioso na medida certa. Precisa haver também um regime de colaboração entre os entes federados e cobrar a aprovação da Lei de Responsabilidade Educacional.Em terceiro lugar, devemos cobrar a definição das expectativas de aprendizagem, ou seja, a definição de um currículo base nacional, até mesmo para a sociedade poder entender e cobrar resultados das escolas. Em quarto, devemos melhorar as avaliações externas e o retorno destas avaliações para as escolas, e fazer com que a sociedade entenda o que representam estas avaliações.Em quinto e último lugar, deve-se ampliar a exposição dos alunos à aprendizagem. Um estudo recente do Banco Mundial verificou que das 800 horas de exposição dos alunos nas salas de aula apenas 60% são efetivamente voltadas para os estudos. O restante fica perdido com os atrasos, as greves e indisciplinas dos alunos nas salas.
Mobilizadores Coep – O Plano Nacional de Educação prevê, a partir de 2012, um aumento dos investimentos em educação de 7% do Produto Interno Bruto (PIB). Esse percentual é suficiente? Por quê?R.: O Plano Nacional de Educação ainda não está definido, mas acredito que o mais importante seja realmente traçar as metas que o país quer atingir nos próximos dez anos para, depois disso, avaliar o quanto será necessário em termos de investimentos. Não adianta a gente ficar discutindo se 7% ou 10% são suficientes, sendo que nem temos um plano definido ainda.
Mobilizadores Coep – Também foi discutido no recente Congresso Internacional de Educação, o aumento dos dias letivos, que passaria dos atuais 200 para 220 dias. O que acha desta proposta?R.: É indiscutível que se deve aumentar a exposição dos alunos em sala de aula, mas podemos começar aos poucos, ampliando, por exemplo, o número de horas por dia, passando de quatro para cinco. Esta não é uma medida radical e, a princípio, todas as escolas podem cumprir este acréscimo. Também defendemos a educação em tempo integral para escolas com baixo índice de aproveitamento educacional e escolas inseridas em comunidades com alta vulnerabilidade social e econômica.
Mobilizadores Coep – De que maneira o cidadão pode contribuir para melhorar a qualidade da educação pública? Como avalia a atual participação dos cidadãos?R.: A participação no Brasil ainda está longe de ser considerada ideal mas, em geral, as pessoas têm uma dificuldade muito grande em saber quais são seus direitos, em cobrar de forma efetiva resultados concretos. Devemos cobrar não só uma escola pública, com merenda adequada e uniforme, mas um ensino de qualidade que atenda às expectativas de todos.Mobilizadores Coep – Quais são as principais metas do Movimento? O que está programado?R.: Ainda não fechamos o planejamento para o próximo ano, mas o Movimento se baseia no cumprimento das cinco metas educacionais para traçar seus próximos passos.
—————-*1 ? Lei de Responsabilidade Educacional: Existem pelo menos seis projetos de lei com esse teor tramitando na Câmara dos Deputados. Além de tornar mais severas as punições para os gestores que descumprirem a legislação educacional, como perda de mandato e inelegibilidade, a Lei de Responsabilidade Educacional (LRE) também garantiria que as secretarias de educação municipais, estaduais e distrital se constituíssem como unidades orçamentárias, para que o gestor da pasta seja o gestor dos recursos.
—————-Entrevista para o Grupo Promoção da EducaçãoConcedida à: Flávia MachadoEditada por: Eliane Araujo.