Nesta entrevista, a cientista política e professora da Faculdade de Estudos Aplicados da Universidade de Brasília Maria das Graças Rua discorre sobre como oturismo pode contribuir para o desenvolvimento sustentável e para a inclusão social e avalia o futuro do turismo inclusivo no Brasil.Mobilizadores Coep – De que modo, o turismo pode contribuir para o desenvolvimento sustentável e para a inclusão social?
R: O Turismo pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento sustentável e para a inclusão social porque agrega um conjunto de dimensões favoráveis à solidariedade e à integração social. Em primeiro lugar, porque o Turismo opera pela ruptura do isolamento, provocando o contato entre diferentes culturas e ocasionando interações de múltiplos e variados atores. Com isso, propicia o conhecimento e a valorização de determinados ambientes e comunidades, estimulando o respeito e o interesse pela sua preservação. Em segundo lugar, o conhecimento oportunizado caracteriza-se como essencialmente prazeroso, de maneira que as interações se dão em um clima de reduzida tensão, favorecendo o entendimento entre os atores. Finalmente, o Turismo exibe forte potencial de criação e ampliação de oportunidades de trabalho e geração de renda. O amplo leque de atividades aberto pelo Turismo permite acolher trabalhadores com diferenciados padrões e patamares de desenvolvimento, o que contribui para a redução dos conflitos pelo ângulo da oferta. Essa tendência inclusiva é fortalecida pelo fato de que a cadeia produtiva do Turismo é intensiva em mão-de-obra.
Mobilizadores Coep – Sabemos que é inegável o potencial da atividade turística no Brasil, contudo, nem sempre alcançamos condições sustentáveis e inclusivas de desenvolvimento social e humano. Fale-nos um pouco sobre algumas estratégias inclusivas nas atividades turísticas.
R: É possível pensar um amplo leque de estratégias, massua seleção dependerá, evidentemente das características do agregado social e das hipóteses que o gestor de políticas públicas formular a respeito das relações de causa e efeito entre os diversos fatores que podem influenciar o turismo inclusivo e sustentável. Alguns exemplos são:
– os investimentos públicos em infra-estrutura devem beneficiar não somente o total da população (inclusividade), mas focalizar as áreas e populações degradadas pela ótica da equidade (ações afirmativas), sob o risco de não obter ou perder parte da eficiência desejada quanto à atratividade dos complexos turísticos e das áreas turísticas localizadas;
– as áreas de ocupação informal ou áreas degradadas surgidas ou ampliadas pela dinamização da atividade turística devem ser objeto de criterioso planejamento urbano e ambiental, com o desenvolvimento de projetos de urbanização e regularização do uso do solo e da habitação;
– tanto os projetos de urbanização como os empreendimentos turísticos de qualquer porte, devem ser diretamente incentivados a utilizar mão-de-obra, materiais e insumos diversos de extração local.
– como é muito provável que a disponibilidade local de insumos seja pouca ou nenhuma, deve-se adotar estratégias para estimulá-la; do mesmo modo, caso a mão-de-obra local seja despreparada, deve-se operar capacitando-a e preparando-a.
– a oferta de capacitação profissional para o preenchimento de postos de trabalho nas atividades do Turismo,ou subsidiárias a ele, deve ser focalizada nos grupos populacionais de menor nível de escolaridade. Isso inclui a adoção de facilidades para a inclusão digital;
– o foco das capacitações nos grupos de menor escolaridade não exclui a responsabilidade pela oferta, no local, da educação formal de qualidade. Acresça-se a isso a adoção de políticas de formação educacional especificamente voltada para a atividade turística nos próprios destinos turísticos A concepção de “pólos de formação” e as metodologias e mecanismos de Educação à Distância, quando combinadas, oferecem oportunidades privilegiadas para esse fim;
– na oferta de empregos diretos e indiretos, deve ser dada a preferência à população local e nativa, especialmente a de menor renda;- devem ser disseminadas boas práticas na constituição de empreendimentos econômicos de natureza comunitária (cooperativas, consórcios, associações), especialmente voltados para o fortalecimento de vocações e atividades pré-existentes tanto na área de bens como de serviços (suprimentos alimentares, souvenires, manifestações culturais e folclóricas, etc), com apoio à sua implantação nos destinos;
– devem ser eliminadas as barreiras ao crédito, que deve ser oferecido de maneira a que os locais tenham acesso, inclusive pela definição de linhas de crédito que contemplem o leque de possibilidades locais;
– devem ser desenhadas e implementadas medidas de estímulo e fortalecimento tanto do protagonismo social como da governança local, sem descuidar dos mecanismos de controle social e accountability;
Todas essas vias de ação possuem natureza estratégica e expressam o senso de responsabilidade pública para com a construção de uma ordem social inclusiva.
Mobilizadores Coep – Sabemos que existem outras formas de exclusão social, além da renda, como a discriminação a pessoas com deficiências, afrodescendentes, idosos, homossexuais. Gostaríamos de saber, quais são as políticas nacionais de turismo que permitem a inclusão desses segmentos?
R: Na realidade não existem ainda políticas nacionais de turismo orientadas para a inclusãode segmentos específicos. O que existe é um esforço, relativamente recente na sociedade brasileira, de enfrentamento da exclusão social. Esse esforço se expressa em medidas diversas nas várias áreas da atividade pública. Por sua vez, o Turismo vem recebendo, nos últimos tempos, uma orientação inclusiva de natureza transversal, e ainda não existem, por exemplo, políticas de ação afirmativa na área do Turismo.
Mobilizadores Coep – Em um dos seus artigos sobre turismo e políticas públicas, você diz que “(…) a exclusão envolve a privação ou negação da própria condição humana, de tal forma que, além dos direitos de cidadania, o que se nega aos excluídos é a possibilidade de ação, discurso, comunicação, que é condição para que os indivíduos realizem o seu potencial como sujeitos.” Fale um pouco sobre o conceito de exclusão explicitado anteriormente.
R: Freqüentemente confundida com a desigualdade, a exclusão deve ser corretamente entendida como a negação parcial ou total da incorporação de grupos sociais à comunidade política e social. Ou seja, formal ou informalmente, são negados a esses grupos os direitos de cidadania, como a igualdade perante a lei e as instituições públicas e o seu acesso às oportunidades sociais ? de estudo, de profissionalização, de trabalho, de cultura, de lazer, de expressão etc. ? é impedido ou obstaculizado. Vale assinalar que o conceito de exclusão não se restringe aos aspectos formais nem se limita à esfera econômica. O primeiro aspecto a chamar atenção reside no fato de que a exclusão pode manifestar-se ou não como uma norma legal. Exemplos encontram-se na negação do direito de voto aos analfabetos, como ocorria no Brasil até poucos anos atrás, ou como o conjunto de direitos que o Estado brasileiro ainda hoje nega aos homossexuais. Mais freqüentemente, porém, a exclusão não se fundamenta em base legal, manifestando-se informalmente. Ou seja, mesmo que formalmente os direitos sejam universais, nem todos conseguem exercê-los por que: (a) as instituições não funcionam de maneira inclusiva; por exemplo, exigem requisitos de acesso ou oferecem tratamento assimétrico a certos indivíduos ou grupos; (b) os próprios membros de alguns grupos sociais não têm acesso às condições básicas de existência essenciais para assegurar sua informação sobre seus direitos, a percepção do seu significado e até mesmo o interesse pelo seu exercício. Isso significa que existem atributos não selecionados e irracionalmente conferidos, que resultam em desvantagem para os indivíduos no exercício dos seus direitos: a situação socioeconômica de origem, a ausência das habilidades obtidas via escolarização, determinadas características étnicas, físicas ou intelectuais etc. Enfrentar a exclusão requer consciência de todos esses aspectos.
Mobilizadores Coep. Em suas palavras finais, como você avalia o futuro do turismo inclusivo no país?
R: No Brasil, o Turismo pode ser a grande oportunidade de fortalecimento do capital físico (infra-estrutura, investimentos financeiros, etc), e desenvolvimento do capital humano (via educação e capacitação profissional). Além disso, e talvez mais importante ainda: representa uma oportunidade sem igual para solucionar um dos mais difíceis desafios ao êxito das atividades econômicas: a formação de mercados. Nada disso poderá ser equacionado, porém, sem que as diretrizes quanto a valores – como por exemplo a equidade e o respeito ao meio ambiente – sejam previamente consensuadas e representem um efetivo compromisso tanto do governo como da sociedade.
O turismo realmente é um meo prazeroso de gerar renda e incluir todas as pessoas. A entrevista é extremamente enriquecedora e um material execelente para trabalharmos em nossas comunidades.
Sou professora da disciplina de Contabidade aplicada ao Turismo da Faculdade de Atividades Empresariais de Teresina – FAETE, gostei muito da Entrevista e das propostas de inclusão do Turismo com a sociedade. Excelente artigo. Levarei para Faculdade e apresentarei a Coordenação e demais alunos sobre o tema, o site e tudo mais.
A entrevista foca bastante o tema, enriquece omsaber de quem a lê, e como Agente de Desenvolvimento Comunitário levarei informações sobre o assunto que será abordado ainda nesta semana na comunidade Cacimbas/Anisio de Abreu-PI, localizada bem próximo ao Entorno das Serras da Capivara e Confusões.
Sou Diretor Presidente do Instituto Cultural e Ambiental Bichos do Matos. E estamos participando da construção do Plano Diretor do Municipio de Vigia – PA.
Já conhecia alguns trabalho de Graça Rua. Gostei Muito da entrevista. Penso que os município devem primar pelo turismo. O turismo é uma das principais atividades que está focada no ser humano total: busca a satisfação do ser. Além de desenvolver economicamente e sustentavelmente um município melhora o olhar sobre os locais, sejam urbanos ou rurais.