Em entrevista ao Grupo Reabilitação: Portadores de Necessidades Especiais, Marisa Maria Brito da Justa Neves, professora do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), fala sobre a inclusão do deficiente no ambiente escolar e sobre o papel de pais e professores nesse processo. Mobilizadores COEP – De uma forma geral, como você vê a situação dos deficientes no Brasil? R. – A situação dos deficientes no Brasil ainda é marcada por visões preconceituosas sobre suas possibilidades de desenvolvimento, aprendizagem e autonomia. Em relação à escola, professores e diretores ainda procuram justificar suas dificuldades no processo de inclusão desses alunos, culpabilizando a própria criança e/ou suas famílias. As crianças deficientes são vítimas, portanto, de preconceitos na escola sendo, de alguma forma, excluídas do ambiente escolar.Mobilizadores COEP – Em geral, como os pais percebem seus filhos com deficiências? R. – De modo geral os pais das crianças buscam uma explicação para a deficiência. Inicialmente, vivenciam com muita angústia o diagnóstico dado e, na maioria das vezes, buscam explicações no senso comum como uma forma de suprir esse vazio pela falta de explicação científica. Os pais, por conta dos preconceitos vigentes em nossa cultura a respeito da pessoa deficiente, muitas vezes não acreditam que seus filhos podem ser incluídos no ensino regular e consideram que o ensino especial ainda é a melhor opção para suas crianças.Mobilizadores COEP – Tendo em vista o sistema educacional brasileiro, na sua opinião é viável a inclusão de deficientes no ensino regular de ensino? Por quê? R. – O Brasil tem importantes leis e diretrizes que dizem respeito à questão das pessoas com necessidades especiais. É importante salientar que, em termos de legislação, nossa escola tem opção pela inclusão de todos os alunos nas classes comuns do ensino regular. A legislação estabelece que quando a criança necessitar de um ambiente diferenciado, esse deve ocorrer em caráter transitório. O Ensino Regular passa a ser responsável pelos alunos que apresentam qualquer tipo de deficiência, e a Educação Especial passa a ser compreendida como uma modalidade da educação escolar que deve assegurar recursos e serviços educacionais especiais, de forma a apoiar e complementar, garantindo, assim, o desenvolvimento dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais. Sabemos, no entanto, que a implantação de uma Escola verdadeiramente inclusiva está na confluência de fatores diversos que se estendem desde as adaptações estruturais do espaço físico, ao preparo efetivo dos professores, até mudanças de concepções de toda sociedade. Não podemos querer que a escola, sozinha, possa resolver a questão da inclusão. A Escola está inserida dentro da sociedade, e seu bom funcionamento está, também, na dependência, do funcionamento dessa sociedade. Recentemente, participei de uma banca de mestrado cuja dissertação versava sobre uma sala de aula do ensino regular onde estava incluído um grupo de quatro crianças surdas. Um fato interessante que pode ser extraído dos dados, embora não fosse o objeto da pesquisa, foi o de que a grande maioria das crianças dessa sala aprendeu a linguagem de sinais e se comunicava com os alunos surdos. Essa aprendizagem somente pode ser possibilitada pela convivência com as crianças surdas incluídas. Fica, então, a questão: quem se beneficia numa escola inclusiva? Na verdade todos se beneficiam da escola inclusiva, e esses dados demonstram avanços cognitivos e novas aprendizagens que foram desencadeadas, nas crianças ?normais? por estarem compartilhando o mesmo espaço escolar com crianças ?menos capazes?.Mobilizadores COEP – Como os professores reagem à inclusão de deficientes no ensino regular? De que forma vêem o processo educacional destes deficientes? R. – De modo geral, a maioria dos nossos professores ainda acredita que a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais nas salas do Ensino Regular somente é possível para aquelas crianças menos comprometidas. Segundo dados por nós coletados (Alecrim e Neves, 2006; no prelo), quanto mais o professor trabalha em espaços segregados, mais constroem suas concepções de que os alunos com necessidades educacionais especiais necessitam de atendimento muito especial e que, portanto, a inclusão é muito difícil. Na nossa amostra, os professores que trabalhavam em espaços mais inclusivos foram construindo concepções mais favoráveis à inclusão e, sobretudo, passaram a se relacionar com as crianças reais e não com representações homogeneizantes e preconceituosas que delas se constroem.Mobilizadores COEP – O que é possível fazer para que a sociedade reflita sobre a questão da inclusão no ambiente escolar?R. – Pensamos que existem questões importantes para a realidade da escola brasileira tais como a exclusão social, o preconceito, a visão liberal de homem, a inclusão escolar, que poderiam ser temas de debates e de reflexão no ambiente escolar. Uma possibilidade poderia ser a reflexão dessas questões, a partir da própria prática dos profissionais da escola, num movimento dialético de analisar e pensar sobre suas atuações e sobre as teorias que dão sustentação às suas concepções e às suas práticas.