Faltando menos de cinco anos para terminar o prazo dado pelas Nações Unidas para que sejam atingidos os ODM (Objetivos de Desenvolvimento do Milênio), o Brasil alcançou integralmente o primeiro objetivo, relacionado ao combate à pobreza e à fome, e o sexto, que prevê deter a propagação de doenças, como aids e malária. Contudo, ainda são necessários esforços para cumprir os demais, especialmente em saneamento, mortalidade materna e alguns indicadores de desigualdade entre os sexos. É o que mostra um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e coordenado pela Casa Civil. “O Brasil atingiu excelentes resultados e já aparece como um líder em muitas áreas. O país se destaca não apenas pelo compromisso em atingir os ODM, mas também pelo seu empenho em apoiar outros países nesse esforço”, destaca na introdução a coordenadora-residente interina da ONU no Brasil, Marie Pierre Poirier. “No entanto, os avanços são desiguais. O gênero, a raça, a etnia e o local de nascimento de uma criança brasileira ainda determinam, em grande parte, suas oportunidades futuras. Essas desigualdades têm repercussões diretas também na saúde da mulher e na razão da mortalidade materna”, ressalta. “Não há dúvidas, então, de que o maior desafio do país nos próximos anos será transformar os ODM em uma realidade efetiva para todos e todas.” Um dos destaques da quarta edição do Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio é que, na luta contra a pobreza, o país cumpriu antecipadamente não só a meta traçada pela ONU (chegar a 2015 com metade da proporção de pessoas muito pobres que havia em 1990), mas também a meta mais rigorosa estipulada pelo governo federal (redução de 75%). Em 1990, 25,6% dos brasileiros tinham renda domiciliar per capita inferiores à linha de pobreza estabelecida pelo Banco Mundial (US$ 1,25 ao dia, corrigido pela paridade do poder de compra, método que desconta a variação de custo de vida entre países). Em 2008, esse percentual caiu para 4,8%. “A meta internacional para 2015 foi superada em 2002, e a meta nacional foi superada em 2008. Se o ritmo da redução se mantiver nos próximos anos, a pobreza extrema será erradicada do Brasil por volta de 2013-2014”, afirma o relatório. O Brasil também cumpriu a meta da ONU de diminuir em 50% a parcela da população que passa fome. Em 1996, havia 4,2% de crianças brasileiras de 0 a 4 anos com peso abaixo do esperado para a idade (indicador usado para mensurar desnutrição infantil). Dez anos depois, o percentual tinha caído a menos da metade: 1,8%. Agora, o desafio é alcançar o objetivo que o país se autoimpôs: erradicar o problema até 2015. Saúde Houve avanços na meta que determina que a mortalidade de crianças menores de 5 anos de idade deve cair em dois terços (66,7%), entre 1990 e 2015. Em 2008, a taxa de mortalidade na infância foi de 22,8 óbitos por mil nascidos vivos, e, para alcançar o ODM, o Brasil precisaria reduzi-la para 17,9. “Estima-se que, se persistir a tendência de redução atual, o Brasil atingirá a meta antes do prazo, em 2013”, indica o relatório. A queda tem sido expressiva em todas as regiões ? sobretudo no Nordeste, em que o problema ainda é mais grave. De 1990 a 2008, o recuo foi de 62% nessa região, seguida pelo Sul (57%), Sudeste (55%) e Norte/Centro-Oeste (53%). O país também deve cumprir, antes do prazo, o compromisso de diminuir em dois terços a mortalidade infantil (que se refere a crianças de até 1 ano). De 1990 a 2008, foi registrada redução de 60% nos óbitos infantis, que chegaram a 19,0 por mil nascidos vivos no ano retrasado. O relatório estima que a meta de 15,7 deve ser alcançada no ano que vem. Na área da saúde, outra conquista importante foi a estabilização da epidemia de aids, uma das metas do sexto Objetivo do Milênio. Segundo dados do relatório, entre 2002 a 2009 foram identificados, em média, 35 mil casos de aids por ano. “As taxas de incidência foram crescentes até 2000 e estão estabilizadas desde então, embora em patamares elevados, comparados a padrões internacionais”. Algumas medidas adotadas conseguiram ampliar a sobrevida dos portadores do vírus HIV, como a disponibilização, na rede pública, da terapia antirretroviral. O Brasil também conseguiu frear a propagação da tuberculose (o número de casos por 100 mil habitantes passou de 35,5, em 2000, para 31,9, em 2008) e da malária (a incidência caiu de pouco mais de 30 casos por mil habitantes na Amazônia brasileira, em 1990, para 22,8 em 2006 e 12,9 em 2008). Mais dificuldade tem sido encontrada no alcance de uma meta que o país se autoimpôs: a erradicação da hanseníase em 2010. Em 2008, foram registrados 39.047 novos casos (20,6 por 100 mil habitantes). Educação e igualdade de gênero No segundo Objetivo do Milênio (universalizar a educação básica), o Brasil avançou bastante até meados desta década, mas posteriormente o ritmo de melhoria diminuiu. A proporção de crianças de 7 a 14 anos matriculadas no ensino fundamental passou de 81,4%, em 1992, para 94,4%, em 2005. De lá até 2008, o número subiu para 94,9%. De qualquer modo, o relatório observa que “a tendência de universalização do acesso à educação obrigatória tem avançado no Brasil”. O principal desafio agora, avalia o texto, é garantir que todos que entrem na primeira série concluam o ensino fundamental. A parcela de pessoas de 18 anos que concluíram esse nível passou de 34%, em 1992, para 75,2%, em 2008. “Apesar de ainda estar aquém do desejável, a taxa de conclusão do ensino fundamental teve grande aumento”, afirma o estudo. O desafio educacional em outra área ? a de igualdade entre os sexos ? também é diferente no Brasil. O cerne do terceiro Objetivo do Milênio é que seja semelhante a proporção de homens e mulheres matriculados nos três níveis de ensino (fundamental, médio e superior). A ideia da ONU, ao propor esse tópico, era de promover a igualdade de gênero e a autonomia das mulheres. Meio ambiente O país deu passos importantes nas áreas ligadas ao sétimo ODM (garantir a sustentabilidade ambiental), apesar de dados sobre desmatamento na Amazônia indicarem que houve um pequeno aumento em relação a 2007. O desflorestamento contribui também para a alta das emissões de dióxido de carbono na atmosfera, problema ampliado pelo crescimento da população e da economia brasileira. Em relação à meta de reduzir pela metade, até 2015, a proporção da população sem acesso permanente e sustentável à água potável e esgotamento sanitário, uma parte dela foi cumprida, conforme indica o relatório. “O porcentual da população urbana com abastecimento de água com canalização interna proveniente de rede geral passou de 82,3%, em 1992, para 91,6%, em 2008”, afirma o estudo. Já o saneamento básico ainda deixa a desejar nas áreas rurais. Nas grandes cidades a cobertura da coleta de esgotamento sanitário por rede geral ou fossa séptica aumentou mais de 14% desde 1992 e já alcançava 80,5% da população em 2008. Enquanto isso, no campo, a cobertura por rede geral de esgotos ou fossa séptica ligada ou não à rede geral subiu de 10,3%, em 1992, para 23,1%, em 2008. Por fim, para cumprir o ODM 8, que estabelece parceria mundial para o desenvolvimento, o país priorizou ações que promovam a ampliação de acesso a medicamentos, capacitação técnica, fomento à pesquisa e à inovação tecnológica e assistência humanitária.