A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) publicou, em dezembro de 2006, uma norma sobre acessibilidade inédita nas Américas e na África. É a ABNT NBR 15450:2006, cujo objetivo é garantir a inclusão no sistema de transporte aquaviário, por meio de ambientes acessíveis desde o entorno do terminal até o interior da embarcação. A norma foi elaborada pelo Grupo de Trabalho de Acessibilidade de Passageiros no Sistema de Transporte Aquaviário, que faz parte da Comissão de Estudos de Transporte com Acessibilidade do ABNT/CB-40 ? Comitê Brasileiro de Acessibilidade.
?Ainda não havia norma de acessibilidade para este setor de transporte, mas nossa programação visou, principalmente, atender e implementar o Decreto Federal 5.296/2004, que regulamenta as leis número 10.098/2000 e 10.048/2000, estabelecendo normas gerais e critérios básicos para promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida?, explica a coordenadora do GT Angela Costa Werneck de Carvalho, arquiteta especializada em Transportes e consultora em Acessibilidade.
A norma ABNT NBR 15450 ? Acessibilidade de passageiros no sistema de transporte aquaviário tem foco em todos os passageiros, ainda que a embarcação também transporte carga. ?Integramos o universo da população: grávidas, crianças, pessoas muito baixas ou altas, indivíduos na plenitude física, com deficiência ou com mobilidade reduzida temporária ou permanente (membros engessados ou utilizando órteses, próteses, carregando carrinhos etc.), obesos e idosos?, observa Angela Werneck.
De acordo com a arquiteta, para garantir plena acessibilidade já a partir do terminal de embarque, o Grupo de Trabalho identificou diretrizes para a reorganização deste sistema de transporte, solucionando com o desenho universal os pontos-chave, aqueles considerados vitais para a garantia do acesso e do deslocamento contínuos de todas as pessoas. ?Por isso, a norma abrange o entorno, acesso ou entrada, o terminal com a distribuição de passageiros, local de compra de bilhetes, os equipamentos de controle de acesso, salão de passageiros (espera), rampas, escadas fixas, cais ou píer, dispositivos de acesso, plataforma flutuante, fronteira (o local de embarque e desembarque para a embarcação) e a embarcação?, diz Angela Werneck.
Segundo a arquiteta, há conhecimento de trabalho similar na Europa (Espanha), na Ásia (Japão) e na Oceania (Austrália). Entretanto, o GT não obteve maiores informações sobre essas experiências quando iniciou suas atividades, em dezembro de 2005.A ABNT NBR 15450:2006 tem como alvo terminais e embarcações novas. Mas a coordenadora do GT informa que o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) desenvolverá programas para adaptação de terminais e embarcações existentes, por meio de regulamentos de avaliação da conformidade, tornando acessível à população todo o transporte coletivo aquaviário.
?Para que haja qualidade e avanço técnico compatíveis com a realidade brasileira, o Inmetro, através da sua Rede Brasileira de Metrologia Legal e Qualidade (RBMLQ), realizou um exaustivo levantamento, pioneiro em todo o território nacional, de forma a retratar a situação dos terminais e das embarcações brasileiras?, comenta a arquiteta.
Atualmente, o que se vê nos grandes centros urbanos brasileiros, de acordo com Angela Werneck, é a população sofrendo com congestionamentos, acidentes, longas viagens diárias, ausência de integração e predomínio do modo rodoviário, em detrimento e subutilização do metroviário, ferroviário e aquaviário.
As pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, integrantes do universo da população, sentem de forma amplificada esses problemas. ?Encontram grandes dificuldades em seus deslocamentos, o que impede grande parte desse segmento de acessar os direitos fundamentais de qualquer cidadão: educação, saúde, trabalho e lazer?.
Subutilização do sistema aquaviário
Em geral erroneamente projetadas, as embarcações em uso não prevêem o acesso seguro, como alerta a coordenadora do GT. Pranchas estreitas são utilizadas para vencer a fronteira e, na sua maioria, não há pessoal habilitado para auxiliar as pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. ?Este problema se agrava na Região Amazônica pela imensa variação do nível dos rios (reduzidos em até 18 metros no período da seca), justamente onde o modo aquaviário é a base de transporte da população local?.
?O levantamento realizado e a norma em si – argumenta Ângela Werneck – demonstram ainda a subutilização do sistema aquaviário para um país com as características continental e litorânea como o nosso?. Se devidamente revitalizado, poderá incrementar tanto o transporte comum de passageiros como o turístico.
O Grupo de Trabalho que desenvolveu a norma é formado por especialistas em acessibilidade e da área de engenharia naval, agentes reguladores, professores, consultores, armadores, sindicalistas dos aquaviários, organismos governamentais e entidades representantes das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida.
Sobre a ABNT
Fundada em 1940, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) é o órgão responsável pela normalização técnica no país, fornecendo a base necessária ao desenvolvimento tecnológico brasileiro. É uma entidade privada sem fins lucrativos, agente privado de políticas públicas, reconhecida pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro) como Único Foro Nacional de Normalização.
É membro fundador da International Organization for Standardization (ISO), da Comissão Pan-Americana de Normas Técnicas (COPANT), da Associação Mercosul de Normalização (AMN) e da International Electrotechnical Commission (IEC) desde a sua fundação, sendo única e exclusiva representante destas organizações no Brasil.