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“Como em 64, Brasil está em uma encruzilhada histórica”, diz presidente do Ipea


22 de setembro de 2015

Desde o início de 2015, o professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Jessé Souza é o responsável pelo comando do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Subordinado ao Ministérios dos Assuntos Estratégicos, o instituto teve participação essencial nos últimos anos para entender a ascenção dos milhões de brasileiros ao mercado de consumo.

Em vista do novo cenário econômico, político e social brasileiro, Souza aponta que o país corre o risco de perder as conquistas sociais dos últimos anos e vê a realidade de 2015 muito parecida com a do pré-golpe em 1964. “Antes do golpe o país tinha que escolher dois caminhos: se ele seria uma sociedade de massas mais inclusiva, ou uma sociedade pra 20% – e a escolha feita com o golpe foi a escolha por essa minoria. A sociedade deve perceber o que ela tem a perder e o preço que isso envolve”, explicou.

Jessé participou, no dia 16 de setembro, de uma palestra na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) na qual criticou a linha de pensamento de nomes da sociologia brasileira como Gilberto Freyre, Sergio Buarque de Holanda e Fernando Henrique Cardoso.

“A concepção dominante do Brasil moderno é pobre, superficial e conservadora. Isso começa com uma releitura de Sergio Buarque do mito nacional de Gilbeto Freyre, isso é extremamente problemático porque vem do fato de pensar que o Brasil vem de Portugal. Hoje, essas obras servem a um liberalismo extremamente mesquinho que virou prática institucional e nos torna inferiores, por definição, aos europeus, já que o brasileiro passou a se ver como ’emoção’ e não ‘razão’”, criticou Souza que lançará o livro “A tolice da inteligência brasileira”, que visa analisar esses pensadores.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Jessé critica a corrente que acredita que há uma nova classe média no Brasil. Para ele, os milhões que ascenderam à classe C devem ser considerados uma “classe trabalhadora precarizada”. “Ela ascende ao mercado competitivo de trabalho, mas sob condições precárias. De classe média ela não tem nada”, disse.

A seguir destacamos alguns trechos da entrevista:

Nova classe trabalhadora X nova classe média

“Isso não é só uma questão de terminologia, mas tem a ver com a narrativa de um processo e é extremamente importante porque implica a construção de um horizonte e a percepção do seu lugar na sociedade. Essa foi a transformação mais importante do Brasil nos últimos 50 anos e teve muito a ver com os programas sociais dos governos petistas e políticas como o aumento do salário mínimo, o Bolsa Família, o crédito mais fácil e uma série de outras. O que houve efetivamente e o que nós vemos na nossa pesquisa foi uma ascenção do que poderíamos chamar de subproletariado, e que nós chamamos provocativamente de ralé. Essa classe ascendente não pode ser considerada classe média, porque a classe média é uma classe de privilégios desde o nascimento, porque ela “compra” o tempo livre dos filhos para o estudo e os habilita para que eles possam acumular um capital cultural extremamente sofisticado, sejam nas áreas técnicas como economia, direito e engenharia; como também nas literárias como o jornalismo e a publicidade. Todas as funções importantes do mercado exigem conhecimento, tanto quanto exigem dinheiro, só o capital econômico não movimenta nada, tem que ter o conhecimento nisso tudo. Por conta disso essa nova classe é muito mais uma classe trabalhadora precarizada, que ascende ao mercado competitivo de trabalho, mas sob condições precárias. De classe média ela não tem nada”. 

Demonização do Estado e divinização do mercado 

“O que precisa ser posto como claro desde o começo é que a transparência dos negócios públicos é uma virtude republicana fundamental e é extremamente importante que haja a investigação sobre isso. Dito isso, a gente tem que ver a que a corrupção é muitas vezes usada como manipulação política de forma seletiva e quase sempre transforma interesses extremamente privados em aparentemente públicos. A corrupção se presta a isso porque ela dá e implica uma possibilidade de angariar apoio contra algo que é visto como um bem comum e que interessa a todos. Todos têm interesse no controle do Estado. Mas o tema da corrupção é extremamente mal posto. No fundo isso tem uma ideologia liberal que vê tudo o que acontece no mercado como virtude e o que acontece no Estado como corrupção e ineficiência. Isso também tem a ver com a luta entre as classes e como ela é sempre inviabilizada, tem existir uma semântica onde ela se expressa de um modo distorcido. Tanto no Brasil como em vários países isso adquire a forma de demonização do Estado e a divinização do mercado. Por que isso acontece? Porque para as classes populares que não só não compreendem os mecanismos de mercado, como também não têm força pra se opor a eles. O Estado é o única entidade com força suficiente pra eventualmente se contrapor a esses mecanismos; enfraquecer o Estado é enfraquecer o único meio de proteção das classes populares. Pra 70% da população brasileira o Estado é a única ajuda, essa luta de classes é mantida e é feita sobre essa forma, ou seja, esse linguajar da corrupção simplifica toda a complexa situação da política e da economia da sociedade em um vetor só e usa esse discurso manipulando as suas próprias vítimas”.

Encruzilhada histórica 

O Brasil hoje está em uma encruzilhada histórica extremamente importante, assim como ele esteve em 1964. Antes do golpe. o país tinha que escolher dois caminhos: se ele seria uma sociedade de massas mais inclusiva, ou uma sociedade pra 20% e a escolha feita com o golpe foi a escolha por essa minoria. A sociedade deve perceber o que ela tem a perder e o preço que isso envolve. Os governos petistas conseguiram de algum modo estimular uma ascenção social histórica no Brasil, coisa que não havia acontecido antes. Obviamente teve um contexto favorável a isso, mas essas condições já haviam acontecido e nada foi feito porque não havia vontade política. A nossa encruzilhada histórica é: ou a gente volta pra uma sociedade de 20%, e o risco disso acontecer existe, ou aprofunda essa inclusão. Falta uma narrativa pra isso que mostre que esses avanços são graduais e gerar uma maior conscientização disso. Eu acho que ainda espaço há pra que se crie essa alternativa. Há uma luta ainda em aberto e que não está decidida, e há modos de produção de uma narrativa que ofereça novas alternativas de convencimento”.

 

Com informações: Brasil de Fato

 

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