Comida é Patrimônio é o tema da primeira campanha digital, lançada pelo Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN). Os objetivos da campanha são estimular a população a repensar a relação com os alimentos e lutar por um sistema alimentar mais justo, equitativo, saudável, sustentável e solidário.
O Fórum pretende estimular a população a valorizar a identidade alimentar, presente nas ricas regionalidades culinárias do país, bem como nas dimensões sociais, culturais, econômicas e políticas. Por meio do site oficial e da página no Facebook, o Fórum quer mobilizar a sociedade em prol da preservação da biodiversidade e cultura alimentar.
A campanha tem intenção de provocar essa reflexão a partir de quatro temas:
- Comida é bem material e imaterial
- Comida é identidade, memória e afeto
- Comida é dialogo de saberes
- Modos de viver, produzir e comer
Nos próximos meses, o Fórum irá compartilhar em sua página no Facebook uma série de 24 cartazetes chamados de “pensamento-pimenta”. O conteúdo foi selecionado a partir de pensamentos de mulheres e homens de diversas áreas de conhecimento, entre as quais, antropologia, sociologia, nutrição, gastronomia, agricultura, artes e manifestações de organizações sociais sobre a cultura alimentar. Além dos cartazetes digitais, serão apresentadas matérias e entrevistas a fim de proporcionar amplo debate sobre os quatro temas propostos.
De acordo com a integrante da Coordenação do FBSSAN, Vanessa Schottz, a questão a respeito dos “alimentos que estamos ou não comendo” levou os membros do Fórum a perceber o quanto a defesa da comida como um patrimônio é um caminho para aproximar a dimensão cultural da segurança alimentar e nutricional. Isto porque a forma como o sistema alimentar está estruturado hoje coloca em alto risco esse patrimônio. Entre as razões enumeradas por ela está a perda da agrobiodiversidade, da memória alimentar e da diversidade do alimento.
Comida é mais que nutriente
Em todo o Brasil, existem famílias agricultoras que estão envolvidas com a conservação da nossa biodiversidade e a valorização dos alimentos regionais. A urgência em defender o patrimônio alimentar brasileiro encontra apoio nas organizações e movimentos sociais que lutam para preservação desses bens, além das políticas públicas de salvaguarda desde a década de 90. “Precisamos conhecer e valorizar essas experiências”, sinaliza Vanessa.
A Associação Slow Food, por exemplo, possui um catálogo internacional chamado Arca do Gosto, que documenta e divulga alimentos que estão em risco de extinção. No país, já foram catalogados 28 alimentos tradicionais que devem ser preservados. Entre eles, estão o arroz vermelho do Vale do Piancó, na Paraíba; a cagaita (fruta do Bioma Cerrado) do Caxambu, em Pirenópolis (GO); a bijajica (bolo cozido no vapor com massa de mandioca, amendoim e açúcar) do litoral de Santa Catarina; e o néctar das abelhas nativas dos índios Sateré-Mawé, no Amazonas. Com a preservação, valorização e divulgação, é possível assegurar modos de viver, culturas, tradições, economias locais, saberes, e a biodiversidade nacional.
O modo de comer atual é marcado pela padronização do gosto, com grande oferta de alimentos artificiais (feitos à base de químicos, corantes e acidulantes), envenenados por agrotóxicos e transgênicos, prontos para o consumo. Hoje, os hábitos são construídos nas agências de publicidade e marketing das indústrias alimentícias. A assessora da ONG Fase e presidente do Consea Nacional, Maria Emília Pacheco, reforça que os alimentos artesanais são prejudicados por legislações sanitárias que usam parâmetros para uma produção industrial.
A comida vai além do nutriente e aspectos sanitários que conferem segurança para o consumidor. É fundamental reconhecer a necessidade de adotar uma concepção de qualidade baseada no respeito às práticas alimentares regionais. As atuais normas sanitárias padronizam a produção, descaracterizando os conhecimentos tradicionais, símbolos da cultura e história de um povo. “Precisamos rever essas normas, que são verdadeiros instrumentos autoritários”, afirma Maria Emília. O Fórum se une a outros parceiros para reivindicar a revisão dessas normas, conforme a “Carta Aberta à Agência de Nacional de Vigilência Sanitária (Anvisa) em favor da produção artesanal, familiar e comunitária e da alimentação saudável”.
Com a campanha, espera-se ampliar os olhares e o diálogo em torno do alimento e suas representações. Assim, é possível garantir maior autonomia às famílias, no cuidado da saúde e na redução da dependência da indústria alimentícia e farmacêutica. “Lutar por normas sanitárias mais inclusivas e adequadas à produção de base familiar e artesanal, contra o uso de sementes transgênicas e contra a concentração do mercado é defender um de nossos maiores patrimônios. Precisamos nos mobilizar”, alerta Vanessa.
Para participar da campanha, acesse www.facebook.com.br/fbssan