Uma decisão polêmica vem agitando o debate sobre a inclusão de crianças com deficiência em instituições de ensino particular. Cristiane Rancon, mãe de Lívia, uma menina de sete anos que possui Síndrome de Down, queria que a filha estudasse na mesma escola que seu filho mais velho. No entanto, teve a matrícula da menina negada pela Nova Escola, em São Paulo, com a justificativa de que o estabelecimento não estaria preparado para atender uma criança com deficiência.
A mãe decidiu lutar na justiça, mas, em outubro, recebeu, indignada, a decisão do Juiz Gustavo Santini Teodoro, da 23º Vara Cível de São Paulo, que deu ganho de causa à escola. Ele parte do entendimento de que garantir a educação é um dever do Estado. A decisão fere a Constituição Brasileira, que assegura, no artigo 206, a ?igualdade de condições para acesso e permanência na escola?. Além disso, o juiz se posicionou contrário a todo um movimento que vem crescendo no Brasil há pelo menos uma década, que é o de incluir crianças com deficiência em escolas regulares. A decisão judicial chegou a ser criticada pela Procuradoria Federal.
De acordo com a psicóloga Fabíola Patrocínio, do Instituto Ester Assumpção, a convivência com crianças que não possuem deficiência enriquece o aprendizado e principalmente ensina uma lição de solidariedade importante: conviver com a diferença. ?Estudar em escola regular ajuda no desenvolvimento social e melhora o aprendizado?, explica a psicóloga.
Cristiane Rancon conseguiu matricular a filha em outro estabelecimento de ensino. No entanto, decidiu recorrer à instância superior. O caso chegou à mídia e está tomando repercussão nacional. A expectativa é que possa despertar uma reflexão mais crítica sobre os ?avanços? da inclusão no país. Diante da polêmica, o deputado federal Leonardo Matos (Partido Verde ? MG), que atua na defesa das pessoas com deficiência manifestou-se publicamente contra a decisão do Juiz Gustavo Teodoro Santini. Em artigo publicado na imprensa mineira, o deputado argumenta que a decisão abre um precedente às escolas particulares que podem começar a rejeitar a matrícula de crianças com necessidades especiais. Leonardo Mattos reflete ainda sobre os avanços e impasses da educação inclusiva no Brasil. ?Muitos pais ainda não se sentem seguros na hora de colocar os filhos em escolas regulares. A discriminação continua sendo a principal barreira. Por outro lado, a escola especial supre necessidades reais que algumas crianças possuem?, observa.
Se as escolas particulares se mostram fechadas à inclusão, as escolas públicas estão se adequando aos parâmetros da educação inclusiva. Em Belo Horizonte e Contagem já existem projetos específicos que têm como objetivo incluir a criança com deficiência na Rede Municipal de Ensino. De acordo com o Núcleo de Inclusão da Prefeitura de Belo Horizonte, o projeto existe há uma década e atualmente atende a 1.432 crianças. A previsão é de que, em 2007, todas as escolas municipais estejam preparadas para receber crianças com deficiência. A iniciativa tenta minimizar a segregação, já que historicamente as crianças com deficiência freqüentaram escolas especiais. Em Contagem (MG), um programa da prefeitura também visa à inclusão de 859 alunos com deficiência. Para que esses alunos permaneçam na escola, a Diretoria de Inclusão Social do município elaborou um projeto de formação para os educadores, que oferece cursos de capacitação em educação inclusiva. Além disso, as escolas que não possuem acessibilidade estão sendo adaptadas.
A Constituição Brasileira é soberana em suas determinações: a educação de qualidade é um direito de toda criança, independentemente da raça, gênero, classe social, condição física ou mental. Impedir que uma criança estude é crime. É função da Justiça brasileira punir essa infração e não criar situações que possam respaldá-la, como foi feito no caso do juiz paulista.
Fonte: Boletim Inclusão em Pauta, com base em matéria publicada.