Professores que possuem alunos cegos ou com algum tipo de deficiência visual poderão receber um grande apoio a partir de um trabalho inédito sobre ensino e aprendizagem da Física feito no campus da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Bauru. A proposta contém orientações sobre a didática em classes mistas ? que reúnem estudantes com visão normal e com algum tipo de limitação visual ? e usa experimentos que ajudam a compreensão de fenômenos por meio do tato. Fruto do pós-doutorado realizado por Eder Pires de Camargo na Faculdade de Ciências (FC), o estudo foi publicado no final de 2006 na revista eletrônica ?Educação? em Ciências e tem sido apresentado em vários eventos.
“A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1998 estimulou a inclusão de pessoas com deficiência, sem, no entanto, preparar os professores para tamanho desafio”, observa Camargo, que leciona na Faculdade de Engenharia (FE), campus de Ilha Solteira, e é o único docente cego em atividade da UNESP.
Em 2005, Camargo acompanhou 22 licenciandos na preparação de um minicurso de 80 horas para uma turma mista do Colégio Técnico Industrial da UNESP de Bauru, formada por 35 alunos com visão normal e dois cegos. Todas as aulas foram filmadas. “Primeiro, planejamos os módulos e a preparação de material de ensino e, depois, fizemos uma reflexão sobre as dificuldades e possíveis soluções na relação do ensino de Física e a deficiência visual”, conta.
Tato e audição
Camargo elaborou materiais que simulam fenômenos nas áreas de óptica, eletromagnetismo, mecânica, termologia e física moderna. O trabalho foi baseado na sua experiência pessoal e no acompanhamento das dificuldades dos licenciandos durante as aulas. “Procuramos elaborar o material explorando os outros sentidos do aluno, como tato e audição”, esclarece.
Um dos maiores desafios da equipe foi ensinar óptica. No ensino tradicional, o professor traça, por exemplo, retas na lousa para representar a trajetória dos raios de luz. Já no modelo de Camargo, a dispersão e refração da luz são simuladas por meio de um barbante que o aluno segura nas mãos. Em eletromagnetismo, para explicar o processo de condução de eletricidade, é usada uma tábua inclinada com pregos e esferas. A inclinação indica a potência elétrica (quanto maior a inclinação, maior a potência), os pregos simulam a estrutura de um material condutor, enquanto as esferas representam os elétrons. “Com a maquete, é possível diferenciar a potência elétrica da corrente elétrica”, explica.
Não foram utilizados computadores e livros didáticos em braile. “Esse tipo de publicação é rara no Brasil, e os computadores são caros, bem como os materiais para cegos”, afirma o físico, que planeja a construção em Ilha Solteira de um laboratório de ensino de Física para alunos com deficiência visual.
Fonte: Jornal da Unesp (www.unesp.br ), com base em matéria de Julio Zanella.