O Rio de Janeiro foi o destino da primeira turnê que a Orquestra Sinfônica das Comunidades (Oscom) realizou fora de Santa Catarina. O grupo fez apresentações no Morro do Turano e no Morro do Salgueiro, na zona norte da cidade do Rio. A orquestra conta atualmente com 200 participantes, entre 10 a 24 anos, todos oriundos de 21 comunidades periféricas de Florianópolis, e tem o objetivo de proporcionar aos jovens novas perspectivas e possibilidades de inserção social e no mercado de trabalho.
A viagem já é um prêmio para 53 dos integrantes, já que a maioria deles jamais ultrapassou os limites da Grande Florianópolis. ?Se para muitos deles tocar no Estreito (bairro de Florianópolis) é motivo de festa, imagina no Rio de Janeiro?, brinca o maestro André Calibrina, 43 anos, criador da Oscom. Para os jovens músicos, a turnê significa também romper algumas barreiras sociais, como a baixa escolaridade, a ameaça do tráfico de drogas e da violência em suas comunidades e a falta de espaços de lazer. Em muitos casos, a música trouxe uma nova perspectiva de vida para seus integrantes. Foi assim com a ex-aluna Magridt Besen, 16 anos, que hoje integra o grupo de 20 professores e ensina violino aos jovens. Spalla (apoio do maestro, responsável pela afinação do conjunto) da orquestra, Magridt quer prestar vestibular para Música.
Carlos Eduardo da Costa, 17 anos, também se animou com a turnê porque foi a primeira vez que ele viajou tão longe. O aluno foi convidado a participar do projeto quando freqüentava a Casa da Liberdade, projeto social no centro do Florianópolis e, em poucos meses, já era um dos titulares no contrabaixo. ?Quando toco, me sinto feliz, me sinto bem. È uma sensação diferente, difícil de explicar?, fala. Quem acompanha o trabalho dos filhos também aplaude a iniciativa. Rosane Aparecida Sabino da Silva conta que a filha mais velha, Suelen, ficou até mais aplicada nos estudos depois que passou a tocar clarinente na Oscom. ?Ela era muito desligada?, contou Rosane.
Ganhar a vida, ganhar o mundo
O trabalho da Orquestra Sinfônica das Comunidades também ajudou a desmitificar a idéia de que a música erudita é acessível somente a determinados grupos sociais com maior grau de escolaridade. As apresentações do grupo seguem uma forma didática com explicações do maestro sobre o significado e a importância de cada instrumento no conjunto da orquestra. São 110 instrumentos, divididos em quatro naipes ou famílias de instrumentos: madeiras (flauta, oboé, fagote, clarinete e saxofone), metais (trompete, trompa, trombone e tuba), cordas (violino, viola, violoncelo e contra-baixo) e percussão (prato, caixa, tímpano e bumbo). Os ensaios acontecem duas vezes por semana em cada comunidade e, no sábado, todos se reúnem para o ensaio geral, em uma escola no centro de Florianópolis.
Para Calibrina, a transformação de cada músico é visível a partir do momento em que ele se integra ao grupo. ?A relação com os pais, com a comunidade e com a escola muda consideravelmente. Eles passam a ter foco e noção de responsabilidade?, observa o maestro, um carioca que há 22 anos trocou o Rio de Janeiro por Florianópolis após ser aprovado num concurso para tocar na banda da Aeronáutica. Ele conta que a maior recompensa, no entanto, é saber que as crianças e adolescentes voltam a sonhar com um futuro de possibilidades. ?Não são poucos os que dizem que querem viajar o mundo tocando em uma orquestra profissional?, afirma o regente. ?Eu digo para eles que quem acha que um músico que está na Filarmônica de Nova York é parente do Bill Clinton (ex-presidente americano) está muito enganado. A vida de um músico é de muito esforço, disciplina e seriedade. E todos podem chegar lá, porque o músico brasileiro tem a sensibilidade e a ginga que não se vê em nenhum outro lugar do mundo?, completa.
Em 2006, a Oscom recebeu o reforço do patrocínio de empresas privadas através do Funcultural. A Orquestra também tem o apoio do governo do estado e da prefeitura de Florianópolis, por meio da secretaria da Criança, Adolescente, Idoso, Família e Desenvolvimento Social e da AFLOV ? Associação Florianopolitana de Voluntários. Esse incentivo possibilitou a realização da turnê 2006/2007 em comunidades da capital catarinense e no Rio, onde os músicos devem retornar em abril para tocar no morro da Mangueira.
Fonte: Comunique-se (www.comuniquese.com.br/)