— Para se ter uma ideia, não era o objetivo do estudo analisar néctar misto, nós acabamos enganados na hora da compra para a análise. E assim acontece com o consumidor, diante de tantos diferentes tipos de bebidas, ele não se dá conta, por exemplo, que um refresco em pó tem 1% de fruta. Mais grave ainda do que não dar destaque para o fato do néctar ser misto, é o ingrediente principal não ser a fruta em destaque. Em todos os sabores em que encontramos a mistura (uva, laranja, maracujá e pêssego), a adição era de suco de maçã, o que nos faz crer que a intenção é de redução de custo — avalia Ana Paula Bortoletto, nutricionista do Idec.
Ana Paula disse ainda que pela regulamentação os sucos mistos têm um percentual obrigatório de fruta de 30%, enquanto em caso de um néctar apenas de pêssego ou de manga tem que ter 40%. Ou seja, em alguns casos, o consumidor pode estar levando menos fruta pra casa. O exemplo não se aplica a todos os néctares, é verdade, pois no caso de uva e laranja, o percentual obrigatório é de 30% e de maracujá é de 10%.
Segundo a análise do instituto, as marcas Dafruta e Maguary são as mais recorrentes na prática de usar um mix de duas frutas e só informar ao consumidor com letras pequenas na lateral da caixa e em cores que dificultam a leitura, destaca o Idec. As duas marcas foram reprovadas no teste na avaliação da rotulagem.
A Ebba, que responde pelas marcas Maguary e Dafruta, afirma estar de acordo com todas as normas do Ministério da Agricultura (Mapa) e ainda apresenta laudos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) para demostrar que apresenta o percentual de fruta estabelecido na legislação. A empresa ainda contesta o método de avaliação de percentual de fruta usado pelo laboratório Eurofins, contratado pelo Idec. A Ebba alega ainda que informa discretamente o mix com o suco de maçã para que o consumidor não se fruste ao não sentir o sabor da fruta, argumento que é refutado pelo Idec.
O levantamento do instituto aponta ainda que os néctares mistos apresentam um teor de açúcar acima do desejável, não devendo fazer parte da dieta cotidiana das crianças, para os quais são claramente direcionados.
— Todos têm teores de açúcar acima de 12,4g/100ml, o que já acende o sinal amarelo, de acordo com um esquema de rotulagem criado no Reino Unido, que sinaliza os nutrientes dos alimentos a exemplo das cores dos sinais de trânsito. Mais da metade tem alto teor de açúcar. Contamos para esse cálculo com a frutose, que é o açúcar da fruta, que em si não prejudica à saúde, mas no suco a quantidade de fruta consumida é maior do que quando você come e não há fibra, o que faz com que haja uma absorção maior de açúcar — explica a nutricionista do Idec, que recomenda a troca por água, suco de frutas naturais e água de coco.
Os cinco néctares com maior teor de açúcar identificados no teste são o Dell Valle de Uva (13,31g/100ml), o Camp Uva (13,30g), o Activi Uva (13,04 mg), o Dafruta Laranja (12,95g) e o Dell Valle Manga (12,95g).
Hoje não há obrigatoriedade de informação pelo fabricante da quantidade de açúcar no néctar. Uma forma do consumidor avaliar a bebida é comparar na tabela nutricional dos produtos a quantidade de carboidrato e de calorias que são indicadores da quantidade de açúcar, orienta Ana Paula.
— Além disso, há a lista de ingredientes abaixo da tabela, que estão sempre em ordem decrescente. Ou seja, se o açúcar estiver entre os primeiros ingredientes você já sabe que há grande quantidades naquela formulação — ela acrescenta que instituto criou um ambiente especial para tratar do tema.
Segundo Nina Rosa Morais, gerente de de Pesquisa e Desenvolvimento da Ebba, o setor está discutindo com o Mapa a possibilidade de poder usar de forma híbrida nos néctares, assim como acontece com outras bebidas, como os preparados de soja, e os refrescos em pó, açúcar e adoçantes. Atualmente, isso não é permitido, explica:
— Hoje ou usamos açúcar ou o produto é light apenas com o uso do adoçante. E não é possível excluir o açúcar por conta da acidez da fruta. Já pensou bater um maracujá mo liquidificar e beber sem açúcar?
Empresas dizem seguir a lei – A WOW! Nutrition, que responde pela marca Sufresh, afirma prezar pela qualidade de seus produtos, respeito aos direitos dos consumidores e a legislação. A empresa informa que fará nova análise das amostras avaliadas pelo Idec e caso sejam apontadas as divergências apontadas pelo instituto tomará providências para adequa-los a legislação.
A Del Valle afirma que a avaliação do Idec confirma que a empresa atua de acordo com a lei e que não usa conservante ou corantes artificiais. A companhia ressalta que legislação brasileira não estabelece um valor diário de referência para o consumo de açúcares e que respeita o limite mínimo estabelecido pelo Mapa.
Já General Brands, da marca Camp, afirma que todas as medidas necessárias para a verificação dos produtos apontados na análise estão sendo tomadas e que está encaminhando a amostras para reanálise. A empresa ressalta que, em 16 anos de atividade, nenhum de seus produtos, foi considerados “não conformes” pelo Ministério da Agricultura.
A Bebidas Brasil Kirin, produtora do Fruthos, não respondeu ao GLOBO e nem ao Idec.
A Danone, dona da marca Activia, garante que seus produtos estão de acordo com a legislação, como aponta a pesquisa do Idec.
— Estamos falando em mais do que seguir as regulamentações do Mapa, em atender ao Código de Defesa do Consumidor que fala em informação clara e precisa ao consumidor — destaca Ana Paula.
Fonte: O Globo
Autor: Luciana Casemiro