A rotatividade no tráfico de drogas é maior do que se supunha e existe a possibilidade de os jovens saírem da atividade. Este foi o principal mito rompido com a pesquisa “Trajetória social de jovens inseridos no tráfico de drogas no Rio de Janeiro”, divulgada pelo Observatório de Favelas, no dia 23 de novembro. O Observatório de Favelas é uma organização não-governamental que reúne pesquisadores e estudantes vinculados a diferentes instituições acadêmicas e organizações comunitárias e tem sede no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.
A pesquisa teve o objetivo de mostrar as características e as “faces” de crianças, adolescentes e jovens que trabalham no tráfico. A partir destes dados, o Observatório espera contribuir para a mudança das estratégias de enfrentamento ao trafico de drogas, estimulando a proposição de políticas de segurança pautadas na valorização da vida e nos direitos humanos.
Realizada com 230 crianças e jovens, entre 11 e 24 anos de idade, a pesquisa abrangeu 34 comunidades populares de todas as áreas do Rio de Janeiro. Na primeira fase, iniciada em junho de 2004, foi aplicado um questionário com 94 questões relativas às relações dos adolescentes e jovens com a rede do tráfico de drogas. Na segunda fase, foram feitas novas perguntas para atualizar os dados. Ao longo de 2005 foram realizados encontros mais informais e a última atualização é de abril e maio de 2006.
Na última atualização, foi constatado que dos 230 jovens pelo menos 46 morreram ao longo da pesquisa. Desse universo, apenas 7% ainda estudavam, mas 90% afirmaram que sabiam ler e escrever. Quase metade desistiu de estudar entre os 11 e 14 anos, faixa etária que coincide com a entrada no tráfico de drogas: 60% entraram para o tráfico com idades entre 12 e 15 anos. As motivações para o ingresso no tráfico citadas pelos jovens foram: “ganhar muito dinheiro” (33%) e “ajudar família” (23%), seguidas de “dificuldade em conseguir qualquer outro emprego” (9,1%) e “ligação com amigos” (8,3%). Já quanto à destinação dada ao dinheiro ganho, as principais respostas foram: “comprar roupa” (46%) e “ajudar família” (32%).
A pesquisa também mostrou que houve um decréscimo na renda obtida com a atividade, em função da concorrência dos grupos dos setores médios, e abordou alguns fatores que compõem o cenário atual do tráfico de drogas no Rio de Janeiro: o ingresso de drogas sintéticas, o que tem diminuído o lucro, e a forma como as autoridades, especialmente a polícia, têm conduzido a questão. Para o Observatório, o índice de mortalidade de adolescentes e jovens negros e pobres representa um quadro de genocídio: dos empregados do tráfico, 73% já foram espancados e mais da metade já foi extorquida pela polícia. No entanto, menos de 30% foram conduzidos para o sistema judiciário.
A pesquisa chama a atenção ainda para a utilização de armas de guerra e de “caveirões” – carros blindados do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) – que aterrorizam os moradores das favelas e o alto índice de mortalidade tanto entre os adolescentes e jovens, quanto entre os policiais.
Ao final da pesquisa, o Observatório verificou que quase 40% dos entrevistados tiveram possibilidade de se afastar da rede do tráfico de forma voluntária. Para a ONG, esse dado indica a relevância de trabalhar na construção de alternativas para os que saem do tráfico, com ações específicas para a melhoria das condições de vida das crianças, adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social.
Fonte: Observatório de Favelas (http://www.observatoriodefavelas.org.br)