O projeto de lei que trata da preservação e do uso sustentável da Mata Atlântica, aprovado no final de novembro, estabelece uma série de mecanismos, incentivos e procedimentos para recompensar quem protege o meio ambiente e punir com mais rigor quem o degrada. O projeto também define os limites do bioma e lhe atribui função social, ou seja, reconhece que se valor excede seu potencial valor como mercadoria.
Cerca de 110 milhões de pessoas vivem nos 3.300 municípios dos 17 estados que abrigam áreas remanescentes de Mata Atlântica, hoje reduzida a pouco mais de 7% de sua área original. Além disso, ela cumpre importante papel na proteção dos recursos hídricos, na regulagem do clima e na proteção da biodiversidade, entre outras coisas.
O Projeto 3.285 de 1992 foi votado em definitivo após 14 anos de debates e agora seguirá para sanção presidencial. Havia sido aprovado na Câmara dos Deputados em dezembro de 2003 e, encaminhado ao Senado, recebeu 15 emendas. Voltou à Câmara e foi apresentado em plenário em março deste ano. Ali, foi necessário que lideranças partidárias chegassem a um acordo sobre a retirada do artigo 13.
Esse dispositivo havia sido incluído por senadores a fim de amenizar outro artigo, o 46, que estipula indenizações e que tinha sido inserido pelos deputados. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) decidiu que, com a exclusão do artigo 13, recomendará ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que vete o artigo 46. Segundo os opositores, esse item cria brechas legais que resultariam numa enxurrada de pedidos indenizatórios.
De acordo com o texto aprovado, fazem parte da Mata Atlântica as formações nativas e os ecossistemas associados, delimitados em mapa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como a mata de araucária, os manguezais, as vegetações de restingas, os campos de altitude e os brejos interioranos.
Áreas remanescentes da floresta
Um dos aspectos centrais do Projeto de Lei 3.285 é elevar as áreas de remanescentes florestais à condição de área produtiva. Ele permite a donos de propriedades com vegetação nativa maior do que a extensão estipulada por lei (20%) alugar uma parte da floresta para outros que tenham desmatado toda a sua propriedade e, em vista disso, precisam legalizar sua situação. Para o governo, esse mecanismo é de fundamental importância para conter a destruição da vegetação.
Além disso, se não quiserem alugar áreas preservadas, os donos de terras que têm passivos ambientais terão uma outra opção para recuperá-los. Poderão adquirir e doar ao governo áreas em unidades de conservação (UCs) a serem criadas. Estas áreas deverão ser equivalentes ao que deveria ser a reserva legal da propriedade original. Embora imponha regras rígidas de preservação ambiental, a nova lei permite a exploração racional da Mata Atlântica. Áreas onde o processo de regeneração dos remanescentes da floresta está em fase inicial, ou seja, onde a vegetação teve menos de dez anos para se recuperar, serão destinadas à agricultura ou a loteamentos. Mesmo assim, essa destinação deverá levar em conta a legislação em vigor, protegendo nascentes e reservas legais. Caberá ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) definir o que é vegetação primária e secundária e quais seus diferentes estágios de preservação.
Como proteger o bioma?
Para Miriam Prochnow, coordenadora-geral da Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica, a sociedade não pode interpretar que a luta tenha chegado ao fim. ?Temos de continuar a vigília?, disse. O trabalho continua de outra forma, mas tão intenso quanto foi a luta pela aprovação da própria lei.?
Na avaliação de Miriam Prochnow, é preciso estar atento ao encaminhamento dos artigos que falta regulamentar. ?Faltam ferramentas que possam ser aplicadas para a efetiva recuperação e conservação do bioma?, afirmou. ?Não adianta apenas dizer de forma genérica que não pode desmatar. É preciso esclarecer que não se podem desmatar florestas primárias, que se pode fazer algum tipo de uso da floresta em estágio avançado de regeneração. Com essas explicações, os proprietários de terra podem planejar a utilização da sua propriedade e, inclusive, contribuir para a preservação da mata.?
Entre os aspectos positivos do texto, a ambientalista destacou o estímulo à criação de unidades de conservação: ?A lei permitirá que parques, reservas e estações ecológicas tenham uma ferramenta a mais de regulamentação fundiária. Considero um grande avanço a permissão de que proprietários rurais compensem seu passivo ambiental comprando áreas e doando para a União transformar em unidades de conservação de forma perpétua?.
O diretor da Fundação SOS Mata Atlântica Mário Mantovani elogiou o projeto aprovado, dizendo que ele tem caráter cidadão, foi criado com a participação de amplos segmentos da sociedade. Mas também ressaltou que ainda há muito que fazer para proteger os pouco mais de 7% que restam da área original da floresta. ?Tudo que podia ser feito para valorizar a participação da sociedade foi feito?, afirmou. ?Agora, precisamos ir além: aproveitar este momento para um processo educativo que fortaleça ainda mais a participação da sociedade, já que esta lei é uma conquista de todos.?
Fonte: Agência Brasil (www.agenciabrasil.gov.br), com base em matérias de Alex Rodrigues.