Em 1º de julho entrou em vigor resolução do Banco Central (BC), associado ao COEP Nacional, que determina que bancos públicos e privados restrinjam concessão de crédito rural a agricultores e pecuaristas em estados da Amazônia Legal que apresentem licença ambiental. Ficam isentos de restrição créditos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), pequenos produtores e beneficiários da reforma agrária.O governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, que é produtor de soja, defende suspensão da exigência, alegando que poucos produtores dispõem de licença, que é emitida por órgãos ambientais de cada estado. Segundo ele, ?grande parte da produção pode parar se não puder contar com acesso a financiamentos de instituições públicas?. Para o governador, “vai parar tudo”, diz, referindo-se à produção agropecuária nos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e, parcialmente, Maranhão, que constituem a Amazônia Legal e representam quase metade do território do país.O Ministério da Agricultura cogita substituir apresentação de documentos oficiais por declaração de proprietários de terras, regra que é aplicada a pequenos produtores. Estão em jogo cerca de R$ 3 bilhões, volume repassado por ano a agricultores e pecuaristas nos municípios do bioma Amazônia, segundo dados do Banco Central.Em nota técnica preparada pelo Ministério do Meio Ambiente, a oferta de crédito rural nos 557 municípios do bioma é relacionada ao aumento de desmatamento. “A oferta crescente de crédito sem adoção de mecanismos de monitoramento pelos órgãos ambientais pode induzir ao crescimento ou à manutenção de taxas elevadas de desmatamento”, diz a nota. Estudo do Ministério cruzou dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que avalia desmatamento, com dados do anuário estatístico de crédito rural do BC, e concluiu que no Mato Grosso, Pará e Rondônia, que foram responsáveis por 85% do desmatamento em 2007, o abate de árvores acompanhou a evolução na oferta de crédito. Também foram analisados 16 municípios do Pará e de Mato Grosso que mais desmataram a Amazônia, onde verificou-se, segundo a nota, ?evidências ainda mais fortes de que o volume de crédito está relacionado com a intensidade dos desmatamentos”.A resolução do BC reacende debate sobre responsabilidade de instituições financeiras em relação a avaliação de riscos socioambientais na concessão de crédito. ?Há pessoas que acreditam que bancos são totalmente responsáveis pela avaliação socioambiental de seus clientes. Outras, que eles não têm responsabilidade, pois isso caberia ao Estado. A resposta correta deve estar em algum lugar no meio do caminho”, diz Christopher Wells, principal executivo da força-tarefa para América Latina da United Nations Environment Programme Finance Initiative (Unep-FI), braço do Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas para o setor financeiro.Em 2002 o International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial, e um grupo de bancos privados lançaram os ?Princípios do Equador?, conjunto de critérios socioambientais que passariam a ser exigidos em concessão de créditos para empresas e projetos de infra-estrutura a partir de determinado valor, com objetivo de evitar financiamento de empresas e obras potencialmente desastrosas para sociedade e ambiente. A incorporação de princípios semelhantes em operações de crédito por bancos resulta da lógica de que, quanto mais sujeita a multas ambientais e trabalhistas a empresa for, maior é o risco de inadimplência.Segundo especialistas, o Brasil é um dos países mais avançados na discussão sobre critérios e responsabilidades socioambientais relacionados ao crédito bancário. Mesmo estando em dia com órgãos de fiscalização trabalhista e ambiental, empresas podem representar riscos de inadimplência, de garantias e de imagem para instituições financeiras. “Em alguns países, estar em dia com órgãos de fiscalização basta para que os bancos tenham segurança ao emprestarem recursos. No Brasil, os problemas que temos nessa área são justamente a causa desse debate no sistema financeiro”, diz Christopher Wells.Segundo a diretora de responsabilidade social da Federação Brasileira de Bancos, Sônia Favaretto, “há um grande debate no setor financeiro sobre se a responsabilidade socioambiental dos bancos tem ou não limites. A única coisa que se sabe até agora é que, em um cenário de evolução do tema da sustentabilidade, esses limites serão cada vez mais estendidos”.Bancos que se recusam a conceder crédito, tendo como base critérios socioambientais, enfrentam concorrentes que não adotam política similar. Para Wells, “isso acontece, ainda que seja cada vez menos comum. É por isso que precisamos de políticas setoriais, coordenadas, pois é do interesse de todos ter um bom radar para detectar clientes que representem riscos socioambientais”, diz o executivo do Unep-FI.