As altas temperaturas do verão e o pico no consumo de energia elétrica levou o sistema brasileiro a um colapso no dia 19 de janeiro. O resultado foi um apagão em 11 Estados e no Distrito Federal bem no meio da tarde, ocorrência que trouxe inúmeros problemas e que ainda não foi bem explicada pelas autoridades. O episódio serve para demonstrar como dependemos da luz e que somente quando ela desaparece é que podemos mensurar a falta que nos faz.
Embora esteja presente nas nossas sociedades como algo “natural”, estima-se que 1,5 bilhão de pessoas no mundo ainda vivam sem eletricidade. Como pensar formas de desenvolvimento social a partir da luz, garantir o abastecimento sem intercorrências e ainda assegurar que todo mundo tenha acesso?
São essas e outras questões que a Organização das Nações Unidas (ONU) quer discutir com a instituição de 2015 como o Ano Internacional da Luz. “O intuito é de chamar a atenção para a importância da luz e das tecnologias ópticas no cotidiano da população em todo o planeta, bem como seu papel no desenvolvimento e no futuro da humanidade”, completa um dos coordenadores da Unesco no Brasil, Ary Mergulhão, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line.
A ONU também quer destacar a luz como base de desenvolvimento nas mais variadas áreas. “Ela vem revolucionando a medicina, permitindo a comunicação internacional por meio da Internet e continua a ser primordial nas esferas econômica, política, cultural e científica”, exemplifica Mergulhão. A partir daí, a intenção é provocar o debate para pensar em formas de desenvolvimento sustentável a partir da geração de energia. Isso tudo através de diversos eventos em todo o mundo.
“Uma vez que a energia do sol pode ser convertida em calor e em eletricidade, governos e cientistas de todo o planeta trabalham para desenvolver tecnologias acessíveis e limpas de energia solar. O desenvolvimento futuro dos países desenvolvidos e emergentes está intimamente relacionado à capacidade de iluminar efetivamente nossas cidades, lares, escolas e áreas de recreação”, completa.
O Ano Internacional da Luz também vai falar de história. Ao longo do ano, atividades vão lembrar Ibn Al-Haitham, o Alhazen, entre outras figuras que foram importantes ao desenvolvimento da energia. “Ele é considerado o pai da óptica moderna, da oftalmologia, da física experimental e da metodologia científica. O Ano Internacional da Luz coincide com o milésimo aniversário de sua obra “Kitab al-Manazir” (“Livro da óptica”). Tal obra é um tratado de sete volumes que lançou as bases dessa ciência”, explica.
O que é o Ano Internacional da Luz?
Ary Mergulhão – É uma iniciativa mundial, coordenada pelas Nações Unidas. O intuito é de chamar a atenção para a importância da luz e das tecnologias ópticas no cotidiano da população em todo o planeta, bem como seu papel no desenvolvimento e no futuro da humanidade. A decisão de proclamar 2015 como Ano Internacional da Luz e das Tecnologias Baseadas em Luz (International Year of Light and Light-based Technologies – IYL 2015, na sigla em inglês) foi tomada durante a 68ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de dezembro de 2013, em Nova York, nos Estados Unidos.
Por que e para que/quem foi instituído o Ano Internacional da Luz?
A ideia é conscientizar a população em geral, e gestores públicos em particular, sobre como as tecnologias baseadas na luz podem promover o desenvolvimento sustentável. Nas palavras do presidente do Comitê de Promoção do Ano Internacional da Luz, John Dudley, “um Ano Internacional da Luz é uma grande oportunidade para garantir que gestores de políticas internacionais e partes interessadas se conscientizem sobre o potencial de solução de problemas que a tecnologia óptica apresenta”.
Qual a importância da Luz para o bem-estar da população?
A luz exerce um papel essencial no nosso cotidiano e é uma disciplina científica transversal obrigatória para o século 21. Ela vem revolucionando a medicina, permitindo a comunicação internacional por meio da internet e continua a ser primordial nas esferas econômica, política, cultural e científica. No caso da internet, por exemplo, podemos citar as mídias sociais, os telefonemas de baixo custo e as videoconferências com familiares e amigos. São formas de conexão entre pessoas no mundo inteiro, de um modo nunca antes possível. E tudo baseado na luz. Afinal, são dados de luz ultracurtos que pulsam, propagam-se em pequenas fibras ópticas com a largura de um fio de cabelo humano e criam a infraestrutura das comunicações modernas e a Internet que utilizamos todos os dias.
Como as tecnologias baseadas na luz podem contribuir com temas centrais de nossas sociedades, tais como produção energética, agricultura, educação e saúde?
Uma vez que a energia do sol pode ser convertida em calor e em eletricidade, governos e cientistas de todo o planeta trabalham para desenvolver tecnologias acessíveis e limpas de energia solar. Ora, a energia solar fornecerá um recurso praticamente inesgotável que aumentará a sustentabilidade, bem como reduzirá a poluição e os custos para enfrentar e conter a mudança climática. Sabemos que a iluminação representa quase 20% do consumo mundial de eletricidade, conforme a Associação Internacional da Energia.
Assim o desenvolvimento futuro dos países desenvolvidos e emergentes está intimamente relacionado à capacidade de iluminar efetivamente nossas cidades, lares, escolas e áreas de recreação. A ciência que gera, controla e detecta fótons — partículas de luz — é a fotônica. Hoje, empresas na área da fotônica e das tecnologias baseadas na luz trabalham para solucionar alguns dos principais desafios da humanidade: geração de energia e eficiência energética, envelhecimento saudável da população, mudança climática e segurança. Estamos falando de smartphones e laptops, internet, aparelhos médicos e tecnologias de iluminação.
O século 21 dependerá da fotônica, assim como o século 20 dependeu da eletrônica. Estão aí os números da economia: projeta-se que o valor de mercado das tecnologias fotônicas no mundo ultrapassará 600 bilhões de Euros, em 2020. Só para dar uma ideia do ritmo de crescimento desse setor, o aumento dessa indústria foi duas vezes maior do que o do Produto Interno Bruto – PIB mundial, entre 2005 e 2011.
Quais são os desafios no âmbito nacional?
Incentivar o desenvolvimento industrial nas áreas em questão. Ampliar a cooperação entre as áreas científicas e tecnológicas, melhorando o fluxo de conhecimento para a geração de tecnologias e produtos voltados à melhoria da qualidade de vida das pessoas. Isso inclui ampliação do acesso e redução dos preços finais.
Ampliando a pergunta para o contexto internacional, quais são as regiões do planeta mais vulneráveis? Como o Ano Internacional da Luz pode trazer benefícios a essas populações?
Chamando a atenção para regiões do planeta onde o uso de tecnologias de ponta aplicadas em benefício da população ainda é reduzido. Principalmente aquelas relacionadas à saúde, educação, infraestrutura e comunicação. Evidenciando que a importância do desenvolvimento científico e tecnológico está centrada nas pessoas e que os seus benefícios só fazem sentido quando disseminados em prol da sociedade em geral.
Que ações relacionadas ao tema devem ser realizadas no Brasil?
Ações de informação e mobilização que envolvam empresas, pesquisadores, governo, estudantes e professores do ensino básico. Estamos programando, em cooperação com outras instituições, uma série de ações que envolvam a sociedade sobre a importância do tema. A programação desses eventos será conhecida tão logo os eventos sejam confirmados.
Quem foi Ibn Al-Haitham e qual a importância dele para a física óptica?
Ibn Al-Haitham, conhecido também como Alhazen, foi um estudioso do século 10 que nasceu em Basra, cidade localizada no atual Iraque. Al-Haitham é considerado o pai da óptica moderna, da oftalmologia, da física experimental e da metodologia científica. O Ano Internacional da Luz coincide com o milésimo aniversário de sua obra “Kitab al-Manazir” (“Livro da óptica”). Tal obra é um tratado de sete volumes que lançou as bases dessa ciência.
QUEM É
Ary Mergulhão é coordenador de Ciências Naturais da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura – Unesco no Brasil.
Fonte: Do IHU On-Line
Por Ricardo Machado e João Vitor Santos