Um grupo de pesquisadores americanos e italianos anunciou, no final de abril, o sucesso no uso de terapia gênica para tratar uma variedade hereditária de cegueira. Três pacientes com a doença foram tratados com vírus inofensivos que carregavam DNA capaz de corrigir seus genes defeituosos. Em estudo publicado na revista “New England Journal of Medicine” (http://www.nejm.org), cientistas mostram um resultado bastante animador contra a doença em questão, chamada amaurose congênita de Leber.
“A visão dos pacientes se aprimorou. Eles conseguiram detectar movimentos manuais e leram as linhas de um cartaz de exame oftalmológico”, afirmou Albert Maguire, um dos líderes do estudo e pesquisador da Universidade de Pensilvânia (EUA).
A amaurose congênita de Leber é um mal genético que começa a se manifestar na infância. Em geral, o problema avança até a perda total da visão, em torno de 20 ou 30 anos. O funcionamento incorreto de um gene mata neurônios fotorreceptores.
Apesar de ser uma doença relativamente rara (nos EUA são cerca de 3.000 pacientes), se a nova técnica puder ser levada a mais pessoas, o benefício será grande, já que hoje a doença não tem nenhum tipo de tratamento. Esse foi um dos motivos que pesou na hora de os cientistas conseguirem aprovação das autoridades de saúde americanas para realizar o teste clínico da terapia gênica – uma técnica ainda bastante experimental – contra a amaurose congênita de Leber.
De Nápoles à Filadélfia
“Esse foi o primeiro teste clínico de terapia gênica contra uma doença pediátrica não-letal”, afirma Maguire. O médico diz que os voluntários do teste – um de 19 anos e dois de 26 anos – receberam as injeções com o vírus terapêuticos entre outubro de 2007 e janeiro de 2008 no Hospital Infantil da Filadélfia.
Segundo os pesquisadores, após duas semanas os pacientes -diagnosticados na Itália pelo programa de retinopatia da Segunda Universidade de Estudos de Nápoles – já começaram a relatar melhoras.
Testes de terapia gênica estão sendo feitos desde 1994. Mas, a partir de 2000, o cuidado passou a ser redobrado. Naquele ano o ensaio clínico para tratar uma doença imune acabou causando leucemia em voluntários na França. Além desse problema, alguns cientistas temem reações adversas por causa do uso de vírus para transportar genes terapêuticos.
O primeiro teste clínico de terapia gênica do Brasil, iniciado em 2007, não usa vírus. Cientistas do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul tentam tratar doença coronária injetando argolas de DNA nos pacientes.
Importância ampliada
O teste dos pesquisadores americanos e italianos, porém, parece ter contornado todos esses problemas, pelo menos em princípio. “Esse resultado é importante para todo o campo da terapia gênica”, declarou em comunicado Katherine High, do Instituto Médico Howard Hughes, de Boston, uma das pioneiras em estudos na área. Para ela, entretanto, os entraves mais recentes da terapia gênica estão mais relacionados à falta de eficácia do a problemas de segurança.
Segundo a oftalmologista Jean Bennet, colaboradora do estudo na Filadélfia, apesar do sucesso ainda é preciso ter cautela. “O teste clínico atual vai continuar, com mais pacientes e um acompanhamento paralelo para monitorar resultados”, diz. “Achamos que as melhoras serão mais pronunciadas em tratamentos que ocorram na infância, antes do avanço da doença”, afirma.