26/01/2015 I Levantamento feito pelo jornal O Globo, com base em informações de comitês de bacias hidrográficas e governos estaduais, mostra que ao menos 45,8 milhões de pessoas vivem em regiões em que os níveis dos reservatórios estão abaixo do normal e a quantidade de chuvas é menor que a média histórica. Racionamento, problemas de abastecimento ou reservatórios em níveis de alerta já são realidade em cinco das dez maiores regiões metropolitanas do país: Belo Horizonte, Campinas, Recife, Rio e São Paulo
O meteorologista Luiz Carlos Baldicero Molion, pesquisador da Universidade Federal de Alagoas, afirma que deve levar mais seis anos para que o Sudeste volte a ter um regime de chuvas acima das médias históricas. Ele chegou à conclusão após analisar a série de chuvas em São Paulo desde 1888. Segundo ele, o estado teve ao menos outros três ciclos de secas de oito a nove anos ao longo do último século.
Caso se prolongue, a estiagem ameaça a geração de energia nas hidrelétricas, a produção industrial e de alimentos, além de trazer riscos à saúde.
Apresentamos abaixo a opinião de dois especialistas sobre a crise hídrica.
Leia e deixe sua opinião: quais as principais causas da escassez de água e o que deve ser feito para mudar a situação?
Malu Ribeiro
Especialista em gestão de recursos hídricos e coordenadora da Rede de Águas da Fundação SOS Mata Atlântica.
Cândido Grzybowski
Sociólogo, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase).
A crise da água
Entrevista com Malu Ribeiro
Idec: Quais são os fatores responsáveis por essa escassez histórica na região metropolitana de São Paulo?
MALU RIBEIRO: A crise decorre de décadas de mau comportamento em relação ao uso da água e do solo, e também de uma relação cultural equivocada que nós, brasileiros, temos com os recursos naturais. Vivemos uma cultura de abundância de água. Ninguém pensa em seca em região de Mata Atlântica, que é uma área de abundância de rios, cachoeiras e florestas. Mas viemos perdendo as florestas, por meio do uso do espaço urbano de forma completamente desordenada. Isso causou dois problemas graves: concentração do consumo da água [na região metropolitana] e aumento da poluição em praticamente oito vezes. A falta de água hoje na Grande São Paulo é muito mais decorrente da poluição e do desperdício do que do clima. Os eventos climáticos extremos potencializaram a crise, mas eles não são os culpados.
Idec: A Grande São Paulo tem baixa disponibilidade de água e problemas sérios de contaminação de mananciais. Nesse cenário, qual é a solução para a atual crise e para evitar que novas aconteçam?
MR: São três medidas estratégicas. A primeira é uma revisão séria e criteriosa do planejamento urbano, a fim de frear a tendência de ocupação de áreas de mananciais de forma desordenada e irregular. É preciso estabelecer que essas áreas são prioritárias para conservar a água e não podem ser utilizadas para outras finalidade.
Em segundo lugar, é necessário investir maciçamente e de forma rápida na universalização do saneamento, ou seja, oferecer para todas as pessoas água tratada, coleta e tratamento de esgoto. Na terceira ponta, precisamos de um modelo de gestão mais eficiente, que combata o desperdício. No papel, as leis são muito boas, mas elas não são postas em prática. Por exemplo, está previsto na Constituição que é proibido lançar esgoto em qualquer corpo d'água sem tratamento. Se a lei fosse cumprida, nossos rios não estariam poluídos. A poluição é o pior desperdício.
Idec: É financeiramente viável despoluir um rio como o Tietê ou o Pinheiros?
MR: Sem dúvida. É um crime não despoluir! Para cada dólar investido em saneamento básico, economiza-se de cinco a oito dólares em saúde pública. Mais de 70% das doenças de veiculação hídrica, que levam a óbitos e à ocupação de leitos de hospitais, são decorrentes de contato com a água contaminada.
Por que temos dinheiro para construir estádio de futebol para a Copa do Mundo, construir pontes estaiadas e duplicar vias da Marginal, mas não temos para despoluir o rio Tietê? São escolhas. Infelizmente, não priorizar a despoluição de rios é uma escolha feita por falta de educação para a cidadania.
Idec: Alguns especialistas têm afirmado que o racionamento já deveria ter sido adotado há vários meses. Você concorda?
MR: Não. O racionamento de água para o cidadão é a pior medida, pois penaliza quem não tem culpa pelo problema. O acesso à água de qualidade e em quantidade suficiente é um direito humano. Se houve falha do Estado no planejamento e no combate ao desperdício e à despoluição, não é o cidadão quem deve pagar por isso. Há setores que desperdiçam muito mais, como a indústria e a agricultura de irrigação, que não entram no racionamento porque têm outorga [para uso da água].
É uma falsa ideia a de que o racionamento ou o rodizio de água teriam ajudado a enfrentar a crise. Teria ajudado se tivessem sido adotadas medidas educativas desde o apagão de energia elétrica, em 2002. Mas agora o racionamento é inevitável. É uma medida totalmente emergencial, que terá reflexos no ano eleitoral. Vai ter uso político, o que faz da questão muito mais perversa do que ela já é.
Idec: Algumas cidades paulistas, como Campinas, já instituíram multas a quem desperdiça água e agora se fala em fazer o mesmo na capital. Em sua opinião, é justo punir os consumidores, sendo que as próprias concessionárias perdem muito mais água no abastecimento?
MR: É justo coibir toda forma de uso inadequado. Não é porque a pessoa paga pela água que pode fazer o que quiser com ela. Num período de crise, é preciso estabelecer qual é a cota de cada um. O Ministério Público e os órgãos de defesa do cidadão podem autuar a irresponsabilidade das companhias de saneamento também.
Idec: Uma das medidas anunciadas para ampliar o abastecimento na Grande São Paulo é a construção do Sistema São Lourenço. Mas o projeto implica na destruição de 34 hectares de Mata Atlântica, intervenção em área de proteção e retirada de moradores do entorno. Os benefícios compensam os prejuízos desse empreendimento?
MR: Não exatamente compensam os prejuízos, mas esse é um investimento necessário hoje e que passou por licenciamento ambiental. A crítica que se pode fazer é: por que demorou tanto para construir esse e outros reservatórios? Porque é politicamente delicado para São Paulo buscar água na região do Vale do Ribeira, usá-la e depois devolver esgoto para o interior do Estado. Essa é uma lógica perversa das regiões metropolitanas: concentram gente e atividade econômica, importam recursos naturais e exportam problemas. É insustentável. Mas, neste momento, o ideal seria construir mais reservatórios, porque a água da chuva é desperdiçada. No período de chuva, sofremos com enchentes e no período de seca, com escassez.
Idec: A região Nordeste é a que mais sofre com as secas no Brasil. O problema é mesmo de falta de água ou de distribuição do recurso?
MR: No semiárido é falta de água mesmo. Mas há tecnologia para que a vida nesse bioma seja sustentável. O erro é querer adotar um modelo de produção inadequado para o local, como a criação de gado. Vários países têm áreas de deserto e são muito mais eficientes em produção do que nós. Nós fizemos uma "cultura da seca", que sustentou usos políticos e concentração de poder. O Brasil precisa entender os seus biomas e transformar essas características regionais em ativos econômicos, e não em problemas.
Idec: Segundo o Ministério das Cidades, em média, 38,8% da água tratada no Brasil é desperdiçada antes de chegar à torneira dos consumidores. O que deve ser feito para evitar tanto desperdício?
MR: Primeiro, um planejamento urbano mais adequado. Os maiores índices de desperdícios em São Paulo, por exemplo, estão em bairros onde a ocupação se deu de forma irregular. Mas não dá nem para comparar os índices [de desperdício] da capital paulista com o restante do país. No Norte, no Nordeste e no Rio de Janeiro, o desperdício é muito maior, de 42% a 44%, em média. Como uma empresa público-privada, a Sabesp tem uma capacidade de investimento tecnológico que não dá para comparar com as outras. A redução de perdas que São Paulo tem implementado tornou possível chegar até agora com água. Os municípios que não são operados pela Sabesp, como Guarulhos, já estavam enfrentando o rodízio há muito mais tempo.
Idec: A agricultura é responsável por 70% do consumo de água no Brasil e é também recordista em desperdício. É possível mudar esse quadro?
MR: Na verdade, a agricultura irrigada e a de monocultura são as responsáveis pelo desperdício. Há outras formas, como a agricultura familiar, que não desperdiçam tanto. Na irrigação, perde-se muita água por falta de investimento tecnológico e de fiscalização. O setor de agricultura no Estado de São Paulo foi o que ofereceu maior resistência à cobrança pelo uso do recurso. Eles conseguiram moratórias por sete anos para não pagar pela captação da água dos rios. É um setor economicamente muito forte, que tem uma grande influência política.
Se o produtor [de agricultura] pagasse mais caro pela água e este gasto estivesse incorporado em sua cadeia de produção, como acontece na indústria, o comportamento seria outro. Imagine se no pacote de arroz estivesse escrito "aqui estão embutidos 'x' litros de água". Teria marcas que passariam a dizer "este arroz economiza água" ou "aqui se investe em meio ambiente".
Idec: Quais mecanismos têm sido adotados por outros países em relação ao uso da água que poderiam servir de exemplo para o Brasil?
MR: Temos falado muito no modelo de Nova York. A cidade entrou em uma crise como a que enfrentamos agora, e adotou um instrumento econômico [para resolver o problema]: o pagamento por serviços ambientais. A companhia de água local fez um estudo e descobriu que se pagasse para os proprietários de fazendas não produzirem nada e só conservarem as matas, isso aumentaria a sobrevida do abastecimento de Nova York em 20 anos. Eles apostaram. Se o mesmo fosse feito nos nossos mananciais – como está previsto na lei de proteção dessas áreas, inclusive –, implementando esse instrumento em chácaras, sítios e fazendas, desde as nascentes em Minas Gerais até o último dos sete reservatórios do sistema Cantareira, seria formado um grande cinturão verde e isso aumentaria o nível dos lençóis freáticos, garantiria a qualidade dessas águas, gastaríamos menos com o tratamento e os reservatórios sofreriam menos impacto de eventos climáticos extremos.
Fonte: Revista Idec, nº 187, maio 2014
Não adianta tapar o sol com a peneira
Nestes dias escaldantes com um verão de poucas chuvas, o assunto dominante nas conversas é o calor e se estamos já sofrendo a mudança climática. Na Região Sudeste sofremos pela escassez, mas em outras regiões do Brasil sofre-se pela abundância de chuvas. O que se passa? Por que tais extremos?
Faltam chuvas para nós e falta muita água. Cachoeiras e lagos estão minguando, a grama dos parques está secando, os reservatórios de água para abastecimento de nossas casas estão se esgotando. Agora está faltando água nas grandes represas hidroelétricas. Resultado: calor demais, água para consumo doméstico de menos, ameaçando tanto o banho como o ar condicionado e os ventiladores que nos refrescam, como aconteceu nesta segunda-feira em boa parte do país. O que fazer?
Como assinalado no título desta crônica, não adianta tapar o sol com a peneira de nossa irresponsabilidade coletiva, uns mais outros menos, mas de toda forma de todos. Querer fugir não resolve o problema, nem culpar a natureza ou atribuir a situação a uma vingança dos deuses. Temos que encarar o problema como coletividade e definir ações que, ao menos, mitiguem o problema e que ele não se agrave logo nos anos vindouros.
Aqui no Rio de Janeiro temos um bom exemplo para lembrar. Por volta de meados do século XIX, devido ao intenso desmatamento nas encostas da Tijuca, as nascentes dos rios que abasteciam a cidade começaram a secar. Numa decisão, que devemos louvar sempre, as autoridades reflorestaram as encostas. Hoje temos a Floresta da Tijuca – uma floresta produzida – bem no coração da cidade, maior floresta urbana do mundo, de uma beleza indiscutível e que, combinada às praias, até nos dá aquele sentido de lugar único, de que muito nos orgulhamos. Nossos rios voltaram a correr e, em época de chuvas, temos muitas cachoeiras para curtir. Nada, porém, como uma caminhada pelas frescas trilhas da Floresta da Tijuca para sentir o quão abençoadas são as árvores na regulação do calor.
O fato é que temos muito a fazer para evitar o pior. Precisamos, antes de mais nada, nos convencer que estamos diante do desafio de lidar com bens comuns. A água é o mais vital deles. Sem água não há vida, nenhuma forma de vida. Trata-se de um estoque dado que se perpetua e renova no ciclo da água. Por onde começarmos sempre teremos a combinação de chuvas que caem e regam tudo, a água que é estocada pelas árvores e lençóis freáticos, nos abastecemos fazendo poços ou captando a água que nasce em fontes e forma córregos e rios, chegando ao mar. Em todo esse ciclo, dá-se a evaporação, que forma os “rios” de umidade atmosférica, condensados em nuvens, que alimentam as chuvas. Belo processo, de cuja integridade e constância depende a vida na terra. Mas ação humana pode e está interferindo no ciclo da água e no próprio clima.
Ouvimos pelos noticiários de televisão e rádio ou lemos nos jornais as várias hipóteses de especialistas sobre o que está acontecendo e as possíveis causas das perturbações atuais no ciclo da água, que explicam a falta de chuvas e o calor que sentimos. De qualquer forma, não dá para ignorar nossa responsabilidade no problema. Todos temos que aprender a lidar com a água como um bem comum, tanto na sua abundância como na sua falta. De que adianta termos em território brasileiro a maior reserva de água doce do planeta se não soubermos lidar com ela? Vai faltar, como está faltando neste momento. O problema está tanto na torneira de casa, que nós abrimos sem cuidado, como no desmatamento em grande escala na outra ponta, tendo falta de regulação e gestão do uso por governos e empresas. A crise atual pode ter despertado e estar alimentando um crescimento da consciência coletiva sobre a centralidade do bem comum água na vida. Precisamos transformar isto em nova cultura política do cuidado com este comum fundamental.
Aqui no Rio de Janeiro e na extensa faixa litorânea do Nordeste ao Sul do Brasil devemos parar de destruir a Mata Atlântica e realizar um gigantesco esforço na sua recomposição. Na Bacia do Paraíba do Sul, principal fonte de água para abastecimento urbano do Sudeste, precisamos recompor a mata ciliar na margem de todas as nascentes, córregos e rios, o quanto antes. Mas o problema climático, de que o ciclo da água é parte, tem a ver com o desmatamento sem limites no Cerrado, onde nascem os principais rios do Brasil, tanto o São Francisco, como os afluentes amazônicos e da Bacia do Rio Paraná-Paraguai. A Floresta Amazônica é um dos principais reguladores do clima e do ciclo da chuva para nós, brasileiros, como de toda a América do Sul e além. Parar o desmatamento e deixar a natureza se recompor na Grande Amazônia é um caminho incontornável. Aqui estamos diante da necessidade, como cidadania, de cobrar dos governantes e políticos que elegemos uma total mudança nas leis, políticas e na gestão do território bem comum, com suas florestas e águas, com a sua capacidade de contribuir para a reprodução do ciclo da água, abastecendo e gerando energia que precisamos.
É, se continuarmos a tentar simplesmente no proteger do bom sol, voltaremos aos tempos da velha marchinha de Carnaval: “… de dia falta água, de noite falta luz!” Isto não é uma fatalidade, é uma criação humana. A hora de agir não pode ser mais adiada.
Fonte: Ibase
O problema é nosso,vemos tantas destruição falta de planejamento com o meio ambiente temos que conscientizar a população.Pra não poluir ,ás águas,e rios temos que cuidar do nosso ambiente.Porque existe tantas enchentes em cidades grandes e acabar em destruição por causa que muitos não se preocupa,com que no futuro possa causar.
o problema é nosso da escassez de água pois destruímos o meio ambiente em que vivemos todos os momentos isso vem a anos chegou um momento critico que nem o proprio ambiente suporta tanta falta de respeito. o que devemos fazer para mudar esse historico plantando arvores conservando e plantando arvores nas nascentes conscientizando a população(vizinhos birros e comunidades)para não jogar lixo nas ruas e rios cuidar do meio ambiente para que tenhamos novos frutos no futuro.