22/03/2016 I Após vivenciar 20 anos de ditadura, o Brasil iniciou o processo de transição democrática em 1984, com a posse do primeiro presidente civil, que chegou ao cargo por meio de eleições indiretas. De lá para cá, muitas conquistas políticas sociais e econômicas foram obtidas, resultado de uma luta incessante de diversos setores da sociedade, como os movimentos sociais, organizações da sociedade civil, acadêmicos, entre outros. Mas, apesar dos avanços, ainda há um longo caminho a ser percorrido e muitas ameaças concretas às conquistas duramente obtidas nas últimas três décadas.
Divulgamos, a seguir, dois manifestos, assinados por instituições parceiras do COEP e da Rede Mobilizadores, que ajudam a refletir sobre os desafios que se impõem para proteção e defesa do Estado Democrático de Direito e para assegurar os direitos e conquistas sociais, que ajudaram o país a reduzir a desigualdade.
O Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) é uma organização de cidadania ativa, sem fins lucrativos. Foi fundada após a anistia política por Hebert de Souza, o , e os companheiros de exílio Carlos Afonso e Marcos Arruda. Sua história institucional está muito ligada à democratização do Brasil, em particular às lutas que permeiam a emergência da cidadania e a constituição da diversificada sociedade civil brasileira das três últimas décadas. Os grandes movimentos e campanhas cívicas deste período, foram também compromissos do Ibase e, por isto, foram momentos históricos de adaptação da sua agenda e das formas de atuação.
O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, não partidária e com finalidade pública. Tem por missão: "Contribuir para o aprimoramento dos processos democráticos visando à garantia dos direitos humanos, mediante a articulação e o fortalecimento da sociedade civil para influenciar os espaços de governança nacional e internacional". Criado em 1979, atua, em todos os seus projetos, com duas principais linhas de ação: o fortalecimento da sociedade civil e a ampliação da participação social em espaços de deliberação de políticas públicas.
Resistir é preciso
O Ibase tem sua história institucional ligada à luta pela democracia e, nos seus trinta e cinco anos de existência, vem pautando suas ações de forma a contribuir para a radicalização da democracia com cidadania instituinte e constituinte, na definição do poder e do Estado republicano. Neste sentido, diante da grave crise política, econômica e social que o Brasil atravessa, em que democracia corre sério perigo de continuidade, julgamos imprescindível darmos nosso depoimento e nos engajarmos na luta pela defesa dos princípios democráticos constantes na Constituição Brasileira de 88.
Caminhamos para uma situação em que a disputa política na sociedade, cada vez mais criminalizada, judicializada, “espetacularizada” irresponsavelmente pela grande mídia, e radicalizada, extrapolando princípios e valores democráticos fundamentais, pode descambar em violência aberta, destrutiva. A arrogância autoritária de alguns setores da sociedade vindo, principalmente, de sua visão peculiar do Estado de Direito, como Estado Policial, a quem competiria solucionar os conflitos da ordem, a partir de juízos políticos afrontam sobremaneira os parâmetros democráticos e de autonomia dos poderes constantes na Constituição. Certamente este quadro interessa a alguém, mas com certeza a poucos. Ao país interessa sair desta situação mais forte e mais democrático, com instituições mais respeitadas e a cidadania mais ativa. Estamos num processo de mudança complexo, com consequências ainda nebulosas, em que a transformação virá, seja de forma acordada pelas forças políticas majoritárias, em desmoronamento, ou por implosão da ordem atual, com todos os riscos da imprevisibilidade que sucede a violência. Palavras de restabelecimento da ordem são recitadas no clamor das ruas por parcelas da população, entretanto, não sabemos de fato o que estas pessoas querem retornar, que construção futura de país se pretende com esta retórica, pois a aposta num futuro distinto e melhor necessita de um projeto claro e objetivo.
Eliminar a corrupção e a impunidade, fazer valer a lei, mesmo que no plano da preservação da sociedade capitalista, já é um grande avanço, mas é necessário que estas mudanças se apresentem com profundidade, de forma séria e estrutural. A condução deste processo deve ser amplo e abrangente, as investigações e operações não devem ser direcionadas de forma seletiva, culpabilizando somente um partido político e lideranças a ele vinculado, enfim, não deve ser ferramenta de luta pelo poder político. A corrupção é um mal a ser combatido, entretanto, não esgota toda a complexa teia de mudanças que devem ser também consideradas para construção de uma sociedade mais justa e igual. A defesa da ética na política deve ser pautada em compromissos de todas as forças sociais e servir para todos que levem em conta o respeito à Constituição Federal, na qual os movimentos sociais têm se baseado para levar adiante suas pautas reivindicatórias. Diante da fragilização do governo o que se verifica é uma oportunidade para avançar sobre a Constituição e eliminar direitos fundamentais, solapando as bases das garantias jurídicas democráticas que se forem abandonadas, trarão efeitos desastrosos para a sociedade brasileira. O que se vê, portanto, é que a sociedade vive um processo de radicalização, não de ideias, mas de agressão física, fora de uma racionalidade que busque minimamente compreender o contexto histórico e formular projetos concretos.
Não temos dúvida que o Brasil mudou para melhor, mas a travessia ficou ainda inconclusa, não temos dúvidas que houve avanços sociais nestes últimos anos que favoreceram a circulação de capitais na economia brasileira – parte especulativo– que viabilizou ganhos reais de salários, políticas sociais emancipadoras, pleno emprego, crédito ao consumo e maiores oportunidades à juventude e que não se coadunam com o retorno da política da casa grande e senzala.
Acreditamos que a alternativa a tal polarização – e ao potencial de grande destruição que carrega – é criar pontes democráticas de diálogo para, exatamente, colocar no centro o bem maior: a democracia como método de solução do impasse atual. Não é uma solução para a crise de hegemonia, mas é a condição indispensável para que ela possa ser construída e o Brasil voltar a ter um projeto que nos una em nossa diversidade e permita que a disputa democrática – ou luta de classes na e pela política, se preferirem – volte a ser novamente força de construção. Isto significa um pacto concertado pela democracia, pela recriação de condições políticas para que a disputa entre nós seja construtiva, baseada em princípios e valores democráticos como fundantes.
Fonte: Coletivo de Gestão do Ibase
Pela legalidade, democracia e em defesa da Constituição de 1988
O Instituto de Estudos Socioeconômicos vem a público se manifestar sobre o momento político em que vivemos. Apoiamos todo tipo de investigação, nos limites constitucionais, sobre a corrupção. No entanto, o tema 'corrupção' é uma estratégia que as elites sempre usaram para usurpar os recursos públicos. Toda investigação precisa respeitar os princípios constitucionais, inclusive que todos são iguais perante a lei. Selecionar quem vai ser investigado, e os sistemáticos vazamentos seletivos que têm sido ardilosamente utilizados - principalmente pela Rede Globo - para insuflar uma convulsão social, é usar o sistema de Justiça com interesses particulares ou de grupos políticos e midiáticos que não se conformam com uma regra básica da democracia, que é o respeito à soberania popular expressa no voto.
Não podemos aceitar o uso da Operação Lava Jato para fins políticos e partidários. Que a Lava Jato investigue todos os citados e não apenas alguns. Não podemos aceitar o uso de métodos questionáveis, como por exemplo a condução coercitiva, a prisão como estratégia para se conseguir delação premiada, e a relação umbilical entre a Operação e os grandes meios de comunicação. Assim como repudiamos a condução coercitiva do ex-presidente Lula e a divulgação dos grampos telefônicos inclusive da presidenta Dilma, denunciamos que esta é uma pratica corriqueira usada pelo aparato de segurança do Estado nas periferias das cidades, principalmente em relação à população negra. Invadir “barracos” e a privacidade, e levar suspeitos para depor sem mandato, é o cotidiano desta população.
Acreditamos que o atual governo adotou um modelo de desenvolvimento equivocado que aprofundou a dependência e a inserção subordinada do nosso país à economia mundial, nos tornando ainda mais vulneráveis e suscetíveis à crise econômica mundial. Também gerou e gera sucessivas violações de direitos humanos, principalmente de indígenas, jovens negros,mulheres e população LGBT. Também acreditamos que o governo Dilma, ao priorizar equivocadamente a elevação de juros e os cortes no orçamento como medida para sair da crise econômica e fiscal que se instalou, produziu efeitos perversos na vida d@s brasileir@s e em especial dos mais pobres, que são ainda a grande maioria nesse país desigual, fragilizando ainda mais as nossa políticas públicas. Além de tudo isso, a falta de diálogo com as organizações e movimentos sociais, uma característica da atual gestão federal, contribuiu para aprofundar a crise política que vivemos hoje no Brasil.
Mas também acreditamos que o que está na base do profundo descontentamento da elite brasileira, super representada no congresso e na grande mídia, e aliada sintomaticamente a segmentos ideologizados do sistema de Justiça e da Polícia Federal, é uma profundo desprezo e desrespeito por esse ou qualquer governo que queira produzir mudanças que coloquem em cheque seu poder político, econômico e cultural, e seus históricos privilégios.
Por isso, repudiamos quaisquer atos jurídicos ou institucionais que não sigam os ritos da legalidade, bem como repudiamos todas as manifestações pró-ditadura, contra direitos conquistados e atos violentos que temos visto acontecer diuturnamente a partir do dia 13 de março.
Acreditamos na urgência de uma profunda reforma do sistema político, em todas as instâncias de poder. Queremos o fim da influência do poder econômico nas instâncias do Estado, a democratização do sistema de Justiça e a regulação democrática da mídia, que tem atuado como um quarto poder neste cenário de crise, desinformando a população e incentivando um convulsionamento social ao abrir espaça para soluções golpistas e fascistas, o que poderá nos levar à barbárie.
Não podemos retroceder na democracia que conquistamos com muita luta, dores e mortes. O que precisamos é avançar, amadurecer e radicalizar a nossa democracia, e para isso é fundamental construir uma democracia com povo, não apenas uma democracia formal. Como organização não governamental sem fins lucrativos, autônoma e supra partidária, o Inesc seguirá atuando para fortalecer o campo popular e a transparência pública, contra a corrupção e pela garantia dos direitos de todos e todas. Continuaremos, agora e sempre, unidos aos movimentos e organizações da sociedade civil para defender nossa democracia e nossos direitos como povo.
Estamos em 2016, não em 1964. O combate à corrupção não pode ser uma desculpa para o Estado de exceção que estamos vivendo. O Inesc atuou na construção de nossa carta magna, a Constituição de 1988, e é contra o golpe e em defesa da democracia que nos posicionamos.
Fonte: Equipe Inesc
Vejo que há uma angustia grande da população, com relação ao que é certo e ou errado diante de tudo que vem acontecendo em nosso País.
a liberdade de expressão vem trazendo em si,uma tendência que extrapola o direito de cidadania de algumas pessoas. Tais como tendências coercitivas e incentivadores da desunião,do conservadorismo
autoritário e da manipulação de informações, que confundem as pessoas não possuidoras de um conhecimento específico, para fazer a diferença entre o que é correto e errado, diante de ações midiáticas de certo tipo de mídia.
Se faz necessário dar continuidade ao processo democrático, instalado nos últimos 12, 14 anos, ao tempo em que necessitamos de mais ética na política e mais respeito a uma população que, até pouco tempo não tinha seus direitos garantidos.
Apesar do que foi conquistado, o Brasil tem um longo caminho a percorrer e a seguir, para alcançar a verdadeira igualdade social, de fato e de direito.
país democrático? em parte, a democracia é linda porem não saiu do papel.
Atualmente, o Brasil pode ser considerado um país democrático devido às suas conquistas de liberdade de expressão e de associação, de direito de voto e informação alternativa, de direito dos líderes políticos competirem por apoio, da elegibilidade para cargos públicos e das eleições livres.
Apesar destas conquistas, o país ainda tem que percorrer um longo caminho para conseguir alcançar a igualdade social.
Passados vinte e um anos, os militares saíram do poder ao permitirem a volta das eleições diretas e a livre organização partidária. Nesse momento, diversos partidos se formaram numa época em que as demandas da população se avolumavam em um período marcado pela instabilidade econômica e os terríveis índices inflacionários. De tal modo, experimentávamos o retorno da democracia sem ainda reconhecer sua importância e significado.
Atualmente, milhares de brasileiros exercem a sua cidadania através do voto. Entre a descrença e o ceticismo de alguns, questiona-se frequentemente a existência do voto obrigatório para grande parte da população. Ao mesmo tempo, observamos que a crença nas ideologias e partidos políticos perdem espaço para o fácil elogio a figuras políticas que se valem mais do carisma do que de uma convicção para angariar o nosso eleitorado.
A nossa principal bandeira é fortalecer a democracia e seus fundamentos. Por isso, é necessário reafirmar os princípios das liberdades (de expressão, de manifestação e de imprensa) e o direito de escolha dos governantes em eleições diretas, livres e democráticas. São conquistas que devemos cuidar.
No entanto, assistimos no Brasil a uma onda de conservadorismo coincidente com o que vem ocorrendo em diversos países, como Argentina, Bolívia, Chile, Equador, Peru e Venezuela. Os movimentos são parecidos em suas estratégias político-midiáticas. Disseminam o ódio, a intolerância e procuram deslegitimar governos eleitos democraticamente, por meio da omissão de suas realizações, associado à manipulação das informações.
É importante lembrar que esses movimentos, em sua essência, buscam a retirada de direitos. Defendem o “Estado Mínimo”, que significa menos estrutura para atender à população, menos investimento público e, consequentemente, menos servidores. Pretendem a retirada de direitos sociais, envolvendo aposentadorias e pensões, benefícios assistenciais e redução do poder de compra do salário-mínimo. Tudo isso quando o enfrentamento da crise passa, necessariamente, pelo fortalecimento do poder de consumo dos mais pobres.
As manifestações traduzem concepções diferentes de Estado. De um lado, querem políticas excludentes e até governos ditatoriais. Defender ideias é legítimo, desde que de forma pacífica e tolerante com as divergências. Afinal, também é legítimo defender um projeto de Nação onde todos podem melhorar de vida, ter acesso ao conhecimento e a novas oportunidades.
As lideranças democráticas precisam perceber o momento político em construção e sua semelhança com graves períodos de nossa história que não queremos reviver. Mudança de governo se promove nas urnas. Pois qualquer ruptura da ordem democrática hoje terá consequências imprevisíveis.